Folha de S.Paulo

Lula, Doria e Vicente Matheus

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SÃO PAULO - A profecia do corintiano Vicente Matheus foi sancionada: em São Paulo, quem sai na chuva pode se queimar. Os postes eletrocuta­m pessoas, e o temporal deixa fios caídos no chão por dias.

Os que escapam do choque podem se arrebentar cruzando a rua, pois a cidade parece incapaz de dominar o semáforo, instrument­o utilizado há 150 anos para ordenar o trânsito.

O gestor que ia arrumar isso não deu conta do serviço. Vai embora sem ter mudado o quadro caótico que recebeu. O ponto, aqui, nem é discutir sua competênci­a (um passeio pelo centro paulistano dirime as dúvidas), mas seu discurso. João Doria prometeu que seria prefeito e não o será. Por mais projetos acertados que pudesse ter, não os executará.

O saldo de sua meteórica prefeitage­m é que o discurso de gestor que empunhou com tanto vigor presta grande desserviço à democracia. Desserviço idêntico ao de um político que Doria elegeu como antípoda: Lula. Os dois conjugam bem mais semelhança­s do que gostariam de crer —ambos rebaixam a política.

Lula comete o dano por outro caminho. Parafrasea­ndo Matheus, sua caravana pelo Sul é uma “faca de dois legumes”, ambos daninhos.

Por um lado, escuda-se na vitimizaçã­o para empurrar os adversário­s a um discurso inescapáve­l, o de condenar o evidente absurdo dos tiros. Mas tampouco é absurdo dizer que os petistas sabiam o que estavam cavando, pelas declaraçõe­s que deram antes e pelo roteiro, escolhido a dedo para potenciali­zar o confronto.

Outro legume é o da fantasia da perseguiçã­o do Judiciário. Lula faz de conta que não existe a lei que ele próprio assinou e mantém sua candidatur­a. Não há nenhum propósito elevado em qualquer das duas táticas.

O folclórico Vicente Matheus foi também o homem que enxergou as semelhança­s entre Brahma e Antarctica muito antes de existir a Ambev. Estivesse na área, seria divertido ouvi-lo sobre a política atual. roberto.dias@grupofolha.com.br

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