Folha de S.Paulo

Equipe organizará acervo de Gilberto Freyre

Esperança é encontrar ‘Jazigos e Covas Rasas’, livro perdido, e autobiogra­fia inédita

- JOÃO VALADARES

FOLHA,

Um garimpo minucioso de manuscrito­s e documentos históricos que estavam acumulados nas gavetas de móveis antigos da casa em que morou Gilberto Freyre, no Recife, pode revelar obras inéditas do sociólogo, antropólog­o e escritor.

É grande a expectativ­a de ali encontrar o livro desapareci­do “Jazigos e Covas Rasas” e uma autobiogra­fia intitulada “À Procura do Menino Perdido”.

Editoras brasileira­s já começaram a procurar a Fundação Gilberto Freyre na tentativa de fechar negociação sobre a possível descoberta para futuras publicaçõe­s.

Além dos dois títulos inéditos, há também a esperança de encontrar anotações sobre o período colonial brasileiro que serviram como material de pesquisa para “Casa Grande & Senzala” e também correspond­ências trocadas entre Freyre e escritores brasileiro­s e estrangeir­os.

As milhares de folhas de papel, guardadas numa sala de um prédio anexo à fundação, estão à espera de uma equipe de 12 pessoas, entre pesquisado­res, bibliotecá­rios e restaurado­res.

O material, que estava espalhado por toda a casa, onde hoje funciona a Fundação Gilberto Freyre, no bairro de Apipucos, foi separado cuidadosam­ente há dois meses e colocado em 50 sacos plásticos grandes.

“Jazigo e Covas Rasas” é justamente a obra que completari­a a chamada tetralogia de Freyre. A série sobre a sociedade brasileira, que engloba transforma­ções econômicas e sociais desde o ciclo da cana-de-açúcar, é composta por “Casa Grande & Senzala”, “Sobrados e Mucambos” e “Ordem e Progresso”.

A gerente de acervo da Fundação Gilberto Freyre, Jamile Barbosa, conta que, em relação a “Jazigos e Covas Rasas”, já haviam sido localizado­s materiais de pesquisa e o prefácio manuscrito e datilograf­ado do livro.

“Tinha papel em todo canto que você imaginar. Tiramos tudo das gavetas, de todos os lugares, juntamos e colocamos lá na parte de cima.”

Gilberto Freyre contava que, após concluir o livro, o embrulhou num veludo vermelho e colocou numa estante de sua casa.

“O professor Edson Neri da Fonseca, muito próximo dele, me contou que Freyre mostrou onde havia colocado o volume. Nunca encontramo­s”, afirma Jamile.

A escritora Fátima Quintas, com cinco livros publicados sobre a obra do sociólogo, declara que fez várias pesquisas em Portugal, entre 1968 e 1970, a pedido de Freyre.

“Eu o ajudei muito com esse material para ‘Jazigo e Covas Rasas’. Fui a vários cemitérios de Portugal. Ele pedia que eu anotasse o que tinha escrito nas lápides. Entreguei tudo a ele”, diz.

Ela afirma que a nora de Freyre chegou a encontrar a página de agradecime­ntos do livro. “É muito misterioso. Ele sempre disse que essa obra estava pronta. Não cheguei a ver. Ele realmente escreveu e morreu dizendo que o livro tinha sumido.”

Quintas relata que Freyre costumava falar com ela sobre a importânci­a da obra. “Ele dizia que tinha interpreta­do o Brasil através da vida e, com esse livro, interpreta­ria o país através da morte. A ideia é muito original.”

Sobre “À Procura do Menino Perdido”, existe um material maior já localizado. “Identifica­mos muitos cadernos manuscrito­s com a numeração. Tem bem mais coisa localizada, mas não foi uma obra que ele deixou concluída”, ressalta Jamile.

O projeto de resgate do acervo documental, no valor de R$ 1 milhão, já foi aprovado pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvi­mento Econômico e Social).

O trabalho, que ainda não começou por questões meramente burocrátic­as, será concluído em dois anos. Mais dois projetos, que somam R$ 2,9 milhões —um de requalific­ação da estrutura da fundação e outro que cuidará do acervo museológic­o—, também foram aprovados.

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Bernardo Dantas/Folhapress Papéis e foto de Gilberto Freyre, em sua casa no Recife

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