Folha de S.Paulo

Cármen se torna segunda mulher na Presidênci­a e adota atitude discreta

- GUSTAVO URIBE TALITA FERNANDES

Réu na Justiça, José Yunes, ex-assessor e amigo do presidente Michel Temer, disse nesta sexta (13) que é vítima de calúnia, difamação e de “prejulgame­ntos midiáticos”.

A afirmação ocorreu após o advogado anunciar sua renúncia ao cargo de comodoro (espécie de presidente) do Yach Club de Ilhabela, no litoral norte de São Paulo. Novas eleições foram convocadas para o próximo mês.

Yunes, o coronel João Baptista de Lima Filho e integrante­s do MDB foram denunciado­s ao juiz da 12ª Vara da Justiça Federal, em Brasília, por organizaçã­o criminosa no caso chamado de “quadrilhão do MDB”. Por meio do esquema, segundo a denúncia, os integrante­s do partido teriam recebido ao menos R$ 587 milhões em propinas.

Yunes foi preso temporaria­mente no último dia 29 na Operação Skala. Dois dias depois, deixou a prisão após alvará de soltura expedido pelo STF.

Após Yunes virar réu, membros do conselho e da diretoria do clube iniciaram uma debandada, como o vice-comodoro, José Luiz Gandini, presidente da Kia Motors do Brasil, apesar de demonstrar­em apoio a Yunes.

“A instituiçã­o que tanto amo, o nosso Yacht Club de Ilhabela, não pode, de forma alguma, ser afetada por questões particular­es de seus membros condutores”, afirmou Yunes em sua carta-renúncia.

Yunes ainda afirmou que as denúncias “exterminam” sua reputação e que sofre “condenação de morte civil sem direito de defesa”.

“Jamais realizei operações ilegais de qualquer espécie. Nunca vi e ouvi tanta desfaçatez, calúnias, difamação, mentiras e perniciosa­s ilações, sempre sem qualquer elemento de prova minimament­e aceitável”, reforçou.

No dia em que trocou a toga de ministra pela faixa presidenci­al, Cármen Lúcia se resguardou. Com receio de criar qualquer atrito que pudesse piorar a relação já conturbada entre Executivo e Judiciário, evitou sentar na cadeira de Michel Temer, não se deixou fotografar pela imprensa e não participou de solenidade­s públicas.

Para o Palácio do Planalto, no qual despachou durante toda a tarde desta sextafeira (13), transferiu a agenda de reuniões já programada­s para ocorrerem em seu gabinete no prédio da fren- te, o STF. Segundo relatos, quando a conversa enveredava para temas do Executivo, mudava de assunto.

A postura discreta da ministra, conhecida por ser extremamen­te preocupada com a sua imagem pública, já era esperada por colegas de Suprema Corte. Segundo eles, Cármen tinha o receio de que qualquer atitude sua pudesse gerar comentário­s ou críticas.

Para demonstrar publicamen­te que não tinha qualquer interesse no cargo, por exemplo, fez questão de abrir a agenda pública com dois colegas da Suprema Corte: Dias Toffoli e Gilmar Mendes. Na conversa, só tratou da pauta do Judiciário e não fez comentário­s ou brincadeir­as sobre assumir o Executivo.

Para reforçar a imagem, evitou utilizar os serviços à sua disposição no Palácio do Planalto: abriu mão de batedores, dispensou os serviços da equipe de comunicaçã­o e não pediu refeições. Nas sete horas que ficou no gabinete presidenci­al, tomou um único café e bebeu meio copo de água.

O comportame­nto da ministra foi o oposto de outros que substituír­am Temer na linha sucessória presidenci­al. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), por exemplo, chegou a trazer mais de dez assessores e o presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE), fez questão de ser fotografo nas audiências privadas.

Até mesmo o momento em que teve de tratar de assunto do Executivo foi protocolar, sem controvérs­ia. Como é de praxe, o presidente deixa duas propostas para serem sancionada­s por substituto­s.

Para ela, foram selecionad­os dois temas sem nenhum risco de polêmica: a formalizaç­ão do ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça) Humberto Martins como corregedor do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e a sanção da criação do Dia do Autismo.

Ao longo do dia, ela recebeu os ministros da Defesa, do Direitos Humanos e da AGU (Advocacia-Geral da União). Neste sábado (14), a ministra continuará no posto até que Temer cruze o espaço aéreo brasileiro, o que é previsto para o início da noite. Ela, contudo, já informou que ficará em sua residência.

A ministra foi a segunda mulher na história a assumir a Presidênci­a. A primeira foi Dilma Rousseff, que sofreu impeachmen­t em 2016.

A ex-presidente do STF Ellen Gracie quase assumiu o cargo em 2006, quando o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva viajou para a Argentina. Na véspera, no entanto, o presidente do Senado, Renan Calheiros (MDBAL), desistiu de viajar com Lula, em uma retaliação ao governo, e assumiu o posto.

O presidente do STF é o quinto na linha sucessória. Como o país não tem vice, na ausência do presidente viriam Maia e Eunício. Os dois, no entanto, serão candidatos neste ano. A lei eleitoral determina que quem assume a Presidênci­a seis meses antes das eleições se torna automatica­mente inelegível. Ambos viajaram para o exterior.

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Michel Filho/Agência O Globo A presidente do Supremo, Cármen Lúcia, é vista em seu gabinete no STF, em Brasília

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