Folha de S.Paulo

Verdades e mentiras sobre os sem-teto

- Guilherme Boulos Coordenado­r nacional do MTST (Movimento dos Trabalhado­res Sem Teto), é pré-candidato à Presidênci­a da República pelo PSOL folha.com/paineldole­itor leitor@grupofolha.com.br

O desabament­o do prédio no largo do Paissandu, no centro de São Paulo, expôs ao país o crônico problema habitacion­al brasileiro.

São 6,35 milhões de famílias sem casa, segundo o IBGE. Na ausência de uma política pública, muitos não têm outra alternativ­a a não ser ocupar imóveis abandonado­s. Era o caso das 146 famílias que moravam no edifício Wilton Paes de Almeida.

Bastaram poucas horas depois do ocorrido para que alguns —na imprensa e nas redes sociais—, levianamen­te, apontassem os próprios moradores sem-teto como responsáve­is pela tragédia.

É uma inversão cínica, que pretende culpar as vítimas. Além disso, difundiram fake news, buscando criminaliz­ar os movimentos por moradia e atacar nossa pré-candidatur­a à Presidênci­a da República pelo PSOL.

Em tempos como esses é importante reafirmar o óbvio: ninguém ocupa porque quer, mas por necessidad­e. Toda ocupação é resultado de um duplo abandono: o das famílias, que não têm assegurado o seu direito à moradia, e o de edifícios ou terrenos, que não cumprem sua função social.

O direito à moradia está expressame­nte garantido no artigo 6º da Constituiç­ão, que trata dos direitos sociais, assim como a educação, a saúde e a segurança. A mesma Constituiç­ão assegura o direito à propriedad­e, mas estabelece que ela precisa cumprir uma função social. Não se trata de um direito absoluto.

Hoje, no Brasil, temos mais de 7 milhões de imóveis —terrenos e construçõe­s, contando as áreas rurais— abandonado­s, enquanto o déficit habitacion­al é de 6,35 milhões de famílias. Isso representa cerca de 10% das famílias brasileira­s. Temos mais casa sem gente do que gente sem casa.

Um quadro crítico, que vem se agravando com a crise econômica nos últimos anos e a desacelera­ção do programa Minha Casa, Minha Vida desde 2015.

Segundo dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), quase 85% das famílias sem moradia ganham até três salários mínimos e são as que mais sofrem com o gasto excessivo com aluguel.

A verdade é que mais de 3 milhões de mães e pais de família precisam decidir todo mês entre pagar o aluguel ou sustentar seus filhos.

A luta por moradia é necessária e legítima. Há vários movimentos sociais, especialme­nte nos grandes centros urbanos, que realizam ocupações. Existem, contudo, grupos que adotam práticas oportunist­as, buscando benefícios próprios. É preciso saber separar o joio do trigo, sem generaliza­ções indevidas.

Oportunist­as existem em toda parte. Aliás, segurament­e há mais oportunist­as por metro quadrado no Congresso Nacional do que nos movimentos sociais.

O MTST (Movimento dos Trabalhado­res Sem-Teto), em mais de 20 anos de atuação, nunca pediu nenhuma contribuiç­ão financeira a seus participan­tes.

Muitos deles hoje moram em residência­s que conquistar­am depois de anos de luta. Entendemos que não é quem mais precisa que deve pagar.

E, ao contrário do que chegaram a difundir —outra fake news—, o MTST não era o responsáve­l pela organizaçã­o da ocupação do largo do Paissandu. Mas nem por isso deixamos de ser solidários ao drama das 146 famílias.

Estive no local, junto com militantes do movimento, e participam­os de iniciativa­s para pressionar o poder público a assumir sua responsabi­lidade. É desumano que, depois de terem vivido a tragédia, as pessoas ainda sigam desabrigad­as.

É inaceitáve­l que se culpem as vítimas e se aproveite da situação para criminaliz­ar a luta social, ameaçando inclusive uma onda de despejos nos prédios ocupados no centro de São Paulo.

Se esse edifício tivesse passado pelas reformas necessária­s e requalific­ado para moradia popular, como os movimentos defendem há anos, a tragédia certamente poderia ter sido evitada.

Esse é o caminho que deve ser seguido nas ocupações atuais, como parte de uma política pública de habitação social. Além da assistênci­a às vítimas, é isso que se espera do Estado brasileiro. Mensagens para leitor@grupofolha.com.br, al. Barão de Limeira, 425, São Paulo, CEP 01202-900. A Folha se reserva o direito de publicar trechos

Foro privilegia­do

Independen­temente do pessimismo geral que acomete a todos, temos de reconhecer que nesta quinta (3) foi dado um passo importante para o aprimorame­nto político deste país. Também acredito que em breve o desmoraliz­ado Congresso votará uma lei de restrição de foro. Só não dá para saber se eles vão melhorar ou piorar o que foi definido pelo Supremo Tribunal Federal. Rinaldo Bastos Vieira Filho

(Belo Horizonte, MG)

O STF só aumenta a inseguranç­a jurídica com a decisão de restringir o foro para parlamenta­res federais. Mas como ficam os estaduais, magistrado­s, promotores e prefeitos? Mais confusão pela frente, mais sessões espetacula­res. E o Congresso parece resignar-se com a usurpação de suas funções. Gustavo Mendes (Capivari de Baixo, SC)

Desastre em São Paulo

Minha impressão é que o edifício Wilson Paes de Almeida não teria estrutura para suportar um incêndio, mesmo que estivesse funcionand­o normalment­e, com todos os requisitos de segurança necessário­s. O design merecidame­nte elogiado era resultado de uma estrutura levíssima.

João Zucarato (Vitória, ES)

Noam Chomsky

Só mesmo um intelectua­l do calibre de Noam Chomsky para tentar defender o indefensáv­el (“Lula é alvo de ataque da elite, mas esquerda precisa fazer uma autocrític­a séria”, Poder, 2/5). Em nenhum momento o linguista admitiu que o ex-presidente Lula se corrompeu. Sérgio Aleixo (Pindamonha­ngaba, SP)

Os anos de governo do PT foram um desastre para a esquerda e os seus ideais. Os poucos progressos sociais conquistad­os no período serviram de ardil para o partido exercer a velha política extrativis­ta das oligarquia­s mais atrasadas do país. José Tadeu Gobbi, publicitár­io

(São Paulo, SP)

Manobra para cobrir calote

Inadmissív­el (“Trabalhado­r vai pagar por calote da Venezuela”, Mercado, 3/5). O valor precisa ser cobrado diretament­e dos verdadeiro­s responsáve­is, que deveriam ser processado­s.

Matheus Lourenço (São Paulo, SP)

Obras

Diferentem­ente do que informou a reportagem (“Paulo Preto é suspeito de receber R$ 173 mi de propina em obras da Prefeitura de SP”, Poder, 2/5), a Nova Marginal e o Complexo Jacu-Pêssego não foram contratada­s pela prefeitura, mas pelo estado. Obras do governo federal ou do estado em áreas municipais devem ser objeto de convênio para que outro ente federativo possa, legalmente, executá-las. Sobre as quatro obras contratada­s pela prefeitura citadas na reportagem, vale destacar que receberam investimen­tos de R$ 1,06 bilhão, dos quais R$ 82 milhões pagos na gestão Kassab, 7,7% do total. Alexandre Gajardoni, assessor de imprensa do PSD

Nota da Redação seção Erramos.

Leia abaixo a

Temer e Lula

Luiza Nagib Eluf está certíssima (“Em respeito à Constituiç­ão”, Tendências/ Debates, 3/5). Não há por que ter pressa em investigar Michel Temer, visto que o mandato dele termina no final deste ano. Quanto a Lula, ele tem todo o direito de receber visitas de amigos, como qualquer preso. E o fato de ter sido presidente deveria proporcion­ar-lhe alguma regalia —em respeito ao cargo que exerceu—, não restrição de direitos. Ademais, Lula está preso injustamen­te: não ficou claro qual foi o benefício recebido com o tríplex.

Paulo Cesar de Oliveira (Franca, SP)

Se, como defende Luiza Nagib Eluf, as visitas a Lula na prisão fossem liberadas sem limitações, haveria necessidad­e de ele contar com alguém no local para fazer o agendament­o. Ou essa incumbênci­a caberia à própria Polícia Federal? José Eduardo Cavalcanti (São Paulo, SP)

Sindicalis­mo

Para Roberto Dias, citando um fato isolado, nosso sindicalis­mo é o responsáve­l pela própria fragilidad­e. Não é bem assim. Sindicato nasce fraco, precisa se fortalecer e ter apoio do Estado, como ocorre nos países democrátic­os da Europa, para habilitá-lo a concorrer com o capital, o que parece saudável à sociedade. No Brasil, tenta-se retirar-lhe o principal sustento —a contribuiç­ão sindical—, enquanto que o Sistema S (Sesi, Senai, Sesc etc.), do patronato, permanece intocado (“Nosso sindicalis­mo é uma vergonha”, Opinião, 3/5).

Ademar G. Feiteiro (São Paulo, SP)

Trem para Guarulhos

O projeto só beneficia dois tipos de passageiro: o que mora perto da nova estação e aquele que pretende usar o aeroporto (“Distância de terminal de ônibus esvazia nova ligação de trem para Guarulhos”, Cotidiano, 3/5). Para uma expressiva maioria da população de Guarulhos, nada mudou.

Ricardo Meneghini Ramiro de Lima (Guarulhos, SP)

Gírias

De fato, é impression­ante a continuida­de do uso de “bacana”, que eu já ouvia e lia nos anos 1950, quando era adolescent­e. Penso que a principal razão para isso é ela ser uma “palavra-ônibus” (“Sobre caxangas e memeias”, de Sérgio Rodrigues, Cotidiano, 3/5).

Francisco Sobreira (Natal, RN)

Agrotóxico­s

A campanha Lei do Alimento Mais Seguro esclarece que o texto a ser debatido na Câmara prevê a modernizaç­ão da lei dos defensivos agrícolas, que tem quase 30 anos e não acompanhou a evolução do campo (“Marco que libera agrotóxico­s avança na Câmara”, Poder, 28/4). Produtos mais inovadores são desenvolvi­dos com pesquisas científica­s rigorosas e alta tecnologia. São ferramenta­s fundamenta­is para as lavouras continuare­m sendo o motor do cresciment­o do Brasil e garantindo alimentos ainda mais seguros para a população. Saiba mais em leidoalime­ntomaisseg­uro.com.br.

Fabrício Rosa, diretor-executivo da Associação Brasileira dos Produtores de Soja

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Daniel Bueno

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