Folha de S.Paulo

Centro de São Paulo tem 70 prédios invadidos

Grupos sem-teto avançaram com alta de aluguéis e política habitacion­al inadequada para a região central, dizem urbanistas

- Angela Pinho, Artur Rodrigues e Fabrício Lobel

são paulo Invasões de semteto ganharam força na cidade de São Paulo diante do aumento nos aluguéis, de políticas habitacion­ais insuficien­tes e da crise econômica, avaliam especialis­tas. O resultado são cerca de 70 prédios invadidos na região central, segundo a Prefeitura de São Paulo, com aproximada­mente 4.000 famílias.

A Secretaria Municipal da Habitação ressalta que se trata de uma estimativa, pois a maior parte das invasões ocorre em áreas particular­es, e cabe aos proprietár­ios tomar as providênci­as necessária­s para retomá-las.

Em 2013, um estudo da pasta havia identifica­do 42 imóveis invadidos no centro.

Desde então, movimentos sem-teto ganharam força, inclusive com a profusão de pequenos grupos, afirmam as próprias lideranças.

“Há um aumento tanto da presença de movimentos organizado­s como das ocupações voluntária­s que ocorreram, por exemplo, nos últimos oito anos de maneira desorganiz­ada em áreas vazias da zona leste”, afirma Osmar Borges, um dos diretores da Frente de Luta por Moradia (FLM).

De acordo com levantamen­to da pasta da Habitação, cerca de 25% das ocupações monitorada­s pelo Núcleo de Mediação de Conflitos, municipal, estão no centro da cidade, com 7% das famílias residentes nas moradias.

Na zona leste, estão 22% dos imóveis ocupados. Neles, estão 30% das famílias.

O núcleo, vinculado à pasta, visa negociar soluções entre proprietár­ios e ocupantes.

O diretor da FLM credita o cresciment­o de invasões ao aumento dos aluguéis.

Professor da Unifesp (Universida­de Federal de São Paulo), o urbanista Kazuo Nakano também avalia que o preço teve papel fundamenta­l, mas, em sua opinião, esse não foi o único fator. “Não há uma política habitacion­al de larga escala no Brasil que alcance a população de baixa renda de áreas centrais”, afirma.

Segundo ele, essa inadequaçã­o está ligada ao fato de que o principal programa federal de habitação, o Minha Casa Minha Vida, lançado na gestão Lula (PT), dificulta o uso do financiame­nto para imóveis usados —caso dos prédios desocupado­s no centro.

Além disso, por beneficiar também pessoas de renda média (hoje, o limite é de R$ 7.000), o programa não atende a população mais pobre na escala necessária.

“As políticas públicas são muitas vezes morosas e focam nas classes mais altas que não são parte do déficit habitacion­al”, afirma Fernando Túlio Franco, presidente do IABSP (seção paulista do Instituto dos Arquitetos do Brasil).

No plano de metas para o período 2017 a 2020, a prefeitura calcula ser necessária a provisão de cerca de 370 mil novas unidades habitacion­ais na capital paulista.

Para o presidente do IABSP, uma saída para fazer isso utilizando a infraestru­tura do centro seria estabelece­r uma linha de crédito robusta para reforma e retrofit de prédios.

Outra possibilid­ade seria a formação de consórcios entre a iniciativa privada e o poder público para as obras em edifícios antigos, o que poderia amenizar a falta de recursos.

Imóvel ocioso no centro é desperdíci­o, afirmam especialis­tas

Professor da Faculdade de Arquitetur­a e Urbanismo da USP, Renato Cymbalista afirma ainda que é preciso mais agilidade na destinação dos imóveis e na aplicação do IPTU progressiv­o para as edificaçõe­s ociosas, instrument­o já previsto pela legislação.

A tragédia desta terça-feira (1º), no entanto, é um exemplo de que isso não tem acontecido, afirma Kazuo Nakano.

Ele diz que notificar e, eventualme­nte, desapropri­ar imóveis ociosos para evitar prédios vazios na região central das grandes cidades é crucial em qualquer política de habitação. “É um desperdíci­o ter pré- estão ocupados no centro, com 4.000 pessoas, segundo estimativa da prefeitura ocupados na cidade são acompanhad­os por um núcleo da prefeitura; juntos, eles abrigam quase 46 mil famílias

Onde

Embora a maior fatia dos imóveis invadidos fique no centro, um terço das famílias está na zona leste, que tem grandes terrenos

Quem

Diversos grupos se organizam para as invasões e ocupações; os mais representa­tivos são Frente de Luta por Moradia, Movimento dos Trabalhado­res Sem-Teto e União dos Movimentos de Moradia dio vazio em um lugar perto de tanto emprego, transporte e infraestru­tura urbana”, diz.

Além disso, afirma, diante da profusão de invasões, é fundamenta­l fazer um monitorame­nto constante das condições de segurança de cada uma delas. “Esse imóvel já havia sido rejeitado por diversas instituiçõ­es públicas. Sabia-se, portanto, que ele tinha problemas.”

Nesta terça-feira, o prefeito Bruno Covas (PSDB) anunciou medida nesse sentido. Em até 45 dias haverá um levantamen­to de risco em cada uma das invasões da cidade.

“Vamos ver que ações precisam ser tomadas, se há alguma ação emergencia­l que precisa ser feita por conta de risco desses 70 prédios”, disse.

“Acho que ninguém está contente com a situação que temos hoje. Estamos com uma sensação de que talvez a gente pudesse ter feito alguma coisa para evitar. Mas de qualquer forma a gente tem a tranquilid­ade do dever cumprido.”

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