Folha de S.Paulo

Febre amarela barra soltura de macacos na natureza em SP

Objetivo da medida é preservar espécie, após morte de 142 primatas na capital; bichos lotam órgão municipal

- ANGELA PINHO

Morte de fêmea da zona sul abalou equipe da prefeitura; prevenção vai de quarentena até homeopatia veterinári­a

Luna, Bácaro e seus três filhos já estavam prontos para deixar a arborizada morada na zona norte de São Paulo quando o vírus da febre amarela entrou na capital paulista no ano passado, em um avanço rápido e mortífero.

Após tirar a vida de 142 primatas, ficou claro que, atualmente, não existe lugar seguro para um macaco na cidade. Por isso, a reintroduç­ão à natureza de animais como Luna e Bácaro foi suspensa até segunda ordem.

A decisão foi tomada em órgãos do município e do estado. Sob a guarda do Centro de Manejo e Conservaçã­o de Animais Silvestres da prefeitura, o Cemacas, há cerca de 80 macacos. Já o Cras (Centro de Recuperaçã­o de Animais Silvestres) do Parque Ecológico do Tietê abriga um total de 91.

Além de suspender a reintroduç­ão à vida livre, instituiçõ­es têm adotado medidas que vão da homeopatia, no Cemacas, à formação de um grupo de animais de “back up” no Zoológico —eles serão resguardad­os para garantir a perpetuaçã­o da espécie. SEM SAÍDA Localizado dentro do parque Anhanguera, na zona norte, o Cemacas é porta de entrada para animais doentes, acidentado­s e perdidos do bando. São as mais diversas aves, répteis e mamíferos.

Desde o fim do ano passado, o que não para de aparecer é macaco, conta Juliana Summa, chefe do serviço e diretora de Fauna da Secretaria do Meio Ambiente.

Se no início a febre amarela atingiu principalm­ente os bichos da zona norte, nos últimos tempos a maior parte dos infectados vem da zona sul —o caso mais recente é o de um sagui do Parque da Independên­cia, fechado na terça (26) por precaução.

Além dos doentes e mortos, muitos chegam ao Cemacas após serem abandonado­s pelos donos. “Quando vem um sagui muito manso, a gente já sabe que era domesticad­o”, afirma Juliana.

Ela conta que, para impedir que o vírus se espalhe por ali, foi reservada uma sala de quarentena, onde todo macaco passa por um período de observação. Medida semelhante foi adotada no Cras.

Não há muito a fazer se o bicho estiver doente, pois nem para humanos há tratamento específico contra febre amarela. Além disso, macacos como bugios e saguis dificilmen­te conseguem passar incólumes à doença —no caso do Cemacas, a exceção é um sagui que teve contato com o vírus mas superou a infecção e está saudável.

Ainda não há uma explicação para o caso. Mas, numa tentativa de aumentar a resistênci­a imunológic­a dos macacos para doenças em geral, o órgão municipal começou a testar o uso de homeopatia veterinári­a, em parceria com uma especialis­ta da USP.

Enquanto adota medidas de proteção como essa e outras (telas anti-insetos, por exemplo), o Cemacas enfrenta dificuldad­e para arrumar espaço tanto para os macacos que já estavam no local como para os novos hóspedes.

Atrás da clínica veterinári­a, um corredor repleto de gaiolas de saguis dá uma ideia do desafio. O problema se agrava no caso dos bugios. Maiores, eles precisam ficar em recintos mais amplos.

Se forem colocados com outras fêmeas, porém, podem procriar, o que não é desejável justamente pela dificuldad­e de achar espaço. A alternativ­a é colocá-los com outros machos, mas é uma saída provisória: após um ou dois anos, bugios em cativeiro costumam arrumar briga uns com os outros e precisam ser separados em recintos diferentes. Com isso, em um futuro próximo, será preciso abrir ainda mais espaço.

A solução para isso ainda está em estudo. Mas, segundo Juliana, a equipe vai tentar evitar a todo custo que aconteça com os animais o mesmo que se passou à bugio Binha. O CASO BINHA A macaca chegou ao Cemacas no dia 11 de setembro de 2001, data do atentado às Torres Gêmeas nos EUA. Ficou no local por oito anos, durante os quais teve dois filhos e conviveu diariament­e com veterinári­os, biólogos e tratadores, entre outros profission­ais.

Em 2009, foi solta na Ilha do Bororé, no extremo sul da capital, com um microchip de identifica­ção. De tempos em tempos, chegavam notícias de lá: Binha estava adaptada, havia se juntado a outros bugios, tudo ia bem. Até que, no começo do ano, avisaram que ela havia desapareci­do.

Pouco depois, ainda em janeiro, uma fêmea de bugio foi encontrada na região e enviada ao Cemacas. Ao passar o leitor de microchip, o aparelho só confirmou o que todos ali já temiam. O laudo depois confirmou: Binha morrera de febre amarela.

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De cima para baixo, sagui, o bugio Benjamin e grupo de macacos-prego do Cemacas, da prefeitura; acima, macaco-barrigudo em jaula protegida por tela no Zoo
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Fotos Rafael Hupsel/Folhapress
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