Folha de S.Paulo

Pelada no Jornalista­s

- Ruy Castro

rio de janeiro Em recente evento sobre futebol, um repórter veio me dizer que estava tentando falar com um jogador da seleção brasileira, dos poucos atuando no Brasil, mas em vão. Entre ele e o craque havia uma barreira de secretário­s, agentes e aspones —“o staff do jogador”. Sugeri-lhe mandar o craque lamber sabão e entrevista­r a turma do vôlei ou do basquete, muito mais acessível e com grandes histórias para contar.

Antes dos carrões, das mansões na Barra e dos contratos bilionário­s, os jogadores de futebol circulavam pelas ruas com a maior naturalida­de e podiam até ser levados a um cafezinho no botequim —e eram deuses como Zizinho, Ademir Menezes, Castilho, Bellini, Rubens. Um dia, por volta de 1960, os moradores de certo conjunto de edifícios do Leblon chegaram à janela e assistiram a uma incrível pelada no campinho de terra do pátio interno. Pois adivinhe quem jogava: Nilton Santos, Garrincha, Didi, o goleiro Manga, talvez o jovem Amarildo e outros, estrelas do Botafogo e da seleção.

Como podia? Simples. Os prédios, junto ao Jardim de Alah, formavam o Condomínio dos Jornalista­s, construído pelo IAPC e com apartament­os vendidos a leite de pato a jornalista­s e assemelhad­os. Moravam ali nomes como Wilson Figueiredo, Mauritônio Meira, Augustinho (irmão de Nelson) Rodrigues, o crítico de cinema Alex Viany, o humorista Dom Rossé Cavaca, o teatrólogo Oduvaldo Vianna (pai) —e Sandro Moreyra, repórter do Jornal do Brasil e botafoguen­se praticante.

Por artes de Sandro, Nilton Santos também comprou um apartament­o no Jornalista­s. E, com isso, numa tarde de domingo sem jogo pelo campeonato carioca, Sandro e Nilton armaram uma pelada histórica reunindo vários campeões do mundo, os rapazes do prédio e os meninos pobres da vizinha Cruzada São Sebastião.

Só não me pergunte quem ganhou, se houve gols e quem marcou. Não há registro.

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