A pior hora para a democracia
É COMPLETAMENTE extemporânea e equivocada a manifestação do comandante do Exército, Eduardo Villas Bôas.
Primeiro porque distorce a história, ao afirmar que sua corporação “compartilha o anseio dos cidadãos de bem de repúdio à impunidade e de respeito à Constituição, à paz social e à democracia”.
As Forças Armadas, não convém esquecer, desrespeitaram a Constituição e a democracia, ao darem o golpe de Estado de 1964. Nunca fizeram um mea-culpa.
Segundo, porque é igualmente incorreto dizer que a corporação repudia a impunidade. As violações aos direitos humanos praticadas com abundância no período da ditadura (1964/85) ficaram, no geral, absolutamente impunes.
Tão impunes que um oficial da reserva, hoje deputado, Jair Bolsonaro, faz a apologia de um notório torturador, o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra (1932-2015), o primeiro crime de tortura. em crimes de corrupção —aparente alvo do general Villas Bôas— e silenciar sobre a impunidade em violações dos direitos humanos.
Essas distorções tornam inquietante a afirmação do general de que o Exército está atento às suas missões institucionais. Se o chefe de turno do Exército silencia sobre a violação da missão institucional praticada em 1964 por seus antecessores, fica o justificado temor de que o entendimento do que vem a ser, seja outra vez torcido.
Fica ainda mais inquietante essa referência pouco clara no contexto da fragilização da democracia em curso não só no Brasil mas em toda a América Latina, para não dizer em boa parte do mundo ocidental.
O momento que vive o pior dos regimes, salvo todos os outros, como dizia Winston Churchill (1874-1965), é assim descrito no “Barômetro das Américas”, pesquisa da Vanderbilt básicas, da vigência da lei, da segurança dos cidadãos e de serviços [públicos] sólidos”.
É natural, embora triste, que o apoio à democracia e a seus princípios e instituições tenha caído, em 2017, para 57,8%, redução de 12 pontos percentuais em relação ao pico de 69,8% registrado em 2012.
Uma das causas da queda no apoio é a constatação de que a confiança nas instituições democráticas é mais forte “quando funcionários públicos e políticos evitam comportamentos corruptos”.
Ora, nesse capítulo, é inevitável concordar com Antonio Navalón, colunista de El País, quando ele escreve: do general Villas Bôas.
Se são uma ameaça ou apenas uma manifestação completamente fora de lugar, só o tempo dirá. Mas é forçoso constatar que ou a democracia se corrige ela própria ou outras ameaças virão, de gente fardada ou de candidatos a messias —tipos que nunca faltaram na história latino-americana.