Folha de S.Paulo

Fintechs na China, carteira para quê?

- RODRIGO ZEIDAN COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Marcia Dessen; terça: Benjamin Steinbruch; quarta: Alexandre Schwartsma­n; quinta: Laura Carvalho; sexta: Pedro Luiz Passos; sábado: Rodrigo Zeidan; domingo: Samuel Pessôa

JÁ ME peguei várias vezes saindo sem carteira em Xangai. Às, vezes percebo no final do dia. Não preciso mais dela. Para tudo, uso Alipay ou WeChat (este uma versão melhorada do WhatsApp).

Pago qualquer coisa via aplicativo­s, desde transporte até o vendedor de frutas na esquina. Eu poderia até pegar dinheiro emprestado para usar como quiser, com um certo limite. A China caminha para um mundo completame­nte digital e é até mais avançada que na Dinamarca, onde também ensino. Nos dois países, usar dinheiro fica cada vez mais raro. Em algumas lojas não se aceitam mais yuans ou coroas dinamarque­sas.

Enquanto isso, nosso outrora avançado sistema financeiro ficou pra trás. Em pleno 2018, o novo presidente do Bradesco assumiu anunciando que seu desafio era digitaliza­r o banco. Esse tipo de estratégia não sai muito do lugar, no Brasil. A razão é simples: estamos presos em um equilíbrio de baixo valor para a sociedade. relevante entre os tantos do país—, o problema central é retirar barreiras à inovação e à competição. E ainda temos todo o crédito que é direcionad­o a diversos setores preferenci­ais. Num mundo de fintechs, empresas de tecnologia do setor financeiro, a nossa grande “inovação” (até necessária) foi liberar pagamento de contas em casas lotéricas.

Há uma explicação para esse conservado­rismo na regulação financeira: a estabilida­de do sistema. Temos o sistema financeiro mais seguro 2008. Mas pagamos caro, com juros altíssimos e serviços ruins. Parte da população e a maioria das empresas têm pouco acesso a crédito, com uma concentraç­ão em poucos bancos que concorrem pouco entre eles. Não devemos desregulam­entar tudo, mas com certeza devemos deixar o hiperconse­rvadorismo para trazer muito mais competição ao setor.

Na China, mais de 800 milhões de pessoas usam WeChat Pay. O sistema de pagamentos via celulares, a maior parte sem envolver As pequenas empresas não estão presas às altas taxas de cartões de débito e crédito. O banco central chinês permite e incentiva a competição, mesmo os maiores bancos sendo estatais e as fintechs privadas. Três em quatro empréstimo­s via celulares no mundo acontecem na China. E a maior parte é entre pessoas (peer-to-peer lending). O Alipay acabou de entrar em 36 países. O sistema evolui rapidament­e.

Enquanto isso, no Brasil, a regulação é tão rígida que torna praticamen­te impossível haver novos concorrent­es. Cada rodada de mudança regulatóri­a demora muitos meses e vem cheia de poréns. E, quando alguém consegue oferecer melhores serviços ao cliente, como a XP Investimen­tos, Para isso, Banco Central e CVM devem agir como facilitado­res.

No mundo, fintechs estão causando uma verdadeira revolução nos serviços financeiro­s. Está na hora de chegarmos ao século 21. RODRIGO ZEIDAN, rodrigo.zeidan@nyu.edu

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