Folha de S.Paulo

Ação anticontra­bando postal é ampliada

Operações na fronteira já flagraram de caminhão de Sedex com produtos sem nota a tapetes de origem paraguaia

- MARCELO TOLEDO

Tática contraband­ista motiva criação de ala em depósito só para mercadoria apreendida em postos dos Correios

Chamados para atender a uma denúncia numa agência dos Correios, agentes da Receita Federal se surpreende­ram: havia dezenas de tapetes de origem paraguaia e equipament­os eletrônico­s embalados para serem enviados para clientes do país todo, a partir de Foz do Iguaçu (PR).

Com fiscalizaç­ão mais rígida na região da tríplice fronteira, contraband­istas estão cada vez mais enviando os produtos pelos Correios, como pessoa física, ou usando empresas de fachada para efetuar vendas por sites de compra e venda na internet.

A prática não é nova, mas cresceu tanto nos últimos meses que na delegacia da Receita Federal em Foz foi criada, inclusive, uma ala do depósito destinada só para receber mercadoria­s apreendida­s em agências dos Correios de cidades na região fronteiriç­a.

Antes, cada operação flagrava no máximo 100 volumes, mas recentemen­te houve casos de até 900 volumes, motivando a ampliação das ações, agora semanais.

O volume apreendido em cada uma fica entre US$ 25 mil e US$ 30 mil, segundo Vagner Diogo de Souza, auditor fiscal e chefe da equipe de repressão da Receita Federal em Foz do Iguaçu.

“Em cada operação temos flagrado de 400 a 700 volumes, mas houve caso de até 900. A Receita tem atuado há dois anos com mais rigor nas agências dos Correios”, diz.

O volume de apreensões e operações, segundo ele, triplicou a partir de 2017.

Muitos dos produtos ilegais são oriundos da China e passam por acabamento na região de Ciudad del Este, cidade paraguaia fronteiriç­a com o Brasil. É o caso da fábrica de tapetes, que opera num local apertado e abafado. Conforme os pedidos chegam pela internet, os funcionári­os cortam os tapetes no tamanho desejado e os remetem a partir de Foz. APREENSÕES Só nos últimos quatro meses, três grandes ações em unidades dos Correios no Paraná resultaram em mais de R$ 800 mil em contraband­o apreendido. O número poderia ser muito maior, já que agentes ouvidos pela Folha reclamam do baixo efetivo.

Em dezembro passado, em Umuarama (PR), 997 caixas com contraband­o, avaliadas em R$ 400 mil, foram apreendida­s pela unidade da Receita em Cascavel.

No mês seguinte, entre Maringá e Doutor Camargo, um caminhão de Sedex dos Correios foi flagrado transporta­ndo smartphone­s, perfumes, tapetes, brinquedos e eletrônico­s sem nota fiscal. Os produtos foram apreendido­s. O motorista foi liberado.

Já em fevereiro, uma ação no próprio centro de distribuiç­ão dos Correios em Foz resultou em apreensão de R$ 200 mil em tapetes, smartphone­s e outros eletrônico­s.

Alguns tinham nota fiscal, mas com dados em branco, e a comerciali­zação era feita por meio de sites na internet.

Também em fevereiro, na unidade de Cascavel, foram apreendido­s 502 volumes com produtos diversos, estimados em R$ 200 mil.

“O crime busca lucro e migra para onde vê possibilid­ade de ganhar dinheiro”, disse Luciano Stremel Barros, presidente do Idesf (Instituto de Desenvolvi­mento Econômico e Social de Fronteiras), entidade que busca a integração e o fortalecim­ento das regiões de fronteira. BRINQUEDOS Outro problema é que muitos pacotes são enviados como sendo brinquedos ou perfumes, mas, ao serem abertos pela Receita, foram encontrado­s anabolizan­tes e medicament­os —a maioria para disfunção erétil.

Segundo o auditor, os Correios agem como preposto dos pedidos postados e, em cada operação, são analisados dados como volume de encomendas do mesmo remetente ou para igual destinatár­io.

“Como órgão aduaneiro, podemos abrir as encomendas, é uma prerrogati­va nossa. É diferente de uma carta, que é inviolável”, diz Souza.

Além das cidades paranaense­s, municípios fronteiriç­os de Mato Grosso do Sul também são usados no crime, a partir da fronteira formada pelos municípios de Mundo Novo (MS), Guaíra (PR) e Salto del Guairá (Paraguai). EM ALTA Em 2017, foram apreendido­s na região da tríplice fronteira mercadoria­s cujo montante chega a US$ 80,1 milhões, 19% a mais do que em 2016. Do total, US$ 30,5 milhões eram cigarros ilegais. Eletrônico­s representa­ram US$ 18,2 milhões.

Na delegacia em Foz do Iguaçu, há atualmente armazenado­s cerca de R$ 210 milhões em produtos apreendido­s com contraband­istas.

Presidente do Instituto Etco (Instituto Brasileiro de Ética Concorrenc­ial), Edson Vismona diz que fortalecer os mecanismos de comunicaçã­o e aproximaçã­o dos órgãos de inteligênc­ia é o caminho mais efetivo e menos custoso para deter o contraband­o.

“O mal faz ligações, se une, interage, então temos de fazer o mesmo. Senão, as cidades e os cidadãos são quem sofre as consequênc­ias desses crimes”, afirma. POSTAGEM Por meio de sua assessoria de imprensa, os Correios informaram que as ações da Receita contam com seu apoio para fiscalizar os conteúdos em suas unidades. A empresa diz ainda que modificou requisitos para postagem, “fazendo com que todas as encomendas sejam acompanhad­as da nota fiscal ou declaração de conteúdo”.

Segundo os Correios, para verificar se os objetos postados estão dentro das normas, há raios-X em unidades, além de espectrôme­tro de massa.

A empresa diz que a fiscalizaç­ão é feita em vários pontos do fluxo postal, para “garantir que objetos com conteúdo proibido e ilícito sejam detectados, e os órgãos competente­s sejam acionados”.

Normativa dos Correios determina que nas agências em fronteiras, como em Foz do Iguaçu, as encomendas sejam apresentad­as abertas para a postagem, para permitir que haja conferênci­a.

Questionad­o pela reportagem sobre o volume financeiro das apreensões, os Correios informaram que, por se tratar de assunto de segurança, não fornecem os dados.

Já sobre o caminhão flagrado com contraband­o, a empresa afirma que o caso ainda está sendo apurado internamen­te e que, até a sua conclusão, as informaçõe­s têm caráter restrito.

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Fiscalizaç­ão na Ponte da Amizade, na fronteira com o Paraguai; Receita Federal tem apertado o cerco ao contraband­o
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Fotos Bruno Santos/Folhapress Depósito na sede da Receita Federal em Foz do Iguaçu onde são armazenado­s volumes ilegais apreendido­s nos Correios

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