Verdades e mentiras sobre os sem-teto
O desabamento do prédio no largo do Paissandu, no centro de São Paulo, expôs ao país o crônico problema habitacional brasileiro.
São 6,35 milhões de famílias sem casa, segundo o IBGE. Na ausência de uma política pública, muitos não têm outra alternativa a não ser ocupar imóveis abandonados. Era o caso das 146 famílias que moravam no edifício Wilton Paes de Almeida.
Bastaram poucas horas depois do ocorrido para que alguns —na imprensa e nas redes sociais—, levianamente, apontassem os próprios moradores sem-teto como responsáveis pela tragédia.
É uma inversão cínica, que pretende culpar as vítimas. Além disso, difundiram fake news, buscando criminalizar os movimentos por moradia e atacar nossa pré-candidatura à Presidência da República pelo PSOL.
Em tempos como esses é importante reafirmar o óbvio: ninguém ocupa porque quer, mas por necessidade. Toda ocupação é resultado de um duplo abandono: o das famílias, que não têm assegurado o seu direito à moradia, e o de edifícios ou terrenos, que não cumprem sua função social.
O direito à moradia está expressamente garantido no artigo 6º da Constituição, que trata dos direitos sociais, assim como a educação, a saúde e a segurança. A mesma Constituição assegura o direito à propriedade, mas estabelece que ela precisa cumprir uma função social. Não se trata de um direito absoluto.
Hoje, no Brasil, temos mais de 7 milhões de imóveis —terrenos e construções, contando as áreas rurais— abandonados, enquanto o déficit habitacional é de 6,35 milhões de famílias. Isso representa cerca de 10% das famílias brasileiras. Temos mais casa sem gente do que gente sem casa.
Um quadro crítico, que vem se agravando com a crise econômica nos últimos anos e a desaceleração do programa Minha Casa, Minha Vida desde 2015.
Segundo dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), quase 85% das famílias sem moradia ganham até três salários mínimos e são as que mais sofrem com o gasto excessivo com aluguel.
A verdade é que mais de 3 milhões de mães e pais de família precisam decidir todo mês entre pagar o aluguel ou sustentar seus filhos.
A luta por moradia é necessária e legítima. Há vários movimentos sociais, especialmente nos grandes centros urbanos, que realizam ocupações. Existem, contudo, grupos que adotam práticas oportunistas, buscando benefícios próprios. É preciso saber separar o joio do trigo, sem generalizações indevidas.
Oportunistas existem em toda parte. Aliás, seguramente há mais oportunistas por metro quadrado no Congresso Nacional do que nos movimentos sociais.
O MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto), em mais de 20 anos de atuação, nunca pediu nenhuma contribuição financeira a seus participantes.
Muitos deles hoje moram em residências que conquistaram depois de anos de luta. Entendemos que não é quem mais precisa que deve pagar.
E, ao contrário do que chegaram a difundir —outra fake news—, o MTST não era o responsável pela organização da ocupação do largo do Paissandu. Mas nem por isso deixamos de ser solidários ao drama das 146 famílias.
Estive no local, junto com militantes do movimento, e participamos de iniciativas para pressionar o poder público a assumir sua responsabilidade. É desumano que, depois de terem vivido a tragédia, as pessoas ainda sigam desabrigadas.
É inaceitável que se culpem as vítimas e se aproveite da situação para criminalizar a luta social, ameaçando inclusive uma onda de despejos nos prédios ocupados no centro de São Paulo.
Se esse edifício tivesse passado pelas reformas necessárias e requalificado para moradia popular, como os movimentos defendem há anos, a tragédia certamente poderia ter sido evitada.
Esse é o caminho que deve ser seguido nas ocupações atuais, como parte de uma política pública de habitação social. Além da assistência às vítimas, é isso que se espera do Estado brasileiro. Mensagens para leitor@grupofolha.com.br, al. Barão de Limeira, 425, São Paulo, CEP 01202-900. A Folha se reserva o direito de publicar trechos
Foro privilegiado
Independentemente do pessimismo geral que acomete a todos, temos de reconhecer que nesta quinta (3) foi dado um passo importante para o aprimoramento político deste país. Também acredito que em breve o desmoralizado Congresso votará uma lei de restrição de foro. Só não dá para saber se eles vão melhorar ou piorar o que foi definido pelo Supremo Tribunal Federal. Rinaldo Bastos Vieira Filho
(Belo Horizonte, MG)
O STF só aumenta a insegurança jurídica com a decisão de restringir o foro para parlamentares federais. Mas como ficam os estaduais, magistrados, promotores e prefeitos? Mais confusão pela frente, mais sessões espetaculares. E o Congresso parece resignar-se com a usurpação de suas funções. Gustavo Mendes (Capivari de Baixo, SC)
Desastre em São Paulo
Minha impressão é que o edifício Wilson Paes de Almeida não teria estrutura para suportar um incêndio, mesmo que estivesse funcionando normalmente, com todos os requisitos de segurança necessários. O design merecidamente elogiado era resultado de uma estrutura levíssima.
João Zucarato (Vitória, ES)
Noam Chomsky
Só mesmo um intelectual do calibre de Noam Chomsky para tentar defender o indefensável (“Lula é alvo de ataque da elite, mas esquerda precisa fazer uma autocrítica séria”, Poder, 2/5). Em nenhum momento o linguista admitiu que o ex-presidente Lula se corrompeu. Sérgio Aleixo (Pindamonhangaba, SP)
Os anos de governo do PT foram um desastre para a esquerda e os seus ideais. Os poucos progressos sociais conquistados no período serviram de ardil para o partido exercer a velha política extrativista das oligarquias mais atrasadas do país. José Tadeu Gobbi, publicitário
(São Paulo, SP)
Manobra para cobrir calote
Inadmissível (“Trabalhador vai pagar por calote da Venezuela”, Mercado, 3/5). O valor precisa ser cobrado diretamente dos verdadeiros responsáveis, que deveriam ser processados.
Matheus Lourenço (São Paulo, SP)
Obras
Diferentemente do que informou a reportagem (“Paulo Preto é suspeito de receber R$ 173 mi de propina em obras da Prefeitura de SP”, Poder, 2/5), a Nova Marginal e o Complexo Jacu-Pêssego não foram contratadas pela prefeitura, mas pelo estado. Obras do governo federal ou do estado em áreas municipais devem ser objeto de convênio para que outro ente federativo possa, legalmente, executá-las. Sobre as quatro obras contratadas pela prefeitura citadas na reportagem, vale destacar que receberam investimentos de R$ 1,06 bilhão, dos quais R$ 82 milhões pagos na gestão Kassab, 7,7% do total. Alexandre Gajardoni, assessor de imprensa do PSD
Nota da Redação seção Erramos.
Leia abaixo a
Temer e Lula
Luiza Nagib Eluf está certíssima (“Em respeito à Constituição”, Tendências/ Debates, 3/5). Não há por que ter pressa em investigar Michel Temer, visto que o mandato dele termina no final deste ano. Quanto a Lula, ele tem todo o direito de receber visitas de amigos, como qualquer preso. E o fato de ter sido presidente deveria proporcionar-lhe alguma regalia —em respeito ao cargo que exerceu—, não restrição de direitos. Ademais, Lula está preso injustamente: não ficou claro qual foi o benefício recebido com o tríplex.
Paulo Cesar de Oliveira (Franca, SP)
Se, como defende Luiza Nagib Eluf, as visitas a Lula na prisão fossem liberadas sem limitações, haveria necessidade de ele contar com alguém no local para fazer o agendamento. Ou essa incumbência caberia à própria Polícia Federal? José Eduardo Cavalcanti (São Paulo, SP)
Sindicalismo
Para Roberto Dias, citando um fato isolado, nosso sindicalismo é o responsável pela própria fragilidade. Não é bem assim. Sindicato nasce fraco, precisa se fortalecer e ter apoio do Estado, como ocorre nos países democráticos da Europa, para habilitá-lo a concorrer com o capital, o que parece saudável à sociedade. No Brasil, tenta-se retirar-lhe o principal sustento —a contribuição sindical—, enquanto que o Sistema S (Sesi, Senai, Sesc etc.), do patronato, permanece intocado (“Nosso sindicalismo é uma vergonha”, Opinião, 3/5).
Ademar G. Feiteiro (São Paulo, SP)
Trem para Guarulhos
O projeto só beneficia dois tipos de passageiro: o que mora perto da nova estação e aquele que pretende usar o aeroporto (“Distância de terminal de ônibus esvazia nova ligação de trem para Guarulhos”, Cotidiano, 3/5). Para uma expressiva maioria da população de Guarulhos, nada mudou.
Ricardo Meneghini Ramiro de Lima (Guarulhos, SP)
Gírias
De fato, é impressionante a continuidade do uso de “bacana”, que eu já ouvia e lia nos anos 1950, quando era adolescente. Penso que a principal razão para isso é ela ser uma “palavra-ônibus” (“Sobre caxangas e memeias”, de Sérgio Rodrigues, Cotidiano, 3/5).
Francisco Sobreira (Natal, RN)
Agrotóxicos
A campanha Lei do Alimento Mais Seguro esclarece que o texto a ser debatido na Câmara prevê a modernização da lei dos defensivos agrícolas, que tem quase 30 anos e não acompanhou a evolução do campo (“Marco que libera agrotóxicos avança na Câmara”, Poder, 28/4). Produtos mais inovadores são desenvolvidos com pesquisas científicas rigorosas e alta tecnologia. São ferramentas fundamentais para as lavouras continuarem sendo o motor do crescimento do Brasil e garantindo alimentos ainda mais seguros para a população. Saiba mais em leidoalimentomaisseguro.com.br.
Fabrício Rosa, diretor-executivo da Associação Brasileira dos Produtores de Soja