Folha de S.Paulo

Em derrota de Doria, nova previdênci­a é congelada na Câmara

Em meio a protestos e greve, vereadores da base aliada da prefeitura decidiram estudar o projeto por 120 dias

- GUILHERME SETO

Prefeitura diz que a reforma segue como prioridade, mas admite que terá dificuldad­es para aprová-la em 2018

Sob intensa pressão de servidores municipais e sem conseguir o apoio suficiente de vereadores, o prefeito João Doria (PSDB) viu fracassar a intenção de ter aprovado o projeto de reforma da previdênci­a municipal antes de deixar a Prefeitura de São Paulo.

O tucano deixará o cargo no início de abril, após 15 meses de gestão, para disputar a eleição ao governo paulista. Na campanha, imaginava dizer que conseguiu aprovar em âmbito municipal uma reforma da previdênci­a que Michel Temer (MDB) ainda não teve sucesso na esfera federal.

A gestão Doria tem argumentad­o que a aprovação da reforma é fundamenta­l para a saúde financeira do município. Segundo cálculos da prefeitura, o déficit da previdênci­a chegará a R$ 20,8 bilhões em 2025 caso a reforma não seja feita. Em menos de sete anos, afirma, o Orçamento total da administra­ção será tomado por gastos obrigatóri­os.

O projeto de lei que agora será revisto prevê o aumento de alíquota de contribuiç­ão dos servidores de 11% para 14%. A versão inicial continha alíquota suplementa­r de 5% para todos os que recebem acima do teto do INSS (R$ 5.645), mas ela foi suprimida depois da pressão dos funcionári­os públicos.

Nesta terça-feira (27), ao perceber que não teria os 28 votos necessário­s para conseguir a aprovação do projeto em primeira votação, Milton Leite (DEM), presidente da Câmara, anunciou a retirada do texto da pauta por um prazo de 120 dias. A Câmara tem 55 vereadores, sendo apenas 11 deles de oposição a Doria.

Principal aliado do prefeito no Legislativ­o, o vereador disse que o projeto passará agora por comissão de estudos, que manterá relação contínua com sindicatos e demais órgãos envolvidos na discussão. Milton Leite falou na construção de um novo texto.

Assim que o congelamen­to da reforma foi anunciado, servidores municipais em greve realizaram uma rápida assembleia e decidiram retornar ao trabalho. Ao menos metade das escolas da cidade, por exemplo, estavam completame­nte paradas havia algumas semanas.

Os servidores vinham repetindo manifestaç­ões com dezenas de milhares de pessoas, como nesta terça em frente à Câmara, o que fez vereadores hesitarem em apoiar publicamen­te o projeto de lei. FORTE APOSTA À noite, após a suspensão da proposta, Doria disse que a Câmara tinha “toda a liberdade” para essa decisão.

“Nós fizemos nosso papel. Nossa obrigação era alertá-la sobre a importânci­a da reforma da previdênci­a”, afirmou o tucano antes da pré-estreia de “Nada a Perder”, cinebiogra­fia do bispo Edir Macedo.

Para ver a sua proposta de reforma aprovada, Doria lançou mão de diferentes artifícios nos últimos dias e colocou uma campanha publicitár­ia no ar em defesa do projeto.

Nesta terça, chegou a prometer reajuste aos funcionári­os públicos que recebem o piso da categoria (R$ 1.132) caso a reforma da previdênci­a fosse colocada em prática. O piso iria para R$ 1.400.

Um dia antes, Doria se reuniu com um grupo de vereadores do qual é mais próximo para buscar o número mínimo de votos. Ele saiu da reunião com uma conta de ao menos 23 votos, com a possibilid­ade de chegar próximo a 28.

O tucano negou interesse eleitoral no projeto. “Não estou preocupado com eleição”, disse. “Seria mais fácil para mim jogar para o alto e deixar para o Bruno [Covas, que assume a prefeitura] fazer a reforma. Ou falar para ele deixar para o seu sucessor. Mas nem eu nem o Bruno somos irresponsá­veis.”

Líder do governo na Câmara Municipal, o vereador João Jorge (PSDB) disse que o Executivo gostaria de continuar tentando a aprovação, mas que, diante da falta de votos, ele e o presidente da Câmara acharam melhor adiar.

“Se tivéssemos 30 votos, com segurança de aprovação, claro que votaríamos. A pressão dos servidores pesou muito. Acho que a maioria dos vereadores ainda não entendeu a gravidade da situação das finanças do município. É grave. A maior derrota é da cidade, e não do João Doria.”

Já o vereador Antonio Donato, líder do PT, falou em fracasso retumbante de Doria. “Poucas vezes um prefeito de São Paulo teve derrota tão grande. Colocou o projeto como prioritári­o e não conseguiu aprová-lo mesmo tendo uma Proposta da prefeitura > Criar uma nova previdênci­a pública para quem entrar depois da aprovação da lei, separada do sistema atual e baseada em capitaliza­ção (cada funcionári­o tem sua própria conta) > Passar imóveis e outros bens em desuso base aliada de 44 vereadores.”

Secretário de Gestão e um dos principais responsáve­is pelo projeto, Paulo Uebel afirmou que as eleições podem atrapalhar a votação do projeto ainda em 2018.

“O debate continua, vamos conversar com sindicatos nesses quatro meses, fazer ajustes. Entendemos que a Câmara é soberana e que alguns vereadores não estavam confortáve­is”, disse. “A Câmara tem o tempo dela, o Executivo tem que respeitar. É difícil dizer se vai ser mesmo votado neste ano. Dada a proximidad­e do calendário eleitoral, pode ser adiado”, completou.

Em nota, a gestão afirma que Doria “reafirma sua mais profunda convicção de que a reforma da previdênci­a dos servidores municipais é necessária” e que “a cidade não pode seguir retirando recursos de áreas essenciais” para a cobertura desse déficit.

“O prefeito respeita a autonomia da Câmara na sua decisão soberana. Afirma ainda que fez a sua parte, defendendo a cidade e a responsabi­lidade fiscal da prefeitura”, diz.

Presidente do sindicato dos professore­s, o vereador Cláudio Fonseca (PPS) comemorou. “Os servidores conseguira­m uma trégua de 120 dias. Agora nosso papel é discutir com o próximo governo.” ANNA VIRGINIA BALLOUSSIE­R

PAULO UEBEL

secretário de Gestão

Vamos conversar com sindicatos nesses quatro meses. A Câmara tem o tempo dela, o Executivo tem que respeitar. É difícil dizer se vai ser mesmo votado neste ano. Dada a proximidad­e do calendário eleitoral, pode ser adiado

 ?? Eduardo Anizelli/Folhapress ?? Protesto de servidores em frente à Câmara Municipal de São Paulo na tarde desta terça
Eduardo Anizelli/Folhapress Protesto de servidores em frente à Câmara Municipal de São Paulo na tarde desta terça

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