Aposentado que segue ativo perde renda
Salário se reduz em até 80%, segundo estudo do Ibre; aposentadorias precoces diminuem PIB em até 0,7% ao ano
antes dos 60 anos de idade balho com carteira assinada se aposenta em geral apenas pelo tempo de contribuição —30 anos para mulheres e 35 anos para homens.
Isso retira do mercado de trabalho profissionais em idade produtiva. Pesquisa Datafolha que investiga os valores e hábitos das faixas etárias brasileiras mostra que são 70% os aposentados brasileiros que pararam antes dos 60 anos de idade (20% se retiraram antes dos 50).
O levantamento aponta que esses trabalhadores são, em sua maioria, qualificados. Na fatia com ensino superior, 60% se aposentaram entre os 50 e os 60 anos, e a média de idade foi de 55,2 anos.
Os brasileiros com ensino médio são os que requerem o benefício mais cedo: em média aos 51,2 anos, sendo que 38% parou antes dos 50.
Os que esperam mais tempo para pedir aposentadoria —em média, aos 57,8 anos— são os brasileiros com ensino fundamental. Entre esse grupo, 35% pediram o benefício após os 60 anos.
Uma especificidade do regime previdenciário brasileiro é a possibilidade de acumular o beneficio previdenciário com renda do trabalho. Essa regra é incomum no contexto internacional, já que, em muitos países, a aposentadoria está associada à incapacidade para trabalhar. DESIGUALDADE O estudo de Ottoni e Barbosa Filho não tinha como objetivo identificar o destino desses brasileiros que seguem ativos, embora aposentados, mas, segundo eles, é possível que alguns desses profissionais migrem do setor formal para o informal. Isso ajudaria a explicar a significativa perda de renda que eles sofrem na transição.
O aumento da informalidade provocado pelas aposentadorias precoces tem impacto negativo sobre as contas públicas, o que também reduz o crescimento do país.
“Aumenta a informalidade, já que não faz mais sentido contribuir para a Previdência. E isso reduz a arrecadação do governo”, diz Ottoni. Outro impacto negativo da aposentadoria precoce é sobre a desigualdade de renda.
Um levantamento feito por Rogério Nagamine Costanzi e Graziela Ansiliero, do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), mostra que uma grande fatia dos brasileiros que requer o benefício antes dos 60 anos e segue trabalhando vem de estratos de renda mais altos.
Em 2014, eles identificaram que 86,3% das aposentadorias foram concedidas para pessoas com menos de 60 anos de idade.
No total, naquele ano, havia quase 1 milhão de aposentados que continuavam ocupados na faixa etária de 45 a 59 anos para homens e 45 a 54 anos para mulheres (grupos de idade selecionados de forma a excluir benefícios concedidos por idade). Entre os aposentados ocupados, 78% pertenciam ao grupo dos 30% mais ricos do país. MUDANÇA DE INCENTIVO Para especialistas, os efeitos negativos das aposentadorias precoces tornaram a aprovação de novas regras inevitável, mas a reforma parou. A expectativa é que a nova proposta de mudanças seja feita somente pelo próximo governo.
“A reforma da Previdência é uma questão de ajuste das contas [públicas], mas mais do que isso é fundamental para termos um país viável”, diz Vladimir Kuhl Teles, vice-diretor da Escola de Economia de São Paulo (EESP) da FGV.
Barbosa Filho ressalta que, ao aumentar a idade mínima para a aposentadoria, mais brasileiros permanecerão na ativa e, provavelmente, com salários mais altos. “Isso terá o efeito de aumentar nosso PIB per capita”, diz.
Um desafio, porém, segundo a demógrafa Simone Wajnman, será a inserção dos trabalhadores mais maduros no mercado de trabalho.
“Resta saber se vai ter espaço para essa parcela da população”, diz ela, que é pesquisadora do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais).
Ela diz acreditar que a recém-aprovada reforma trabalhista facilitará esse processo, pois aumentou a flexibilidade nas relações trabalhistas.
“O trabalho remoto é um exemplo. Imagine um idoso duas horas no trânsito só para chegar ao trabalho em grandes metrópoles”.