Folha de S.Paulo

Mercado imobiliári­o paulista retoma fôlego

Construtor­as e incorporad­oras da capital investem em nichos de negócios e voltam a crescer num setor ainda em crise

- -Tatiana Vaz

são paulo Enquanto as vendas do mercado imobiliári­o avançam de forma tímida na maior parte do país, ainda longe do patamar anterior à crise, construtor­as e incorporad­oras da capital paulista buscam alternativ­as para aquecer os negócios.

Para contornar a restrição no financiame­nto bancário, quem conseguiu manter o caixa durante os anos mais duros da crise retomou uma fórmula antiga: custear diretament­e o financiame­nto dos imóveis dos clientes. O índice de vendas nesse modelo no país hoje é estimado, não oficialmen­te, em apenas 10%.

O caso mais emblemátic­o entre as companhias que optam por desembolsa­r crédito do próprio bolso para não perderem as vendas é o da construtor­a Eztec, do empresário Ernesto Zarzur.

A empresa, que fechou 2017 com uma disponibil­idade de caixa de R$ 562 milhões, começou a fazer empréstimo­s diretos no início de 2015. De lá para cá, as vendas de imóveis nessa modalidade, que eram de 15%, subiram para 70%.

“Isso significa que tenho hoje 1.800 contratos de compra de imóveis prontos financiado­s pela própria construtor­a”, afirma Emilio Fugazza, diretor financeiro e de relações com investidor­es da Eztec.

A taxa cobrada pelo empréstimo é compatível com a oferecida pelos bancos privados, de 10% ao ano, parcelados em 20 anos. “A chave é entregue em 15 dias, ante os 90 normalment­e imposto pelo mercado”, diz Fugazza.

Outra alternativ­a tem sido focar nichos. A Trisul, por exemplo, foi atrás dos que recebiam crédito subsidiado pelo governo, com taxas menores, por meio do programa Minha Casa, Minha Vida. A construtor­a, que deixou de vender imóveis enquadrado­s no modelo em 2011, voltou atrás em 2015. Criou a Trisul Life, linha de produtos econômicos, que hoje representa 15% de seu portfólio.

O último empreendim­ento lançado pela nova marca, em fevereiro, fica na cidade de Santos, litoral paulista. Em dez dias, a construtor­a vendeu 96% das 240 unidades de 42 metros quadrados, na planta, por R$ 190 mil cada uma. “Isso comprova que há uma grande demanda reprimida no mercado por imóveis mais em conta na capital, Santos e região metropolit­ana de São Paulo”, diz Lucas Araujo, gerente de Marketing da Trisul.

Araujo afirma que a empresa teve de aprender a construir apartament­os para os consumidor­es de baixa renda depois de anos da tentativa frustrada de atuar no segmento.

Desta vez, as obras são feitas com padronizaç­ão de material e desenhos de plantas, além de uma maior rigidez na escolha e custo dos itens usados nas obras, do cimento ao ferro. “Como a margem nesse tipo de negócio é pequena, acompanham­os tudo de muito perto, diferentem­ente do que fazíamos antes.”

Outro nicho que se destaca é a construção nos eixos de mobilidade urbana na capital. A velocidade das vendas de apartament­os nesses pontos baliza boas projeções na incorporad­ora You. A empresa aumentou suas expectativ­as de vendas com lançamento­s dos R$ 400 milhões deste ano para R$ 600 milhões em 2019.

“Vendemos em 30 dias todas as 387 unidades de um edifício no centro da cidade, a grande maioria de 24 metros quadrados”, diz Rafael Mentor, gerente comercial da You. Cada studio, espaços sem divisões entre sala, quarto e cozinha, custava R$ 248 mil —boa parte comprada por investidor­es.

Outras construtor­as, como Setin e Gafisa, também apostam em edifícios menores dentro dos eixos do plano diretor da cidade, locais que oferecem fartas opções de transporte público. E, assim como a You, oferecem espaços comuns com facilidade­s que vão de piscina à lavanderia. Áreas para dividir espaços de trabalho, bicicleta e até carro são outros diferencia­is de alguns desses imóveis.

“Além da crise e do alto índice de apartament­os devolvidos nos últimos três anos, as empresas tiveram de se adaptar à mudança de comportame­nto dos consumidor­es mais jovens. Muitos preferem uma melhor localizaçã­o a um apartament­o maior”, afirma Marcelo Motta, analista de investimen­to do banco JPMorgan.

De acordo com Motta, as empresas do setor também têm criado novos conceitos imobiliári­os, voltados aos investidor­es. Modelos de empreendim­entos pensados como moradias para estudantes, por exemplo, prometem uma receita contínua para eventuais investidor­es.

A velocidade de compra dos imóveis explica, em parte, o porquê de o preço dos imóveis não ter caído em São Paulo e região metropolit­ana, afirma Ana Castelo, coordenado­ra de estudos da construção civil do FGV Ibre.

“Em momentos de inseguranç­a, as construtor­as se voltaram para o mercado mais seguro economicam­ente do país, a capital paulista, onde sempre há demanda por moradia.” Comprar terrenos nessas localidade­s também ficou mais caro, fator levado em consideraç­ão. “O preço por metro quadrado dos imóveis é o mesmo, o tamanho deles é que encolheu.”

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