Folha de S.Paulo

Alckmin suaviza críticas ao PT e afaga França ao deixar governo

Em tom institucio­nal, tucano não cita Lula, prega união do Brasil e defende austeridad­e

- THAIS BILENKY Variação PEDRO DINIZ

Vice assume gestão com indiretas a Doria, a quem acusa de ser desleal e contra quem disputará a sucessão

Ao transmitir o cargo de governador de São Paulo, nesta sexta-feira (6) para disputar a eleição presidenci­al, Geraldo Alckmin (PSDB) baixou o tom nas críticas ao PT e fez um aceno, ainda que modesto, ao presidente Michel Temer (MDB).

O vice, Márcio França (PSB), assumiu o governo com um discurso pautado pelo valor da lealdade, no que deve ser a tônica de sua campanha à reeleição contra o agora exprefeito João Doria (PSDB).

Em gesto de apoio ao pessebista, Alckmin disse que seu governo “não terminou”, tinha ali uma “nova largada”. O tucano elogiou a “lealdade e competênci­a” de França, pregou a austeridad­e na gestão pública, mas defendeu o combate a privilégio­s e uma agenda que atenda a população pobre do país.

“O que aguarda o vencedor deste ano nas eleições presidenci­ais é um governo difícil, com a herança duríssima deixada pelo PT, que apenas começou a ser enfrentada pelo governo do atual presidente da República”, discursou.

Aliados disseram que Alckmin quis imprimir uma “marca presidenci­al”, por isso suavizou o discurso em relação a dezembro, quando disse que Lula queria “voltar à cena do crime”.

“Vamos nos unir, não separar”, declarou agora. “O Brasil cansou de indecência, da roubalheir­a, está farto de poucos privilegia­dos se darem bem”, discursou, agora oficialmen­te pré-candidato.

“Nenhum governante gosta de adotar medidas de austeridad­e. Lamentavel­mente há momentos em que elas são

Os índices do governo Alckmin

-72% necessária­s”, disse, “para atender quem mais precisa do Estado e evitar que a parcela mais pobre da população seja a mais penalizada em momentos de crise”.

“Se mais não fizemos, não terá sido por falta de esforço. Tenho a certeza de termos feito o melhor ainda mais quando se considera que atravessam­os a pior crise econômica em décadas sem deixar o estado afundar junto”, declarou.

Alckmin pigarreou ao cumpriment­ar França como governador de São Paulo e fez uma pausa para deixar ecoarem gritos de “Geraldo presidente” no salão do Palácio dos Bandeirant­es lotado com centenas de convidados

Questionad­o após a solenidade sobre como a iminente prisão de Lula afetaria a campanha eleitoral, Alckmin se limitou a dizer que “a lei é para todos” e que “decisão judicial se cumpre” —frases que repete incansavel­mente.

“O mesmo”, respondeu quando indagado sobre a prisão de Paulo Vieira de Souza, ex-diretor da Dersa no seu governo, apontado como operador do PSDB.

Em sua fala, o tucano justificou seu estilo, considerad­o passivo demais por alguns interlocut­ores. “Falo menos e procuro fazer mais. No Brasil de onde venho, o que vale é o olho no olho, o que conta é mesmo o trabalho”. DISCURSO-POEMA O recém-empossado governador pediu aplausos de pé a Alckmin —embora ele próprio não tenha aplaudido—, elogiou sua “humildade, discrição, perseveran­ça” e cutucou indiretame­nte Doria.

“No dicionário cravado em nossos corações, só uma palavra precede a palavra lealdade, e essa palavra é gratidão”, declarou França.

O novo governador tem criticado Doria por ter sido eleito prefeito de São Paulo em 2016 com apoio de Alckmin e dele próprio. No entanto, resolveu se candidatar ao governo paulista contra a vontade de ambos.

A tentativa durante meses de se viabilizar como candidato a presidente, a despeito dos planos de seu padrinho político, tornou Doria o maior adversário de aliados de Alckmin e França.

Com o visual recauchuta­do, mais magro e sem barba, França apresentou pelo nome a família presente à posse: filhos, nora, netos, a mãe, irmãos e primos. Ao falar da mulher, Lucia, ele se mostrou emocionado e, também neste momento, manteve a linhamestr­a do discurso. “Amo tudo em você, mas acima de tudo a sua lealdade”, disse.

Ritmado e permeado de rimas, o discurso de França começou como um poema. “Ah a lealdade.../ essa velha e honrada senhora certeira / Não tem dia e não tem hora, que eu te esqueça / Nem que o mundo acabe ou que eu desapareça... Lá vai você comigo, minha querida companheir­a”, declamou.

COLUNISTA DA FOLHA

Lideranças de ONGs e associaçõe­s de apoio à causa LGBT reagiram com espanto e revolta às declaraçõe­s do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Gilmar Mendes, em Portugal. Ele disse acreditar que um suposto processo de desinstitu­cionalizaç­ão do país promovido pelo PT tem a ver com “más escolhas [de magistrado­s] para o Supremo”.

Sem citar nomes, afirmou que foram privilegia­das nas indicações petistas “pessoas ligadas ao movimento LGBT, ao MST, basistas e coisas desse tipo”, e o resultado dessa composição é um “direito penal totalitári­o”.

“Esse é Gilmar sendo Gilmar, sempre contraditó­rio em suas colocações”, disse o cofundador da Parada do Orgulho LGBT de São Paulo, Nelson Pereira. O comentário do ministro, para ele, não pode ser considerad­o preconceit­o velado porque “já é descarado e fora da conjuntura. Vincula uma incapacida­de técnica aos homossexua­is”.

De Washington (EUA), onde participa de reunião com a Organizaçã­o PanAmerica­na de Saúde, o presidente da Aliança Nacional LGBTI, Toni Reis, relaciona a “avaliação equivocada” do magistrado ao propósito das “fake news” de mudar fatos e descontext­ualizá-los.

“É uma fala descabida. A comunidade já foi acusada de tudo, de destruir famílias e até de contaminar a raça ariana do [líder nazista, Adolf ] Hitler. Agora, é de fazer lobby por privilégio­s.”

Ele disse que nunca houve pressão do movimento gay nas indicações ao STF porque “não temos esse poder” e “as pessoas estão lá por méritos próprios”.

Ele lembra que o processo de escolha para ministros do Supremo parte do presidente, que indica o nome para a vaga e envia a proposta para validação do senado. “A batata quente, qualquer problema relacionad­o a essas escolhas, está lá, no congresso”, diz.

Para a presidente da Comissão da Diversidad­e Sexual e Gênero da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Maria Berenice Dias, Gilmar “derramou seu fel preconceit­uoso sobre o segmento, assumindo postura desmedida e homofóbica”.

De acordo com ela, é esse tipo de postura que faz “muitos magistrado­s homossexua­is não assumirem sua sexualidad­e”, por medo de retaliação.

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Aloisio Mauricio /Fotoarena/Folhapress Geraldo Alckmin (esq.) e Márcio França na transmissã­o de cargo no Palácio dos Bandeirant­es, cerimônia marcada pela repetição da palavra lealdade

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