Folha de S.Paulo

A MULHER QUE ROUBAVA LIVROS

Felipe Hirsch lança o filme ‘Severina’, história de amor e mistério imersa num universo de paixão pela literatura

- SEGUNDA-FEIRA, 9 DE ABRIL DE 2018 THALES DE MENEZES

“Severina”, que estreia nos cinemas nesta quinta (12), é uma declaração de amor aos livros. Carla Quevedo, atriz argentina que interpreta Ana, principal personagem feminina, concorda. Seu conterrâne­o e também protagonis­ta, Javier Drolas, acredita que o filme é uma visão muito particular do gênero da comédia romântica.

O brasileiro Felipe Hirsch, que rodou no Uruguai essa adaptação do romance do escritor guatemalte­co Rodrigo Rey Rosa, pensou muito sobre a singularid­ade de fazer um filme aparenteme­nte não político num momento de sua trajetória no teatro e no cinema totalmente imerso em questões sociopolít­icas da América Latina.

“Fiz um filme só sobre o amor. Bem, como se falar só sobre o amor fosse pouca coisa”, diz Hirsch à Folha .“A ideia desse filme ficou muito tempo comigo, até que percebi que gostaria de fazer um filme fora do Zeitgeist.”

Difícil saber se ele realmente conseguiu se distanciar do “espírito de sua época”, tradução possível para esse termo alemão. “Severina” tem um evidente caráter atemporal, poderia ser lançado em 1978 exatamente como foi rodado. Mas esbarra em questões pertinente­s em 2018.

“Algumas discussões se encaixam hoje”, diz Hirsch. “Como o fim das livrarias de rua, talvez uma América Latina que já não existe mais. Também o debate que compara as memórias mais digitais às memórias analógicas. Mas é um filme de amor.” LADRA SEDUTORA “Severina” mostra o envolvimen­to de um livreiro (Drolas) com uma garota que vai até sua loja roubar livros de forma sistemátic­a. Ele percebe, mas deixa que ela continue fazendo isso porque fica encantado por Ana.

A aproximaçã­o dos dois é turbulenta. Ele descobrirá que ela vive com um homem mais velho, que pode ser seu pai ou seu amante, e que o hábito de roubar volumes é um exercício que Ana repete em várias livrarias da cidade. Em cada uma, deixa um livreiro enamorado.

“Não sei se ela se apaixona por eles”, questiona Carla. “Discuti muito com Javier e Felipe se Ana é consciente de seu poder de sedução. Creio que construí a personagem a partir dessa ideia de um jogo. Talvez sua motivação seja a adrenalina de estar roubando os livros e saber que aqueles homens percebem o que ela está fazendo.”

Para Drolas, o mistério sobre a personagem conduz o filme. Carla gosta da proposta de não buscar justificat­ivas, de não intelectua­lizar demais a ação de Ana. “Talvez ela queira apenas continuar essa história, talvez esteja imitando as heroínas de tantos livros que rouba, buscando uma nova aventura.”

Hirsch nunca tinha trabalhado com a atriz. Carla conta que ele gostou de seu desempenho na série da HBO “Show Me a Hero”. Ela vive há oito anos nos Estados Unidos. Os brasileiro­s podem se lembrar dela, muito jovem, num papel no vencedor do Oscar de filme estrangeir­o em 2010, “O Segredo dos Seus Olhos”.

Drolas, do argentino “Medianeras” (2011), teve um papel em “A Menina Sem Qualidades”, série que Hirsch dirigiu para a MTV, em 2013, e voltou a trabalhar com o diretor em peças recentes. É o período que Hirsch define como fase de abordar questões sociopolít­icas claras, como as montagens da tetralogia “Puzzle” e “A Tragédia e a Comédia Latino-Americana.”

“Eu escrevi uma série com 20 escritores da América Latina, que está inédita. Fiquei próximo desses autores e um deles foi o Rodrigo Rey Rosa. Roberto Bolaño o considerav­a um gênio. Ele se tornou uma espécie de autor dos autores”, conta Hirsch. SEGUNDA OPÇÃO

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A atriz Carla Quevedo em cena de ‘Severina’, longa rodado em Montevidéu

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