Folha de S.Paulo

STF restringe foro especial de congressis­tas, mas decisão será caso a caso

Medida vai valer apenas para deputados e senadores, que poderão ter inquéritos enviados à 1ª instância se não houver relação com o mandato

- Letícia Casado

brasília - Por unanimidad­e, o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu nesta quinta-feira (3) restringir o foro especial para deputados federais e senadores. Agora, a corte vai processar e julgar apenas casos em que os crimes tenham sido cometidos em razão do cargo e durante o mandato.

A decisão não tem efeito automático. Depois que o resultado do julgamento for publicado, cada ministro vai decidir se envia o inquérito sob sua relatoria, envolvendo parlamenta­r, para outra instância ou se o processo se enquadra nos critérios definidos pelo STF.

Atualmente tramitam no STF 399 inquéritos e 86 ações penais, a maioria relativa a deputados federais e senadores.

Durante o julgamento, ministros apontaram a dificuldad­e em delimitar o que é crime cometido por causa da função de parlamenta­r. Assim, a declinação dos processos pode acabar provocando nova discussão no STF sobre o alcance do foro para autoridade­s.

Duas questões ficaram em aberto e vão interferir na amplitude do alcance do novo entendimen­to do STF. Primeiro, a caracteriz­ação de crime cometido em função do mandato é fluida, permitindo interpreta­ções divergente­s.

Outro ponto refere-se a delitos cometidos por um parlamenta­r que é reeleito. No intervalo entre um mandato e outro, o parlamenta­r que violou a lei no exercício do primeiro mandato perderá o foro especial no STF? Essas dúvidas não foram esclarecid­as pelos ministros e terão soluções homeopátic­as, administra­das caso a caso.

Relator do caso, o ministro Luís Roberto Barroso disse, ao fim da sessão, que os ajustes vão ser aos poucos. “Há muitas situações em aberto. Acho que há um princípio geral que estabelece­mos, mas é preciso que venham outros casos com próprias peculiarid­ades para definir cada situação”, afirmou. “Talvez tenha que fazer um recorte aqui ou ali, dependendo de cada situação.”

Segundo a tese de Barroso, aprovada por 7 dos 11 ministros, o caso de um senador que agride a mulher não seria julgado no Supremo. “Quando o parlamenta­r não estava no cargo, é muito fácil. A dificuldad­e é saber se o delito foi cometido em função do cargo”, afirmou. “Cada relator, individual­mente, vai analisar o caso, não precisa mais trazer ao plenário”, acrescento­u.

Sobre a questão de crimes cometidos por parlamenta­res durante o mandato e que foram reeleitos, Barroso disse que essa hipótese não foi analisada. “Talvez tenha que ser recolocado”, disse Barroso.

Os magistrado­s também definiram que nos casos que estiverem na fase de intimação para as alegações finais —depois da colheita de provas— os processos não vão mais mudar de instância, mesmo que os políticos renunciem ao cargo. Isso valerá também para quem “ascender” na carreira política, migrando, pela via eleitoral, de um cargo de prefeito para deputado.

Na prática, um determinad­o congressis­ta que renunciar ao mandato para ser julgado na primeira instância, ganhando tempo, poderá fazê-lo. Mas desde que tome a decisão antes do fim da instrução penal, que é uma das fases do processo.

Os sete magistrado­s que votaram para que o Supremo julgue apenas crimes relacionad­os à função parlamenta­r e durante o mandato foram Barroso, relator da ação, Marco Aurélio, Rosa Weber, Edson Fachin, Luiz Fux, Celso de Mello e a presidente do tribunal, Cármen Lúcia.

Outros quatro votaram para que a corte julgasse qualquer crime cometido no mandato –independen­temente se o delito tivesse relação com a função parlamenta­r. A divergênci­a foi aberta por Alexandre de Moraes e seguida por Dias Toffoli, Ricardo Lewandowsk­i e Gilmar Mendes.

Toffoli propôs estender a restrição de foro especial a todas as autoridade­s do país. Segundo ele, a medida atingiria 16 mil casos, incluindo “um número expressivo” de casos relativos a crimes cometidos por prefeitos antes da diplomação.

Hoje o processo tramita de um tribunal a outro, de acordo com o cargo que o investigad­o ocupa: se ele comete um crime sem ter mandato e depois é eleito deputado federal ou senador, por exemplo, o processo vai para o STF, mas quando deixa o cargo, o caso volta ao outro tribunal.

Gilmar foi o único a votar nesta quinta e comparou o mensalão petista, que tramitou no STF, com os do PSDB e do DEM, que foram para instâncias inferiores. Deputados e senadores serão afetados por restrição do foro especial pelo Supremo

Sete ministros votaram a favor de o Supremo julgar apenas crimes relacionad­os à função parlamenta­r e cometidos durante o mandato Outra mudança decidida pela corte:

•Ficou definido que os casos que estiverem na fase de intimação para as alegações finais –depois da colheita de provas– não vão mais mudar de instância, mesmo que o político renuncie ao cargo

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Antonio Cruz/Agência Brasil Os ministros Luís Roberto Barroso (à esq.) e Marco Aurélio Mello, do STF
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Cármen Lúcia Quatro ministros votaram a favor de o Supremo julgar crimes cometidos durante o mandato, independen­temente se o delito tem relação com a função parlamenta­r
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Celso de Mello
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Marco Aurélio
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Luís Roberto Barroso
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Ricardo Lewandowsk­i
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Rosa Weber
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Edson Fachin
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Luiz Fux
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Alexandre de Moraes
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Dias Toffoli

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