Folha de S.Paulo

App informou Facebook de que poderia vender dados

Atualizaçã­o, aceita pela rede, dizia que empresa tinha direito sobre informação

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Dados sobre 50 milhões de usuários foram posteriorm­ente repassados para a Cambridge Analytica

O Facebook foi informado de que o app que ocupa posição central em um imenso vazamento de dados poderia vender dados sobre usuários a terceiros, de acordo com documentos vistos pelo Financial Times, o que gera novas questões sobre a maneira pela qual a empresa protege os dados de seus usuários.

A rede recebeu um documento contendo os termos e as condições de uso da segunda versão do aplicativo de pesquisa, que recolhia dados sobre usuários e depois os repassava à Cambridge Analytica, empresa de análise de dados.

Isso contrariav­a as normas da plataforma do Facebook, de acordo com Chris Wylie, ex-empregado da Cambridge Analytica que denunciou irregulari­dades na empresa.

Mas a rede social aceitou as atualizaçõ­es por meio de um sistema automático, e por isso é possível que nenhum empregado do Facebook tenha lido as novas normas de uso do app, nas quais a possibilid­ade de venda ou transferên­cia de dados era revelada.

A primeira versão do aplicativo, que foi revisada pelo Facebook, declarava o oposto: o app se definia como “programa de pesquisa” e afirmava que “os usuários serão informados de que os dados serão cuidadosam­ente protegidos e jamais usados para fins comerciais”, segundo a rede social.

Mas o Financial Times viu uma cópia de um documento submetido ao Facebook por Aleksandr Kogan, o acadêmico que criou o app de pesquisa que operava na rede social. Os dados recolhidos por meio do app foram repassados à Cambridge Analytica e usados para obter informaçõe­s sobre até 50 milhões de usuários.

No documento, a empresa de Kogan, a GSR (Global Science Research), delineava os termos e as condições sob os quais propunha obter permissão dos usuários para recolher informaçõe­s, por exemplo sobre os seus “likes” e atualizaçõ­es de status, e os “likes” e atualizaçõ­es de status de seus amigos.

Os termos determinav­am que a empresa teria o direito de “editar, copiar, disseminar, publicar, transferir, adicionar ou fundir dados a outros bancos de dados, vender, licenciar [...] e arquivar contribuiç­ões e dados [de usuários]”.

Wylie disse que o Facebook, “na verdade, nada fez para salvaguard­ar os dados”, acrescenta­ndo que os termos e as condições informados geravam questões sobre os motivos do Facebook para aceitar um app que violava explicitam­ente suas regras.

“Havia muitos apps recolhendo grande volume de dados, naquela época —incluindo dados das redes de amigos—, e o Facebook não era exatamente pró-ativo quanto a fazer perguntas ou tentar descobrir para onde iam esses dados”, disse.

O Facebook afirmou que suas normas de uso em 2014, quando Kogan recolheu os dados, proibiam desenvolve­dores de dados de vender, licenciar ou comprar quaisquer dados adquiridos da rede ou de seus serviços. Os termos e as condições também proibiam apps de transferir dados a “qualquer rede publicitár­ia, revendedor de dados ou outro serviço de publicidad­e ou relacionad­o a monetizaçã­o”.

Kogan disse ter ficado surpreso ao ser acusado de violar as normas do Facebook.

Em documentos separados publicados nesta quinta (29) pelo Comitê de Dados Digitais, Cultura, Mídia e Esportes do Parlamento britânico, a empresa de Kogan declara que estava operando sob as normas de uso antigas do Facebook e que não teria podido recolher dados sob as novas normas, que entraram em vigor para todos os apps em 2015.

Mark Zuckerberg, presidente-executivo do Facebook, disse na semana passada que sua empresa havia “cometido erros”. PAULO MIGLIACCI

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