Da autonomia das cobaias
são paulo Cientistas que desenvolvem uma vacina contra a zika querem autorização do governo americano para testá-la em humanos e inocular o vírus nos voluntários, para ver se o imunizante de fato funciona. Vale isso? Até que ponto é ético tratar seres humanos como cobaias?
Todos os desenvolvimentos médicos de que nos valemos hoje dependeram de cobaias, animais e humanas. Até mais ou menos meados do século passado, ninguém discutia muito seriamente a ética dos ensaios clínicos. Os cientistas desenvolviam drogas e terapias e as testavam em pacientes, sem se preocupar em perguntar se eles estavam de acordo.
Foi só depois de uma série de pesadelos bioéticos, que culminaram nos experimentos humanos levados a cabo pelos nazistas nos campos de concentração, que surgiu a preocupação de criar regras éticas para a experimentação com humanos. Nos últimos anos, parte das proteções vem sendo estendida aos bichos.
Não há a menor dúvida de que os princípios éticos baseados no respeito ao indivíduo e em seu direito à autodeterminação e a tomar decisões informadas, que estão consubstanciados em documentos como o Código de Nuremberg (1947) e a Declaração de Helsinque (1964), são importantíssimos. Receio, porém, que os reguladores tenham exagerado.
Parece-me absurda, por exemplo, a exigência da autorização de cada paciente para colher dados nos milhões de prontuários médicos guardados em hospitais. Essas informações, quando consideradas no agregado, contêm respostas que poderiam salvar muitas vidas. Está tudo lá, mas não podemos olhar.
De modo análogo, penso que, se um sujeito quer participar de um experimento que não vá beneficiá-lo diretamente, mas não foi em nenhum momentoenganadopeloscientistas e compreendeu os riscos a que está sujeito, não cabe a nenhum comitê tutelá-lo ou questionar suas motivações. A autonomia individual é coisa séria e vale tanto para pacientes como para cobaias.
Faltou a Gleisi tom semelhante para condenar o integrante do PT que agrediu um empresário que xingava dirigentes da legenda em São Paulo, na véspera da prisão de Lula.
A presidente do partido também ficou em silêncio quando um militante acampado em Curitiba tentou intimidar um repórter da Record. Bolsonaro, com indignação seletiva, correu para publicar um vídeo nas redes sociais denunciando o caso.
No meio do caminho, ficou Geraldo Alckmin (PSDB). O tucano errou duplamente ao se omitir na crítica obrigatória ao ataque a tiros contra os lulistas e também não foi capaz de aproveitar o palanque fácil da defesa da liberdade de imprensa.
Ameaças, agressões e ataques por motivações ideológicas devem ser repudiados com vigor por aqueles que pretendem exercer postos de autoridade. É tão difícil dizer o óbvio e criticar esses atos? Candidatos e partidos que abrirem mão dessa responsabilidade também estão abdicando da política e se mostram que podem estar inaptos para o poder.