Shows homenageiam Marielle e Miranda
DE SÃO PAULO
Numa primeira tarde sem grande chuva e com o sol dando um tempo atrás das nuvens, a sétima edição do Lollapalooza Brasil teve suas atrações iniciais prestando homenagens a Marielle Franco (leia texto ao lado).
O público que lotou o autódromo de Interlagos —segundo a organização, foram 100 mil pessoas, esgotando os ingressos— se movimentava de maneira tranquila.
Enquanto esperava pelo grupo americano de rock Red Hot Chili Peppers e pelo DJ brasileiro Alok, principais nomes do primeiro dos três dias de evento, uma plateia extremamente jovem teve um cardápio variado.
Como pratos mais atraentes, o som dançante de LCD Soundsystem, o hip hop de Chance the Rapper e o rock pesado do Royal Blood.
Um dos principais trunfos do vocalista e cabeça do LCD Soundsystem, James Murphy, é o conhecimento enciclopédico da música pop. E essa característica apareceu logo no início da apresentação da banda de Nova York.
A primeira faixa tocada foi “Daft Punk Is Playing at My House”, homenagem explícita à dupla francesa de eletrônica. A segunda, “I Can Change”, foi introduzida por um pequeno trecho de “Radioactivity”, do Kraftwerk. .
Foram duas referências que explicam bem a música roqueira, mas extremamente dançante feita pelo LCD Soindsystem. Se o rock e a dance música hoje andam de mãos dadas, James Murphy é um dos culpados.
Antes, em sua primeira passagem pelo Brasil, Chance the Rapper levou seu rap edificante, carregado de referências gospel, ao público do Lollapalooza.
“Eu quero ouvir vocês cantarem”, gritou o rapper de Chicago. O pedido por animação foi constante, mas o público nem sempre acompanhou a empolgação mostrada no palco com pirotecnias e outras perfumarias visuais.
Uma das exceções foi quando Chance cantou “I’m the One”, parceira com Justin Bieber, exibido no telão.
Mais cedo, rock pesado. São apenas duas pessoas no palco no show do inglês Royal Blood, mas é como se o Led Zeppelin inteiro baixasse no cantor e baixista Mike Kerr e no baterista Ben Thatcher.
O show da dupla levou uma multidão a bater cabeça e abriu diante do palco a primeira “roda” deste Lolla. BRASILEIROS Logo após o meio-dia, os brasileiros Nem Liminha Ouviu, Plutão Já Foi Planeta, Luneta Mágica, Selvagens à Procura de Lei e Vanguart tocaram para plateias pequenas.
Às 14h30, dois shows simultâneos de artistas nacionais já tiveram público mais robusto.
No palco Budweiser, o rapper Rincon Sapiência mostrou a mistura de música africana, eletrônica e jamaicana que aborda a afrodescendência no Brasil, mote de seu álbum “Galanga Livre”.
No palco Axe, Mallu Magalhães fez um show fofinho, e apolítico para uma galera adolescente que sabia todas as músicas e cantou junto.
Entre os estrangeiros, o rock do Spoon não era nada ensolarado, e foi sobre a apresentação dos texanos que uns pingos de chuva teimaram em cair. O vocalista Britt Daniel não parecia empolgado, e a banda seguia esse tom.
Dois shows de pop alegraram o fim de tarde. A dupla inglesa Oh Wonder e a cantora sueca Zara Larsson queriam colocar as pessoas para dançar. E conseguiram. NÃO TÃO HOT Cinco meses após um show irregular no Rock in Rio, os americanos do Red Hot Chili Peppers encerraram a noite no palco Budweiser.
A banda se esforçou para agradar, apesar de falhas de som que prejudicaram parte do público e de um Anthony Kiedis morno, destoando da usual energia do grupo. Ainda assim os fãs dançaram e cantaram a plenos pulmões hits como “By the Way”.
Em uma das surpresas preparadas para o público local, o guitarrista Josh Klinghoffer arriscou tocar e cantar “Menina Mulher da Pele Preta”, emulando Jorge Ben Jor.
Tocando no mesmo horário que eles, no palco Axe, Mac DeMarco não fez um show. Fez um stand up.
Ao subir ao palco, o músico canadense se apresentou: “Olá, nós somos os Red Hot Chili Peppers”. No intervalo das canções, tocava o riff de “Can’t Stop”, hit dos americanos, seguidas vezes.
Ao final da apresentação, ele tomou o lugar do baterista Joe McMurray, e o pôs para cantar “Under the Bridge”, clássico dos Chili Peppers.
Os dente separados e o humor nonsense fazem de Mac um personagem. Suas melodias grudam, assim como os curtos solos de guitarra.
No show, porém, Mac desconstruiu os arranjos dos álbuns. O público não pareceu se importar. A plateia reduzida devido ao show dos Chili Peppers cantou diversas canções com o canadense. DJ ESTRELA O brasileiro Alok encerrou a noite de sexta do palco Perry do Lollapalooza.
Antes de subir ao palco, fogos de artifício. Num vídeo, Alok aparece criança, ao lado dos pais. Ouve-se sua voz: “Eu fiz o possível, até que o impossível acontecesse”.
Mais fogos, e ele aparece. Levanta as mãos, chama a audiência e começa a tocar o megahit “Hear Me Now”. O público canta e pula.
Alok não é o tipo de DJ que se contenta em mixar músicas. É quase um showman. E, assim, virou um dos principais popstars do Brasil hoje. (AMANDA NOGUEIRA, DAIGO OLIVA, MARCO AURÉLIO CANÔNICO, SARAH MOTA RESENDE, THIAGO NEY, THALES DE MENEZES, VICTORIA AZEVEDO)
O primeiro dia da sétima edição do Lollapalooza foi marcado por manifestações de cunho político.
Primeira banda a se apresentar, o quinteto paulistano Nem Liminha Ouviu abriu seu show com “Não Tem Perdão”, um manifesto contra os políticos brasileiros.
No telão, palavras como “abuso de poder” eram intercaladas com imagens da bandeira do Brasil, do Congresso Nacional e uma ilustração retratando a vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ).
Outros shows ao longo do dia lembraram Marielle, assassinada no último dia 14, no Rio. A banda Plutão Já Foi Planeta recebeu no palco o rapper Rashid, que prestou sua homenagem à carioca. “Venho aqui falar ‘Marielle, presente’”. O público vibrou.
O mesmo aconteceu no show do rapper Rincon Sapiência, que mencionou Marielle em três momentos.
“Nunca é demais repetir: Marielle, presente. Estamos em um país que tem um alto índice de genocídio de pretos e pretas e isso acontece geralmente nas periferias.” disse o MC da zona leste de São Paulo. Atrás dele, um desenho da vereadora crescida no complexo da Maré era projetado no telão.
O grupo Vanguart também prestou suas homenagens à vereadora. “Nunca vão apagar um sol desses”, disse o vocalista Hélio Flanders, enquanto o rosto de Marielle era projetado no telão.
A repercussão internacional do assassinato também reverberou na apresentação da sueca Zara Larsson.
A cantora dedicou a faixa “Symphony” à vereadora, “que lutou pela justiça e contra a brutalidade policial e inspirou pessoas não só aqui como no mundo todo”.
Estreantes no festival, os manauaras do grupo Luneta Mágica homenagearam o produtor musical Miranda, morto na quinta (22), aos 56, em sua casa, em São Paulo, após um mal súbito.
“Ele era um grande amigo e o show é dedicado a ele”, disse o vocalista Pablo Henrique. Miranda foi o produtor da música “Parte”, recente trabalho do Luneta Mágica.
O produtor também foi lembrado no show do grupo cearense de rock Selvagens à Procura de Lei. “Queremos dedicar essa música para o Miranda, grande produtor do Brasil”, disse o vocalista Gabriel Aragão, puxando em seguida a canção “Despedida”. A Lolla Store, que vende produtos oficiais do festival, oferece bonés (R$ 70), lambes-lambes (R$ 20), camisetas (R$ 60) e chaveiros (R$ 15). O produto mais barato é o botton, que sai por R$ 2, e os mais caros são uma headphone (R$ 650) e uma jaqueta (R$ 650). O público do Lollapalooza está se amontoando para fotografias em um lugar peculiar em Interlagos: os banheiros químicos. Cercados por tapumes com pôsteres com símbolos do festival e das marcas patrocinadoras, eles são um lugar disputado —apesar do mau cheiro. O palco Perry reúne principalmente os DJs e mostrou que a eletrônica colocou os dois pés no pop. O brasileiro FTampa soltou hits por uma hora e fez o público levantar as mãos e cantar como se estivesse em show de pop, sertanejo ou funk.