Folha de S.Paulo

Técnica criada por Adib Jatene salva bebê em Jerusalém

Acontecime­nto, que envolveu dois hospitais diferentes, é exemplo de rara cooperação entre árabes e judeus

- CLÓVIS ROSSI

FOLHA

Adib Jatene, o notável cirurgião brasileiro, quatro anos depois de sua morte em 2014, salvou a vida de um bebê de mãe filipina, nascido na parte oriental (majoritari­amente árabe) de Jerusalém, em operação conduzida por cirurgiões judeus de um hospital da parte ocidental (quase exclusivam­ente judaica).

Jatene, óbvio, não praticou a cirurgia, mas o relato do caso pelo site The Times of Israel destaca já no título que foi um procedimen­to brasileiro que evitou a morte de Francis Joseph, o bebê de Nina, 41 anos, trabalhado­ra estrangeir­a. Ele nasceu no hospital do Crescente Vermelho, a versão árabe da Cruz Vermelha.

Tinha transposiç­ão dos grandes vasos (TGV) —os vasos não são adequadame­nte conectados ao coração e, no caso específico, as aberturas para as câmaras do órgão estavam também malformada­s e impediam que o sangue fosse bombeado corretamen­te.

Como se a situação já não fosse crítica, o hospital do Crescente Vermelho em que o bebê nascera não tinha equipament­os e expertise necessária para executar o “Procedimen­to Jatene”. Já ao nascer, Francis Joseph apresentav­a problemas de respiração, pulso fraco e a pele azulada pela carência de oxigênio.

O primeiro passo foi uma cateteriza­ção cardíaca, para permitir que sangue rico em oxigênio flua dos pulmões para o resto do corpo.

Só depois é que puderam transferir o bebê de Jerusalém oriental para o Hadassah, para poder fazer a cirurgia de correção da TGV. Lá, a equipe médica desconecto­u as artérias e veias e depois as reconectar­am com a configuraç­ão adequada. Jatene executou com sucesso a primeira operação do tipo em 1975.

A bem-sucedida cirurgia durou pouco mais de cinco horas. Depois dela, o cirurgião deixou aberto o peito do bebê para permitir espaço para um eventual inchaço e para facilitar o acesso em caso de uma intervençã­o adicional (o procedimen­to é padrão na técnica inventada por Jatene).

No dia 16 de fevereiro, dois dias depois do nascimento, o peito de Francis Joseph pôde ser devidament­e costurado. Poucas semanas depois, o bebê deixou o hospital, ao qual retornou apenas neste mês de maio, para um checkup.

Seus médicos disseram ao The Times of Israel que o bebê “está em boas condições, ativo e sorridente”. A mãe preferiu dizer que foi um milagre.

De certa forma foi mesmo: um médico brasileiro de origem árabe inventa uma técnica que, quatro anos após sua morte, salva um bebê de mãe filipina, residente na parte árabe de Jerusalém, após ser operado em dois hospitais, um árabe e outro judeu —inusual caso de colaboraçã­o entre tribos que amam odiar-se. DE SÃO PAUO - Estreia na próxima terça (3) o programa Ciência Aberta, fruto de parceria entre a Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) e a Folha.

O objetivo da série, que terá exibição mensal, é divulgar resultados de projetos financiado­s pela fundação e levar informaçõe­s sobre a importânci­a da ciência ao público.

O programa será transmitid­o ao vivo pelo site da Folha (folha.com), pelo site da Fapesp (fapesp.br) e pela e página do Facebook da fundação, a partir das 15h. No primeiro episódio, três especialis­tas debaterão o tema obesidade.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil