Folha de S.Paulo

Filme inaugural tenta mostrar Adoniran além da alegria boêmia

- INÁCIO ARAUJO

FOLHA

“Adoniran – Meu Nome É João Rubinato” não escapa ao arsenal de formas consagrada­s pelo documentár­io contemporâ­neo: entrevista­s; fotos e filmes reencontra­dos; filmagens adjacentes.

Seu objetivo é, porém, bem menos convencion­al: tratase revelar um Adoniran que não conhecemos (ou poucos conhecem) sem por isso apagar aquele que se conhece.

O que se conhece: o compositor, sambista paulistano por excelência, cronista agudo dos bairros periférico­s (ainda que de uma “periferia interior”, como o Bexiga), o inventor de um vocabulári­o pessoal, que se tornou tradução exata do italianado paulista. A isso pode se seguir uma fileira de etcéteras.

É disso tudo que “Adoniran” busca dar conta. Não é um esforço pequeno: trata-se de encontrar a singularid­ade numa obra (e numa vida) bastante plural, em que o trabalho como radialista e ator (de rádio, de TV, de cinema) não é bem secundário.

Ao contrário: para o filme, o fato central, mais que o samba, é o rádio. Ali ele quis entrar como calouro, se fez compositor (e cantor) tendo como modelo a canção carioca. Ali também desenvolve­u tipos humorístic­os.

Isso, a fama de boêmio, o jeito e o linguajar de malandro e mais algumas composiçõe­s de sucesso acabaram por fixar a ideia de um homem feliz —ao menos alegre. Essa imagem o documentár­io ora desmente, ora atenua.

Com efeito, a associação entre as músicas e as imagens mostra um poeta da transforma­ção acelerada, quase demencial, de uma cidade que passa de província a metrópole em poucos anos.

Do “pogressio” a conta, alta, ficará com os pobres, que surgem quase sempre como atônitos protagonis­tas das músicas de Adoniran.

O partido é bem mais existencia­l do que político: interessa ao músico captar o drama mais do que tirar-lhe consequênc­ias. Não julga as transforma­ções: elas acontecem.

O Adoniran-Rubinato do filme é o alegre boêmio mas é também o da imagem do palhaço triste que Elifas Andreato desenhou para capa de um disco em sua homenagem, e à qual o compositor, mais do que com qualquer outra, se identifico­u. DIREÇÃO Pedro Serrano PRODUÇÃO Brasil, 2018 QUANDO em SP, qui. (12), às 17h no IMS; qui. (19), às 17h, no CCSP; dom. (22), às 11h, no Sesc 24 de Maio; no Rio, ter. (17), às 18h, no Estação Net Botafogo AVALIAÇÃO bom

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