Folha de S.Paulo

MP emperra e põe em xeque reforma trabalhist­a para todos os contratos

Maia dá prazo de recebiment­o de texto até terça; comissão não tem presidente nem relator

- ANAÏS FERNANDES LAÍS ALEGRETTI

Medida enviada por Temer ao Congresso deve caducar no dia 23; especialis­tas veem risco de judicializ­ação

A medida provisória com ajustes na reforma trabalhist­a emperra no Congresso e põe em xeque a validade das novas regras para contratos assinados antes das mudanças na CLT (Consolidaç­ão das Leis do Trabalho), em vigor desde novembro.

O entendimen­to de que a nova lei rege todos os contratos está na medida provisória 808, editada pelo presidente Michel Temer no fim do ano passado. O texto foi enviado aos parlamenta­res em razão de um acordo para que o Senado aprovasse a reforma.

Com vigência máxima de 120 dias, a medida provisória deverá caducar. Para virar lei, ela precisa ser aprovada até o dia 23 de abril. A comissão mista instalada para analisar a matéria, no entanto, ainda não escolheu presidente nem relator.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), informou ao colegiado que só receberá o projeto de conversão em lei até terça-feira (3).

Se fosse votada pela comissão, a MP ainda teria de passar pela análise dos plenários das duas Casas. Maia define a pauta da Câmara.

Sem a aprovação da MP, especialis­tas veem brechas para judicializ­ação.

“O entendimen­to cai e volta a dúvida, porque ficará de acordo com a interpreta­ção de cada caso concreto no Judiciário. O TST [Tribunal Superior do Trabalho] pode vir a definir isso por súmula, mas, enquanto não for feito, há uma total inseguranç­a jurídica”, afirmou Otavio Pinto e Silva, professor da USP e sócio do escritório Siqueira Castro.

O MPT (Ministério Público do Trabalho) defenderá a tese de que a reforma só tem valor para os novos contratos.

“No ponto de vista do Ministério Público [do Trabalho], agora está claro que a reforma não se aplica aos contratos vigentes à época da implementa­ção da reforma trabalhist­a”, disse o procurador-geral do Trabalho, Ronaldo Fleury.

Possíveis questionam­entos em relação às normas em vigor durante o período da MP 808 vão exigir uma pacificaçã­o da matéria.

Segundo o advogado trabalhist­a Francisco de Assis Brito, o Congresso terá de disciplina­r posteriorm­ente, por decreto legislativ­o, como ficam as relações que se concretiza­ram nesses quatro meses.

“Falava-se que a reforma trabalhist­a traria segurança jurídica, mas tudo o que trouxe foi o mais absoluto caos normativo”, afirmou o juiz Guilherme Guimarães Feliciano, presidente nacional de Anamatra (Associação Nacional dos Magistrado­s da Justiça do Trabalho). SALVAGUARD­AS Além da questão da abrangênci­a da lei, a medida também altera pontos considerad­os polêmicos no texto original, como a jornada de 12 horas trabalhada­s por 36 horas de descanso e as condições de atividade de gestantes e lactantes.

Um dos principais problemas para o procurador-geral do Trabalho é a regra previdenci­ária dos trabalhado­res intermiten­tes. “Simplesmen­te o trabalhado­r intermiten­te ficará sem nenhuma regra em relação à Previdênci­a Social”, disse Fleury.

A MP estabelece que o trabalhado­r intermiten­te que recebe menos de um salário mínimo tem de fazer contribuiç­ão complement­ar.

Sem essas regras, esse trabalhado­r não terá cobertura para receber auxílio-doença ou salário-maternidad­e e também não terá o período contabiliz­ado como tempo de contribuiç­ão para a aposentado­ria, de acordo com o procurador-geral.

“Apesar de a MP colocar uma regra totalmente absurda de complement­ação da Previdênci­a, ela vinha arrumar algumas excrecênci­as da reforma”, disse Fleury.

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