Novo trabalho de Jack White é um desastre autoindulgente
partir daí volta no tempo e mostra a vida pregressa de Cunanan, crimes que cometeu, conquistas, derrotas, mentiras e traumas. A história do estilista surge ocasionalmente, com menor ênfase.
O mundo da moda, do luxo, da extravagância e dos exageros que as roupas de Versace representavam é quase deixado de lado. É como personagem secundário. Com tantos nomes de peso ao redor do estilista, é uma pena que o produtor tenha apostado tanto na vida do assassino.
FOLHA
Você pode gostar ou não da música de Jack White, mas uma coisa é certa: ele nunca soou falso, seja nos blues revisionistas no White Stripes, ou no pop superproduzido dos discos solo, “Blunderbuss” (2012) e “Lazaretto” (2014).
Mesmo quando usa referências antigas —ele sempre buscou inspiração em blues e rocks— o fazia com a mais absolutaconvicção.Nuncafoi umcompositorinovador,mas criava discos que homenageavam o passado sem soar datados. Bom, ao menos até lançar “Boarding House Reach”.
O disco novo é um desastre do início ao fim: confuso, sem unidade e pouco inspirado, parece mais uma coleção de faixas inacabadas.
A impressão é de que White, hoje rico, famoso e dono de uma das gravadoras mais legais do planeta, a Third Man, acha que pode fazer o que quiser. E ele pode, claro: é um artista, e artistas não têm limites.
O problema é que os fãs precisam estar dispostos a abrir mão de seu suado dinheirinho para ouvir o disco, e eles podem não curtir a ideia de pagar por uma coleção de experimentos egocêntricos e autoindulgentes.
O disco tem 13 faixas, mas quase nenhuma canção. Algumas são vinhetas curtas, como “Abulia and Akrasia”, em que o cantor de blues C. W. Stoneking, acompanhado por um violino, declama versos supostamente engraçadinhos. O resultado lembra um sub-Tom Waits.
A faixa mais ridiculamente egocêntrica é “Get in the Mind Shaft”, em que White narra (ele não canta, narra) seu primeiro encontro com um piano. Há um tom épico, como se descrevesse ele abrindo o Mar Vermelho.
É triste notar que o sujeito que fez músicas de imediata conexão com o público foi capaz de cometer um disco tão antipático e desanimado. Não dá para lembrar de uma melodia após ouvi-lo.
O que White mais precisa é de um produtor experiente, que seja capaz de frear ou ego descomunal e lembrá-lo que, nofimdascontas,cançõesimportam mais que manifestos. E Jack, que capa é essa? Você com nuvens na cabeça, contemplandoaTerradecimapara baixo? Menos, por favor.