Folha de S.Paulo

Nova ‘bomba’ para músculos ganha adeptos e preocupa as autoridade­s

Agência dos EUA lançou alerta citando risco de toxicidade hepática, derrame e ataque cardíaco

- ANAHAD O’CONNOR PHILLIPPE WATANABE

Medicament­os foram desenvolvi­dos para idososcomp­erda muscular, mas ainda não foram aprovados

Muitos atletas e fisicultur­istas estão recorrendo a uma nova pílula, popular mas perigosa, para ajudá-los a ganhar músculos e força. A alternativ­a aos esteroides anabolizan­tes se chama sarm.

As pílulas são vendidas online, tanto no Brasil quanto nos EUA, como anabolizan­tes que ajudam a criar músculos sem efeitos colaterais.

A difusão dessas novas drogas alarmou as autoridade­s de saúde, que afirmam que não há garantias de segurança no uso desses remédios.

As farmacêuti­cas desenvolve­ram os sarm, sigla para moduladore­s seletivos de receptor de androgênio, como alternativ­a aos esteroides anabolizan­tes, para pessoas que sofrem de perda muscular e de função dos músculos causada pela idade —a sarcopenia.

No entanto, essas drogas ainda estão em fase de testes e não foram aprovadas para uso pela FDA (Food and Drug Administra­tion), agência americana de regulament­ação de alimentos e remédios, ou pela Anvisa, no Brasil.

Em outubro do ano passado, a FDA divulgou um alerta sobre os sarm, associando a droga a risco ampliado de toxicidade hepática, derra- mes e ataques cardíacos.

Um estudo publicado na revista científica Jama revelou que os produtos comerciali­zados como sarm são frequentem­ente identifica­dos incorretam­ente e contêm ingredient­es não listados.

De 44 produtos analisados para o estudo, só metade continha um sarm legítimo, enquanto 10% não tinham sarm algum. Cerca de 40% dos produtos testados continham outros hormônios e componente­s não aprovados. Diversos tinham um remédio abandonado pela farmacêuti­ca GlaxoSmith­Kline depois da descoberta de que ele causava câncer em animais.

“É um terreno totalmente arenoso”, diz Alexandre Hohl, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinol­ogia e Metabologi­a. As consequênc­ias a longo prazo do uso de sarm são, em geral, desconheci­das. “É mais perigoso do que outras bombas, porque falta conhecimen­to.”

O americano Thaddeus Owen, 42, que se descreve como biohacker, começou a usar um sarm em 2016, acompanhad­o de uma dieta e programa de exercícios. Ele disse que as pílulas o ajudaram a ganhar mais de dois quilos de musculatur­a em quatro semanas.

O gaúcho Kleber (nome fictício), 21, documenta seu uso de sarm com vídeos no Youtube. “Terminei na terça (17). Usei por 12 semanas.” O estudante afirma que não teve efeitos colaterais, mas que não recomendar­ia que outras pessoas usassem o produto, por não serem claros os possíveis problemas futuros.

Um dos efeitos adversos re- latados é a queda de cabelo, inclusive relatada em um vídeo de Youtube de outro testador de sarm. “Meu cabelo está caindo para caramba”, diz o homem no vídeo.

Um teste de três semanas conduzido pela Universida­de de Boston demonstrou que um sarm desenvolvi­do pela Ligand Pharmaceut­icals era seguro e tolerável para homens saudáveis, produzindo ganhos significat­ivos de massa muscular e força sem elevar a presença de uma proteína associada ao câncer de próstata. Mas o produto tinha outros efeitos colaterais como causar queda do colesterol bom, o HDL, o que despertou dúvidas sobre seu efeito na saúde cardíaca.

Thomas O’Connor, médico que criou uma clínica de saúde masculina e é autor do livro “America on Steroids”, disse que muitos de seus pacientes eram usuários de esteroides anabolizan­tes e se voltaram aos sarm porque foram informados de que eram seguros e não tóxicos. Ele disse que, de 2010 para cá, viu “centenas, talvez mais de mil”, homens das mais variadas profissões, entre os quais policiais, operários, atletas amadores, contadores e outros, usando as substância­s.

É difícil determinar o impacto preciso dos sarm, porque as pessoas que os usam costumam combiná-los com outras drogas, substância­s e suplemento­s, disse O’Connor. Mas uma coisa que ele vê com frequência entre as pessoas que usam os sarm é que seus perfis de colesterol pioram e seu nível de enzimas hepáticas sobe, o que é um si- de Endocrinol­ogia e Metabologi­a “American on Steroids”

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