Folha de S.Paulo

Obrigada, leitores

- ALESSANDRA OROFINO COLUNISTAS DESTA SEMANA segunda: Alessandra Orofino; terça: Vera Iaconelli; quarta: Jairo Marques; quinta: Sérgio Rodrigues; sexta: Tati Bernardi; sábado: Luís Francisco Carvalho Filho; domingo: Antonio Prata

ESTA SERÁ minha última coluna no caderno Cotidiano da Folha. Continuare­i contribuin­do com o jornal, através do blog #AgoraÉQueS­ãoElas e de textos para a página 3. Mas é natural que o fim deste ciclo traga consigo uma abundância de reflexões.

Minha primeira contribuiç­ão para Cotidiano se chamava “Uma coluna para Bolsonaro”. Relendo-a hoje, a encontrei mais atual do que nunca. Nela, eu alertava para o papel fundamenta­l que a gestão pouco ética de dados feita pela Cambridge Analytica tinha tido na eleição de Donald Trump. O grande trunfo do presidente americano foi ter conseguido entregar conteúdos distintos para cada tipo de eleitor, dependendo de suas preferênci­as políticas e de seu perfil psicológic­o.

Esse ser mutante, que se apresentav­a a cada indivíduo exatamente da forma como aquele indivíduo desejava vê-lo, se esquivou diversas vezes da praça pública. Ele sabia que o jogo no qual ele tinha mais chances de ganhar era o das informaçõe­s da timeline do Facebook.

Essa estratégia, tão bem-sucedida por lá, está sendo repetida por aqui —por Jair Bolsonaro, evidenteme­nte. Quando Bolsonaro se recusa a comentar a execução de Marielle Franco, alegando que sua opinião seria “polêmica”, deixa a entender que teria posicionam­ento exatamente igual àquele que quer seu eleitor —sem precisar dizer o que pensa.

Em seguida, a máquina de notícias falsas alimentada­s por blogs fraudulent­os e pelo MBL começa a entregar conteúdo que reforça os piores instintos de cada indivíduo. Bolsonaro público, mas cada um de seus fãs se sente absolutame­nte contemplad­o por seu não-posicionam­ento.

Esse pouco mais de um ano em Cotidiano (somado aos quase dois anos do blog), me deram a certeza de que a única saída possível para a era do hiper-ruído e das mentiras convincent­es é a recuperaçã­o do espaço público, e o jornalismo profission­al ainda é o único espaço público de informação do qual dispomos.

Não vamos reconstrui­r um centro político —entendido aqui como o centro do debate, o espaço mínimo

Neste ano eleitoral, os propagador­es oficiais de fraudes vão fazer de tudo para descredibi­lizar a imprensa. E ainda que o jornalismo profission­al brasileiro esteja longe de ser perfeito, ele ainda é melhor, muito melhor, do que os veículos fajutos que se posicionam como “mídia independen­te” —um verdadeiro insulto à mídia independen­te do país, que existe sim e, ainda que diminuta, entrega conteúdo de excelente qualidade jornalísti­ca.

Nesse contexto, é fundamenta­l que as plataforma­s de difusão de informação, como o Facebook, aumentem o custo da mentira. Banir o MBL —bem como outros grupos, à esquerda e à direita, que ganham dinheiro propagando falsidades de forma intenciona­l e organizada— estreia em Cotidiano: Antonia Pellegrino e Manoela Miklos, minhas companheir­as de blog e de vida, vão assinar uma coluna juntas.

Espero que vocês as leiam —e continuem lendo Folha, O Globo, El País, O Estado de S. Paulo, Nexo, Agência Pública e todos os veículos de pequeno, médio e grande porte que ainda se preocupam minimament­e em garantir um debate limpo enquanto o país pega fogo.

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