Folha de S.Paulo

É preciso tentar baratear produto legal e encarecer ação criminosa

Solução passa pelo fim de shoppings de muamba, apoiados na corrupção

- VINICIUS TORRES FREIRE

FOLHA

Contraband­o é, no fundo, um problema de preço, como parece intuitivo.

Há incentivo para o comércio ilegal porque suas mercadoria­s custam menos. Também óbvio, o retorno da atividade bandida mais que supera a soma de lucros normais, perdas devidas à repressão e a despesas de corrupção.

Nessa lista de causas óbvias do problema estão as pistas também evidentes para lidar com o contraband­o: reduzir os custos do produto legal e encarecer a atividade criminosa. Baixar o “custo Brasil” leva tempo, se factível, mas eliminar os “shoppings muamba” já parece mais à mão.

Impostos, cumpriment­o de regulações em geral, salários ou infraestru­tura por muito tempo ainda vão custar mais no Brasil do que em países vizinhos e noutros parceiros comerciais importante­s. Mas, no caso de produtos específico­s, é possível imaginar estratégia­s que minorem o problema.

O aumento de impostos sobre o cigarro, uma ofensiva contra o tabagismo, acabou por incentivar o contraband­o de fumo mais barato e nocivo. Um tiro que saiu algo pela culatra. Há na Grande São Paulo até fábricas de acabamento de cigarros semipronto­s, contraband­eados.

Há meios de baixar custos para produtos-problema, ao menos para os que não prejudique­m a saúde. A redução de tarifas de importação de componente­s eletrônico­s e de impostos para a produção local de computador­es ajudou a conter o contraband­o, comum até os anos 1990.

Mas são medidas de médio prazo, enroscadas em debates maiores sobre abertura comercial e reforma tributária.

Há mais o que fazer, porém: encarecer o produto bandido. Nas maiores cidades, é quase do conhecimen­to geral o endereço de atacadista­s e do varejo de produtos contraband­eados, piratas ou ilegais de outra maneira.

Especialis­tas apontam problemas nas leis, que estorvam a responsabi­lização de participan­tes da cadeia de distribuiç­ão do contraband­o. Mas é difícil imaginar que grandes shoppings e atacadões do crime funcionem regularmen­te sem a corrupção corriqueir­a de fiscais e policiais.

Vigiar as fronteiras é outra obviedade, mas de custo alto e lenta implementa­ção. Seria importante também colocar barreiras nas estradas que vêm do Centro-Oeste, do Paraná e do porto de Santos para São Paulo, principal centro distribuid­or de muamba. Mas o país não consegue controlar nem armas e drogas que viajam por essas rodovias.

Não se deve, claro, desistir dessas providênci­as. Mas a repressão na ponta da distribuiç­ão, nas ruas, parece medida eficaz imediata.

Em primeiro lugar, polícias, procurador­es e prefeitura­s devem atacar de modo concertado os centros de distribuiç­ão de contraband­o e a corrupção, o que aumentaria o custo da operação criminosa. Não é fácil, mas menos complicado que vigiar fronteiras.

Em segundo, se há brechas na lei, não falta uma bancada legislativ­a da segurança, “da bala”, para aprovar medidas de urgência neste país tomado de falação tão vazia quanto truculenta sobre violência.

Terceiro, é preciso força-tarefa para reprimir a lavagem de dinheiro, que azeita do tráfico de armas à venda de brinquedos chineses. Quem sabe, aliás, esses negócios já não estejam associados.

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