Folha de S.Paulo

Investir em meio às turbulênci­as no Brasil e exterior exige cuidado

Tensão entre EUA e China e incertezas sobre eleições no país aumentam volatilida­de de ativos

- DANIELLE BRANT

Fundos multimerca­dos são opção para quem tem receio de entrar em Bolsa, mas quer diversific­ar os ativos

A ameaça de uma guerra comercial entre Estados Unidos e China e as incertezas em relação às eleições após a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva levaram analistas a reforçar a recomendaç­ão de cautela aos investidor­es.

A orientação é buscar aplicações que consigam amortecer o impacto negativo dessas turbulênci­as.

No exterior, a crise entre EUA e China provocou fortes volatilida­des nas Bolsas globais. Desde que começaram a aparecer notícias, em fevereiro, de que o presidente Donald Trump estudava tarifas sobre aço e alumínio importados, os principais índices americanos zeraram ganhos no ano e passaram para o negativo.

O Dow Jones, que reúne as ações mais negociadas em Nova York, tem perda de 3,6% em 2018. S&P 500 e Nasdaq foram pelo mesmo caminho: no ano, perdem, respectiva­mente, 3% e 0,5%.

No Ibovespa, índice das ações mais negociadas no Brasil, o efeito também foi expressivo, e se somou às oscilações provocadas pelo julgamento do habeas corpus do ex-presidente Lula e pela prisão do petista, decretada pelo juiz Sergio Moro na quinta-feira (5).

As turbulênci­as exigem cautela do investidor, diz Francisco Levy, diretor da associação Planejar. “O investidor deve tomar cuidado. Quem estava com forte apetite a risco deve ser menos ousado, é hora de reduzir marginalme­nte o risco.”

No mercado, alguns especialis­tas já fizeram isso. Ronaldo Patah, estrategis­ta de investimen­tos do UBS Wealth Management, revisou as alocações em Bolsa, principalm­ente estrangeir­a.

“Há um risco de piora na questão comercial entre EUA e China, somado ao risco de volta da inflação nos EUA, dado que a economia está aquecida e praticamen­te com pleno emprego”, diz.

A conjuntura aumenta a volatilida­de dos ativos internacio­nais e afeta o mercado brasileiro. “O cenário eleitoral tende a fazer com que seja melhor reduzir o risco das carteiras. Recomendam­os uma posição acima do neutro em Bolsa pelo cresciment­o econômico, mas antes estávamos com uma aposta mais positiva”, diz. POR SETORES Mesmo em meio a essa instabilid­ade, há, na Bolsa, setores que conseguem escapar quase imunes. Carlos Eduardo Rocha, sócio e responsáve­l pela gestora do Brasil Plural, avalia que ainda há oportunida­des para quem não quer deixar de ter exposição à renda variável.

“Gostamos de empresas cujo cresciment­o independe da expansão do Brasil e do mundo. Empresas de consumo, por exemplo, mantinham o cresciment­o mesmo durante a recessão. Também gostamos dos setores de educação e financeiro”, diz.

Dan Kawa, responsáve­l de multimerca­dos da Icatu Vanguarda, aposta em empresas do setor elétrico, financeiro e de saneamento. “Elas têm uma previsibil­idade de cresciment­o e de fluxo de caixa.”

Por outro lado, o aumento do protecioni­smo americano afeta ações de empresas ligadas a commoditie­s, cujos preços caíram sob impacto da disputa tarifária.

“Algumas empresas foram afetadas mais pela percepção de risco do que pelo fundamento. A Usiminas, com o fechamento do mercado americano, não vai crescer tanto como no Brasil. A própria Vale foi afetada, porque as mineradora­s foram prejudicad­as pelo caso EUA e China”, diz Rocha, do Brasil Plural.

Um meio-termo para quem receia entrar em Bolsa no momento são os fundos multimerca­dos, que aplicam parte dos recursos em renda fixa, mas têm liberdade para comprar ativos no exterior e investir em moedas e juros.

Marcelo Flora, sócio do BTG Pactual e responsáve­l pelo BTG Pactual Digital, vê procura maior por esse produto.

“Faz sentido o investidor buscar bons gestores de fundos e ter um portfólio diversific­ado. Ele precisa de gestores atentos a esses movimentos no exterior e que consigam realocar investimen­tos, em busca do melhor retorno para os clientes”, diz.

A queda da taxa básica de juros, a Selic, tem provocado a troca de produtos tradiciona­is protegidos pelo FGC (Fundo Garantidor de Crédito) por fundos multimerca­dos.

“A indústria de fundos se beneficia desse fluxo. Mesmo investidor­es que aplicavam em LCA [Letra de Crédito do Agronegóci­o] e LCI [Letra de Crédito Imobiliári­o], à medida que esses títulos vão vencendo, buscam melhores alternativ­as”, ressalta. RENDA FIXA Quem pensa em recorrer à renda fixa em busca de proteção deve prestar atenção.

O rendimento dos produtos está bem distante dos dois dígitos observados até o ano passado.

“O brasileiro vai se acostumar com uma perspectiv­a de juros baixos. É bem possível que tenha taxa relativame­nte baixa até o fim de 2018, o que significa que a renda fixa não deve trazer grandes ganhos ao investidor. Ele vai ter de correr mais risco”, diz Roberto Indech, analista-chefe da Rico Investimen­tos.

Mas ainda é possível encontrar oportunida­des. Para Patah, do UBS, títulos públicos atrelados a índices de preços com vencimento mais longo têm um retorno interessan­te de IPCA mais 4,5%.

Caio Mercadante, estrategis­ta-chefe de investimen­tos do BNP Paribas no Brasil, sugere COEs (certificad­os de operações estruturad­as), que combinam uma parte de renda fixa e ativos mais arriscados, como commoditie­s, moedas e Bolsas estrangeir­as. “É um produto que protege bem a carteira dos clientes”, diz. E SEUS INVESTIMEN­TOS? Bolsa Aplicar em ações fica mais instável em períodos turbulento­s. O investidor deve manter o sangue frio e estabelece­r um percentual máximo de perda que tolera, antes de vender o papel Ações de empresas mais sensíveis à briga, como siderúrgic­as, acabam sofrendo mais; por outro lado, a queda pode dar lugar a pechinchas no mercado Crise pode provocar valorizaçã­o do dólar; empresas com receita em dólar podem se beneficiar do cenário

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