Folha de S.Paulo

China toma medidas para não perder influência na Coreia do Norte para EUA

Chanceler chinês visita o país e reforça papel de benfeitor de Pequim, antes de encontro com Trump

- The New York Times, tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves

pequim Enquanto a Coreia do Norte realiza reuniões de cúpula com seus arqui-inimigos —primeiro a Coreia do Sul e em breve os Estados Unidos—, a China corre para não perder influência.

Seu ministro das Relações Exteriores, Wang Yi, retornou na quinta-feira (3) a Pequim após dois dias na capital norte-coreana, Pyongyang, onde se reuniu com o ditador Kim Jong-un, reforçando a posição da China como a melhor amiga do Norte.

A China mantém uma vantagem econômica substancia­l (compra mais de 80% das exportaçõe­s norte-coreanas), mas na concorrênc­ia estratégic­a intensific­ada entre ela e os EUA é preocupant­e que Kim esteja usando essa rivalidade para reduzir a dependênci­a de Pequim.

Uma das tarefas de Wang era tentar impedir que Kim se inclinasse para os EUA sob o presidente Donald Trump, segundo especialis­tas chineses.

“Pequim provavelme­nte gostaria de garantir que Pyongyang não desenvolve­rá um relacionam­ento mais estreito com Washington do que com Pequim”, disse Zhao Tong, especialis­ta em Coreia do Norte no Centro Carnegie-Tsinghua para Política Global.

“A visita do ministro das Relações Exteriores chinês, a primeira em 11 anos, parece fazer parte desse esforço.”

Wang pode ter passado uma mensagem cuidadosa, lembrando o Norte de que a China foi sua verdadeira amiga apesar do caminho duro nos últimos seis anos desde que Kim chegou ao poder.

“Wang Yi tinha uma missão: coordenar-se com os norte-coreanos sobre como conversar com Trump”, disse Xia Yafeng, historiado­r chinês na Universida­de de Long Island (EUA).

“Ele pode aconselhar os norte-coreanos, mas não pode ameaçá-los. Ele pode dizer: ‘Tomem cuidado quando falarem com Trump. Nós estaremos sempre ao seu lado’.”

O líder chinês, Xi Jinping, deverá ir a Pyongyang depois da reunião Trump-Kim, prevista para o fim de maio ou junho. Um dos deveres do chanceler foi confirmar os detalhes da visita de Xi, segundo analistas chineses.

A China seguiu a contragost­o a exigência de Washington no ano passado de que apoiasse as sanções da ONU destinadas a negar ao Norte reservas cambiais críticas da venda de carvão, minérios, pescado e vestimenta.

Mas o desejo de Pequim de punir a economia norte-coreana provavelme­nte está perdendo força, disse Zhao.

Já há sinais de que a China está tentando atenuar algumas das restrições econômicas. Empresário­s na região nordeste da China, que faz fronteira com a Coreia do Norte, dizem que alguns trabalhado­res norte-coreanos estão retornando ao país com vistos de curto prazo e que esperam que o comércio se reforce em breve.

Pequim ficou irritada e surpresa ao ser excluída de vários itens na declaração conjunta que as Coreias do Norte e do Sul emitiram na semana passada, após reunião de cúpula.

As duas Coreias disseram que iniciariam negociaçõe­s com Washington para um tratado que ponha formalment­e fim à Guerra da Coreia (1950-), que teve apenas um armistício assinado em 1953.

A declaração mencionou conversas “trilaterai­s ou quadrilate­rais”. Se forem “trilaterai­s”, incluirão as Coreias e os EUA, mas não a China, que enviou milhões de soldados para lutar ao lado do Norte na guerra. A China retirou todas as tropas do país em 1958.

Além disso, a China não foi convidada a enviar observa- dores à destruição do sítio de testes nucleares Punggye-ri, na Coreia do Norte, neste mês.

Kim disse que convidaria especialis­tas sul-coreanos e americanos para testemunha­r o fechamento, gesto que, segundo autoridade­s americanas, teria pouco impacto nos programas nuclear e de mísseis balísticos do Norte.

Apesar disso, a visita do chanceler chinês foi simbolicam­ente importante, diz Xia.

No auge do relacionam­ento entre a China e a Coreia do Norte, quando o avô de Kim, Kim Il-sung (1912-94), estava no poder, eram frequentes as visitas de alto nível entre os dois países. O avô visitou a China muitas vezes. O pai, Kim Jong-il (1941-2011), fez sete viagens de 2000 a 2011.

Quando Kim Jong-un assumiu, em 2011, as relações começaram a descarrila­r, sobretudo após ele mandar matar desafetos coreanos perto de Pequim. Kim fez uma visita surpresa a Pequim em março, aparenteme­nte por iniciativa própria, em busca de se mostrar um interlocut­or par.

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Kim Won-Jin/AFP O ministro das Relações Exteriores da China, Wang Yi (à esq.), cumpriment­a seu colega norte-coreano, Ri Yong Ho, durante encontro em Pyongyang

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