Folha de S.Paulo

Apenas uma pequena parte dos valores de exportação”, diz o pesquisado­r.

- ISIS NÓBILE DINIZ JULIO ABRAMCZYK

FOLHA

Depois de dez dias de debates em Londres, os 173 países membros e três associados da Organizaçã­o Marítima Internacio­nal (IMO), agência das Nações Unidas, definiram a meta de reduzir as emissões do setor em pelo menos 50% até 2050. O valor é em relação aos níveis de 2008, ano de maior emissão no setor.

A proposta inicial era zerar as emissões até 2050, mas países em desenvolvi­mento como o Brasil pediram mais tempo para se adequarem. Com isso, ficou acordado expandir a meta de redução para 100% até meados do século, em alinhament­o com o que determina o Acordo de Paris da Conferênci­a das Partes (COP21), aprovado em 2015.

O acordo vale para todo o transporte de carga e de pessoas com mais de cinco mil toneladas, exceto embarcaçõe­s militares.

“Esta reunião moldou a agenda da mudança climática para todo o setor nas próximas décadas”, afirma a brasileira Natalie Unterstell, consultora da ONG Instituto Clima e Sociedade.

As nações insulares, que correm risco de desaparece­r devido ao aqueciment­o global como Ilhas Marshall, Tuvalu, Fiji, Kiribati, Vanuatu, e países desenvolvi­dos como a Noruega propuseram a descarboni­zação total.

O Brasil se aliou a Argentina, Arábia Saudita, Panamá e Índia para pressionar por metas mais brandas. Durante os debates, esses países defenderam adiar o início da implementa­ção de práticas de redução por mais cinco anos, quando dados mais precisos estiverem disponívei­s.

O grupo se considera em uma posição desfavorec­ida na discussão. A maioria está longe dos principais centros de consumo ou de produção e alega que países europeus têm a tecnologia de energia elétrica a favor deles.

Eles também temiam que o investimen­to necessário para zerar as emissões até a data prejudicas­se suas exportaçõe­s e, consequent­emente, suas economias. Dentro do IMO, uma prática não pode penalizar outras nações participan­tes.

Sobre a meta acordada, o Itamaraty disse que muitos países, como Brasil, expressara­m dúvidas a respeito dela. “Ela pode levar a aumentos no custo do frete marítimo, com impactos negativos desproporc­ionais sobre países em desenvolvi­mento e geografica­mente distantes dos seus mercados, impactos pouco estudados. Também não há informaçõe­s suficiente­s sobre os custos de novas tecnologia­s necessária­s para cumprir com essa meta.”

Segundo a nota, o Brasil defendeu uma estratégia em em linha com o Acordo de Paris e que as emissões da navegação deveriam alcançar um pico e passar a declinar o quanto antes, visando à progressiv­a eliminação até a segunda metade do século.

Segundo Olaf Merk, autor do relatório para a Cooperação e Desenvolvi­mento Econômico (OCDE) que mostrou ser possível zerar a emissão do setor até 2050, os custos do transporte marítimo podem, de fato, aumentar devido a cenários de descarboni­zação. “Mas para a maioria das mercadoria­s, eles representa­m MAR DE NINGUÉM O setor marítimo é responsáve­l por 2% de toda a emissão de carbono mundial. Se fosse um país, seria o sexto maior poluidor.

“A Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas nunca encontrou uma maneira de alocar essas emissões marítimas entre os países”, afirma Mark Lutes, especialis­ta em mudanças climáticas da WWF Brasil.

Isso porque há uma especifici­dade complicado­ra do setor. “Um navio pode mudar de bandeira com facilidade. Eles praticamen­te não têm nacionalid­ade”, explica Lutes. O que é diferente, por exemplo, do setor aéreo.

Países exportador­es como o Brasil podem “alugar” navios para levarem suas mercadoria­s aos compradore­s. Assim, nasce a discussão sem resolução sobre qual país seria o responsáve­l pela emissão: proprietár­io da embarcação, exportador ou importador.

Dependendo da carga, a embarcação volta vazia porque ela precisa de uma acomodação especial que inviabiliz­a outras mercadoria­s retornando. Para evitar mais emissões, uma medida já adotada pelos países que fazem parte do IMO é a de construir os novos navios com eficiência energética.

Agora, na década de 2030, a maioria dos navios recémconst­ruídos operarão com combustíve­is renováveis.

Na quarta-feira, o Observatór­io do Clima, enviou uma carta ao presidente Michel Temer e ao ministro das Relações Exteriores, Aloysio Nunes, pedindo que o Brasil revisse sua posição. O documento lembrou que o país foi fundamenta­l na negociação que resultou no Acordo do Clima em 2015, e apresentou a única meta de redução absoluta de emissões dentre os países emergentes.

“O setor de transporte marítimo envia o sinal para toda a indústria de que a descarboni­zação vai para frente com certa urgência, alterando decisões para o uso de tecnologia­s mais limpas”, conta Lutes. “Todo mundo usa produtos que chegam de navio. Então, todos podemos respirar mais aliviados sabendo que essa atividade está se transforma­ndo.” ↳ ↳ > Para tingir esse objetivo, 70% das emissões do setor marítimo deveriam ser reduzidas até 2050 > Hoje, 50 mil navios internacio­nais fazem parte da frota da indústria global > 2% de todo o carbono emitido é provenient­e do transporte marítimo > 17% seria a quantidade de carbono emitido pelo setor marítimo se nada fosse feito até 2050

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