Folha de S.Paulo

O medo prendeu a esperança

- NELSON BARBOSA COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Marcia Dessen; terça: Nizan Guanaes; quarta: Alexandre Schwartsma­n; quinta: Laura Carvalho; sexta: Nelson Barbosa; sábado: Marcos Sawaya Jank; domingo:

OS MARQUETEIR­OS dizem que eleições são geralmente disputas entre medo e esperança. Entre o desejo de manter tudo como está, com receio de que as coisas piorem, e a vontade de mudar tudo, com a expectativ­a de que a situação melhore.

Essa lógica se aplica bem ao Brasil dos últimos anos. Em 1994 e 2002, a esperança venceu o medo. Primeiro pela perspectiv­a de controle da inflação (o Plano Real de Fernando Henrique), depois pela perspectiv­a de redução de desigualda­des (o Brasil de Todos de Lula). Nos dois casos, a esperança se mostrou correta por motivos diferentes.

Já em 1998 e 2014, o medo venceu a esperança. No primeiro caso, pelo receio de depreciaçã­o cambial e retorno da inflação. Isso garantiu a reeleição de FHC. No segundo momento, havia o temor de perda das conquistas sociais dos anos anteriores. Isso garantiu a reeleição de Dilma.

Nos dois casos parte do que se temia acabou acontecend­o por uma razão comum: a inviabilid­ade das propostas econômicas apresentad­as na campanha. no governo nem participei da campanha de 2014. De volta ao principal.

As eleições de 2006 e 2010, por sua vez, foram pontos fora da curva. O cenário externo favorável e o sucesso do governo Lula em combinar cresciment­o econômico com redução de desigualda­des transforma­ram a votação daqueles anos em uma celebração ufanista do Brasil.

Como tudo tem um preço, a inflexão da política econômica do governo Lula em 2006-10 deu tão certo que gerou excessos nas ações do governo, adiamento de reformas necessária­s e intervençã­o excessiva em alguns mercados em 2012-14. Tudo isso em um cenário externo e interno não tão favoráveis como antes.

Neste ano a situação é diferente de todas eleições passadas. Temos um pessimismo tão grande com a política que o medo resolveu prender a esperança com receio de perder as eleições.

Se a prisão e o impediment­o de que Lula participe das eleições se mantiverem até outubro, tudo indica por geração espontânea e manutenção de desigualda­des.

O problema é que, na ausência de um candidato de centro-esquerda, a centro-direita tende a disputar contra o terror da extrema direita. Contra a ideia de que o Brasil só “dá certo” com restrição de liberdades individuai­s, aumento de desigualda­des e violência contra os mais pobres.

Existe alternativ­a na centro-esquerda. Na combinação de responsabi­lidade fiscal e social, no combate à corrupção sem viés político e, mais importante, na continuida­de da inclusão social além das transferên­cias de renda.

As soluções não são fáceis e demandam diálogo. Hoje, mais do que nunca, precisamos de bons mediadores a marcha da insensatez, o medo deveria concluir que é preciso libertar a esperança para lutar contra o terror. NELSON BARBOSA, @nelsonhbar­bosa

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