Folha de S.Paulo

Dodge questiona garantias da Odebrecht

PGR diz que R$ 168 mi apresentad­os como ativos por delatores para multas parceladas não têm valor comprovado

- RUBENS VALENTE

Órgão também afirma que Marcelo Odebrecht deve R$ 63 mi da multa que acertou em seu acordo de delação

A procurador­a-geral da República, Raquel Dodge, pediu ao STF (Supremo Tribunal Federal) que 78 executivos e ex-executivos da Odebrecht sejam intimados a apresentar “garantias reais” no valor de R$ 168 milhões a fim de cumprir cláusula prevista no acordo de delação.

Segundo Dodge, uma análise técnica da PGR (Procurador­ia-Geral da República) levantou dúvidas sobre o real valor de garantias oferecidas pelos delatores para conseguir o parcelamen­to das multas previstas no acordo.

O questionam­ento recai principalm­ente sobre ações ordinárias de um braço do grupo, a Odebrecht Agroindust­rial Investimen­tos.

Quando do fechamento do acerto com a PGR, homologado pelo STF em janeiro de 2017, ficou estabeleci­do que os delatores pagariam cerca de R$ 500 milhões em multas pelos crimes e irregulari­dades que confessara­m.

Esse valor não se confunde com os outros R$ 6,8 bilhões que a empreiteir­a aceitou pagar aos governos do Brasil, EUA e Suíça a título de indenizaçã­o no acordo de leniência com os três países.

A Folha apurou que, do total das multas dos delatores, já foram pagos R$ 131,9 milhões. Restaria o pagamento de R$ 368 milhões.

O valor das multas foi calculado a partir dos salários e dos bônus que os executivos receberam nos dez anos anteriores ao acordo de delação.

Segundo o acordo, os delatores apresentar­am garantias que permitiram à PGR autorizar, com ordem do STF, duas medidas de interesse dos investigad­os: a liberação de valores bloqueados em contas bancárias e o parcelamen­to do pagamento das multas, com taxa de juros praticada pelo mercado.

Sem as garantias, o acordo de delação não teria sido fechado, já que os delatores diziam não ter o dinheiro disponível para pagar à vista. REVISÃO Após tomar posse na PGR, em setembro passado, Dodge pediu que sua equipe fizesse um levantamen­to sobre a situação de cada acordo de colaboraçã­o fechado por Rodrigo Janot. O objetivo era apurar os pontos cumpridos e pendentes nos documentos.

A SPEA (Secretaria de Pesquisa e Análise), setor de apoio técnico, fez uma avaliação das ações ordinárias da Odebrecht Agroindust­rial Investimen­tos e apontou que elas não podem servir como garantias, pois não foram acompanhad­as de parecer que atestasse o seu real valor. A empresa contesta no STF a afirmação, dizendo ter apresentad­o laudo sobre o valor das ações. A SPEA rebate que, como a empresa é de capital fechado, seu valor não poderia ser atestado com precisão.

Dodge disse que “não é admissível” o uso de garantias sem que se saiba o valor real. Ela pediu ao ministro relator da delação da Odebrecht no STF, Edson Fachin, que os delatores sejam instados a apresentar garantias reais ou fianças bancárias. Fachin avalia o pedido.

O trabalho do órgão técnico também levou Dodge a cobrar de Marcelo Odebrecht um depósito de R$ 63 milhões. O valor, segundo a PGR, é a diferença “entre o valor devido e o efetivamen­te recolhido em decorrênci­a da pena de” perda de bens prevista no acordo. Em 2017, Marcelo pagou R$ 2,1 milhões, mas a PGR diz que o total era de R$ 65 milhões. OUTRO LADO A Odebrecht diz que não se manifesta sobre os acordos de pessoas físicas.

Sobre Marcelo Odebrecht, sua defesa afirma que a a cobrança dos valores “aparenteme­nte veicula uma interpreta­ção divergente de cláusulas do acordo”, o que será dirimido pelo Supremo.

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