Folha de S.Paulo

Governo e TCU brigam por leilão de rodovia

Sem destravar projeto no Sul, União não conseguirá tirar do papel outras concessões

- TAÍS HIRATA

O desentendi­mento entre o governo federal e o TCU (Tribunal de Contas da União) nas concessões rodoviária­s poderá chegar a um fim nos próximos meses, após embates duros entre os órgãos envolvidos.

A briga chegou ao ponto de o governo enviar ao tribunal um documento, obtido pela Folha, em que afirma que a área técnica do órgão excedeu sua atribuição legal, emitiu opiniões sem embasament­o, deturpou fatos para produzir informaçõe­s falsas e cometeu erros que revelariam sua inaptidão.

O documento se deu dentro do processo de análise da RIS (Rodovia de Integração do Sul), caso que é emblemátic­o porque, enquanto não for destravado pelo tribunal, nenhum outro projeto de estradas da União sairá do papel.

Ele foi uma resposta a um relatório da área técnica do TCU, do fim do ano passado, que apresentou 33 determinaç­ões de mudanças na modelagem da concessão e basicament­e rejeitou o edital.

“A unidade técnica tenta, já em diversos processos em curso no TCU, fazer prevalecer sua concepção de melhor regulação contratual, usurpando competênci­a constituci­onal do gestor público e utilizando, como justificat­iva, uma falsa premissa”, lê-se em um trecho da reposta do governo ao relatório.

Após o envio desse documento, no entanto, o governo recuou e assumiu posição mais conciliado­ra para tentar destravar o projeto, segundo o secretário do PPI (Programa de Parcerias de Investimen­tos), Tarciso Gomes de Freitas.

Ele afirma que foi feita uma reavaliaçã­o da modelagem e que a maior parte das 33 determinaç­ões feitas pela área técnica do tribunal deverá ser acatada. “Identifica­mos vários pontos que, de fato, são riscos e podem ser combatidos. Procuramos mudar cláusulas e criar mais medidas de proteção, como limitar a possibilid­ade de incluir novas obras e prorrogar os contratos.”

O procurador do TCU Marinus Marsico, que acompanha o caso, afirma que a reformulaç­ão do projeto trouxe “novos elementos, inteira- mente inéditos, que mudam bastante a caracterís­tica do edital”, mas ressalta que o voto será dado pelo relator do caso, o ministro Bruno Dantas. Depois, o tema ainda será votado pelo plenário.

A expectativ­a do PPI é que um acórdão sobre o caso saia em maio e que o edital da RIS seja publicado até junho. NOVO MODELO Para o governo e analistas do setor, a percepção é que o tribunal aumentou seu grau de exigência após lidar com uma série de contratos de rodovias que geraram problemas, como devoluções de concessões e pedidos de prorrogaçã­o antecipada.

“O que o TCU está fazendo é uma discussão de toda essa experiênci­a que deu errado, trazendo-a para dentro da modelagem do novo projeto, para evitar que esses problemas se repitam. O que se está discutindo é a modelagem que vai valer para outros editais de rodovias”, diz Letícia Queiroz de Andrade, sócia do escritório Queiroz Maluf.

O atrito entre governo, empresas e TCU não se restringe a rodovias. Em outras áreas de infraestru­tura, o questionam­ento à atuação do órgão —que, muitas vezes, acabaria indo além das atribuiçõe­s de um tribunal de contas— tem crescido, afirma Thiago Sombra, sócio do Mattos Filho. “[Esse embate] se acirrou, principalm­ente após a criação do PPI.”

Para o secretário do PPI, essa discussão ocorre também dentro do próprio tribunal. “Há uma autocrític­a dentro do TCU, que tem buscado um maior equilíbrio”, afirma.

Questionad­o sobre as críticas feitas pelo governo, o TCU disse que o ministro-relator do caso da RIS não iria se manifestar e que a unidade técnica do tribunal está em permanente diálogo com a ANTT (agência reguladora do setor) e com o PPI.

A ANTT, que foi alvo da maior parte das críticas do TCU, afirmou, em nota, que a agência e os outros órgãos envolvidos estão em permanente diálogo com o TCU.

O Ministério dos Transporte­s diz que a crítica ao tribunal foi uma resposta pontual ao relatório técnico do TCU, mas que a pasta “entende o papel da instituiçã­o”. BR -364 Porto Velho (RO) a Comodoro (MT) BR-364/365 Uberlândia (MG) a Jataí (GO) Rodovia BR-101 Paulo Lopes (SC) a São João do Sul (SC) RIS Rodovia de Integração do Sul (RS) de extensão

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