De Cambridge a São Paulo
O ESCÂNDALO em torno da empresa Cambridge Analytica remonta à entrada do Facebook na seara da propaganda política em 2012, quando os informáticos convertidos em marqueteiros da equipe de Barack Obama adaptaram a tecnologia de publicidade dirigida do comércio para a campanha eleitoral com retumbante sucesso. No entanto, as eleições presidenciais de 2016 mostraram que as redes sociais estavam longe de ser uma panaceia.
A equipe de Hillary Clinton confiava cegamente no seu poderoso algoritmo, tal como os astronautas da Odisseia no Espaço seguiam o supercomputador Hal. A previsão, como sabemos, era uma quimera.
Pesquisas mais recentes sobre as campanhas eleitorais na era digital indicam a resiliência dos meios tradicionais. Os jornais, canais de televisão, e estações de rádio locais, por exemplo, tiveram uma influência a favor de Donald Trump. ocupando o vazio deixado pelos grandes partidos, que caíram na ilusão de pensar que a interação virtual substituiria o corpo-a-corpo.
Não por acaso, Emmanuel Macron triunfou contra duas poderosas máquinas partidárias apostando em ações de porta a porta organizadas por militantes voluntários recrutados pelas redes sociais. A campanha eleitoral do século 21 funciona são colocados ao serviço do real, e não o contrário.
Tendo em conta essas informações, é muito provável que o impacto da Cambridge Analytica, mais conhecida pela sua propensão a recorrer a ameaças e intimidações do que pela sua mestria da alta tecnologia, esteja sendo amplamente exagerado pelos seus próprios funcionários-delatores, que parecem dispostos uma estrategista-em-chefe oriunda do mundo da moda, e um candidato com o fígado no lugar do cérebro.
Tudo indica que a explicação para a vitória está na ousadia e intuição característica dos charlatões, e não numa estratégia baseada em complexas operações informáticas.
Em todo caso, o estrago provocado pelo escândalo da Cambridge Analytica ultrapassa o debate sobre a veracidade dos fatos. Mais cedo do que tarde, o Facebook será obrigado a regular, ou até interditar, a propaganda política.
Para aqueles que depositaram todas as suas fichas nas redes sociais mas profundo conhecedor da micropolítica do estado de São Paulo.
O resultado desse embate entre um “candidato virtual” por excelência e um “candidato real” puro-sangue nos ajudará a entender se a influência da revolução digital nas campanhas eleitorais é uma tendência estruturante, ou uma breve ilusão de ótica.