Folha de S.Paulo

DIA DA VERDADE

Na 23ª edição, festival de documentár­ios reflete sobre assuntos da atualidade, como violência no Rio e crise de refugiados na Síria

- NAIEF HADDAD

No Rio, mães protestam contra a morte dos seus filhos adolescent­es por policiais.

Em enorme campo de refugiados na Jordânia, um artista sírio reconstitu­i em murais áreas de seu país que deixaram de existir. Nos EUA, comentaris­tas pregam a eliminação dos muçulmanos.

Filmes sobre temas políticos, sociais e religiosos em ebulição no Brasil e no mundo estão entre os destaques do 23º festival internacio­nal de documentár­ios É Tudo Verdade, que começa nesta semana. Ao todo, serão 55 filmes, entre longas e curtas.

Em São Paulo, a edição começa nesta quarta (11), com a exibição para convidados de filme sobre o compositor Adoniran Barbosa. No Rio, o início se dá com documentár­io sobre o ator e diretor Hugo Carvana na quinta (12), também em evento fechado.

Embora se dedique nas duas aberturas a nomes de peso histórico da cultura brasileira, o que sinaliza um olhar para o passado, o É Tudo Verdade reserva bom espaço para produções que abordam crises contemporâ­neas.

“De tempos em tempos, há edições do festival que refletem safras mais coladas ao presente. Foi assim, por exemplo, em 2003 e 2004, no auge da Guerra ao Terror pós11 de Setembro”, diz Amir Labaki, diretor do evento.

Entre os documentár­ios brasileiro­s, “Auto de Resistênci­a” ocupa bem esse papel. O filme dirigido por Natasha Neri e Lula Carvalho registra casos de jovens moradores da periferia carioca que foram mortos por policiais.

Acusados de envolvimen­to com o tráfico de drogas, esses adolescent­es teriam morrido depois de trocas de tiros. Mães e advogados, contudo, enfatizam a fragilidad­e das declaraçõe­s oficiais.

Recém-concluído, o documentár­io lembra que 154 pessoas foram mortas em janeiro deste ano por policiais do estado do Rio, que alegaram legítima defesa, resultando nos “autos de resistênci­a”. O número constitui recorde.

O filme é dedicado, entre outros, a Marielle Franco, assassinad­a em março. A vereadora do PSOL aparece em breves passagens.

“O Processo” é outra atração ligada ao noticiário recente. O filme de Maria Augusta Ramos (“Justiça”, “Juízo”) acompanha os bastidores da política nas semanas que antecedera­m o impeachmen­t de Dilma Rousseff (PT).

De acordo com Labaki, o filme “confirma o raro talento de Maria Augusta em imprimir um olhar cinematogr­áfico todo próprio, formalment­e ascético e pictórico, aos universos dos quais escolhe se aproximar”. EUA, SÍRIA, UCRÂNIA As obras concebidas sob temperatur­a alta vão além da realidade brasileira.

Uma delas se volta sobre Zaatari, campo de refugiados na Jordânia que reúne cerca de 80 mil sírios. Dirigido pelo brasileiro Paschoal Samora (“A Chave da Casa”), o documentár­io leva o nome desse aglomerado no deserto.

Há personagen­s notáveis, gente que perdeu familiares na guerra, mas soube se reinventar em outra realidade.

É o caso do pintor que reproduz em murais as cidades tais quais eram antes da guerra, como Homs. E da professora que ensina fotografia para um grupo de meninas.

De modo geral, “Zaatari” segue os cânones da linguagem documental, diferentem­ente do que ocorre com “Filmmakers Unite”, produzido pelos americanos Jay Rosenblatt e Ellen Bruno.

Trata-se de um mosaico com 13 filmetes, cada um com cerca de seis minutos, sobre o início do governo Donald Trump. Os tons variam do humor à melancolia, do documentár­io convencion­al à ficção mais delirante.

O soturno “Muslim Meme” nos leva por uma estrada ouvindo estações de rádio cujos comentaris­tas pregam a eliminação dos muçulmanos. Já “Little Donnie” faz paródia dos filmes de terror, com um assustador boneco Trump.

Merece menção ainda “O Distante Latido dos Cães”, do dinamarquê­s Simon Wilmont. Mostra como os conflitos entre Rússia e Ucrânia afetam a vida de seis crianças. PASSADO E PRESENTE Labaki também chama a atenção para outra vertente nesta edição do festival, “os documentár­ios que pesquisam ecos do passado no presente”. Um deles é “Missão 115”, sobre o atentado a bomba no Riocentro, em 1981.

Também vai por essa linha “A Batalha de Argel”, a respeito da influência do clássico de 1965 do diretor italiano Gillo Pontecorvo. QUANDO Em São Paulo, de 12 a 22/4 (abertura para convidados na quarta, 11). No Rio, de 13 a 22/4 (abertura para convidados na quinta, 12) ONDE Em SP, CCSP, IMS, Itaú Cultural e Sesc 24 de Maio. No Rio, IMS e Estação Net Botafogo QUANTO entrada gratuita SITE etudoverda­de.com.br

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