Sonda da Nasa parte para fazer o primeiro checkup de Marte
InSight, que deve ser lançada neste sábado, terá missão inédita de entender como é o interior do planeta vermelho
são paulo E lá vamos nós de novo para o planeta vermelho. A mais nova investida vem da Nasa, que lança neste sábado (5) a sonda InSight. Se tudo der certo, a espaçonave deve pousar no quarto mundo a contar do Sol em novembro, para fazer o primeiro “checkup” de Marte.
Pelo menos, essa é a metáfora que a agência espacial americana está usando. Na prática, isso significa detectar potenciais terremotos marcianos (o “pulso” do planeta), medir o transporte de calor do interior para a superfície (a “temperatura”) e calcular a oscilação dos polos marcianos em sua órbita ao redor do Sol (os “reflexos”).
Será a primeira oportunidade de compreender como está estruturado o interior do planeta.
O nome da missão tem duplo sentido. Não só é um acrônimo esperto para Exploração Interior com Investigações Sísmicas, Geodésia e Transporte de Calor (em inglês), como também tem o significado de “percepção, lampejo”, e é isto que a sonda espera obter: uma visão mais completa de como se formam planetas rochosos, como o nosso e Marte.
Com pouco mais da metade do diâmetro do nosso planeta (6.800 km contra 12.750 km), Marte é uma Terra em miniatura. E, ao que tudo indica, o planeta vermelho começou bem parecido com o nosso — oceanos, mares, rios e lagos ocuparam boa parte de sua superfície durante o primeiro bilhão de anos.
O tamanho modesto, contudo, parece tê-lo condenado a uma fossilização precoce. Seu interior se esfriou, o campo magnético do planeta foi desligado, sua atmosfera foi varrida pelo vento solar, o vulcanismo diminuiu brutalmente e o mundo se tornou um deserto gélido. Boa parte da água se perdeu, embora muito dela ainda esteja por lá, congelada sob o solo enferrujado pela oxidação do planeta.
Essa desgraça toda aconteceu aproximadamente uns 3,5 bilhões de anos atrás. Desde então, Marte se tornou um planeta fóssil.
Entender como isso se deu passa por compreender como é a estrutura interna do planeta e no que ela difere da terrestre. Marte tem um manto e um núcleo metálico? Qual o tamanho deles? Ainda há algo em estado líquido nas profundezas? A InSight é como uma “viagem ao centro de Marte” —e isso sem afundar mais do que cinco metros no solo com uma perfuratriz.
A espaçonave em si é bastantebaseadanaPhoenix,módulo de pouso que desceu perto do polo Norte de Marte em 2008. “Algumas das peças inclusive foram reaproveitadas daquela missão”, diz Ramon de Paula, engenheiro brasileiro que trabalha na Nasa como executivo de programa da missão.
Apesar dessa similaridade, pousar em Marte é sempre difícil, e o fato de ter dado certo em 2008 não quer dizer que vá sair tudo bem agora. “A probabilidade de sucesso é a mesma da que tinha a Phoenix.”
Mas, enquanto a Phoenix desceu próxima a um polo, a InSight vai para uma região colada ao equador marciano. A nova nave é um pouco mais pesada, vem em velocidade mai- or e terá menos atmosfera para ajudar na frenagem com para-quedas, uma vez que a área de pouso da InSight tem altitude cerca de 1.500 metros maior que a da Phoenix.
Apesar dos desafios, há grande confiança de que a missão será bem-sucedida. “As estimativas são da ordem de 99,8%, 99,9%”, diz De Paula. E bem que precisam ser, pelo custo total de US$ 829 milhões.
Originalmente, a InSight deveria ter voado em 2016. Contudo, os últimos testes do principal instrumento, o sismômetro, revelaram que a cobertura que o protege sofreu uma pequena rachadura em simulações das condições marcianas. Isso comprometia o desempenho científico.
Os engenheiros da Nasa, em parceria com colegas da Cnes, agência espacial francesa e responsável pelo instrumento, bem que tentaram corrigir a ponto de não atrasar a missão. Mas até nisso Marte é jogo duro —só se pode fazer a viagem no momento em ele está apropriadamente alinhado com a Terra, o que acontece a cada 26 meses.
Com o prazo estourado, a opção foi adiar a missão. E aqui estamos nós, 26 meses e US$ 153 milhões depois, prontos para o voo.
Será a primeira decolagem interplanetária feita da Base Vandenberg da Força Aérea, na Califórnia. Até então, todas as missões americanas desse tipo haviam sido lançadas da Flórida, que está mais próxima do equador e, com isso, permite lançamentos com maior economia de combustível para esse perfil de voo espacial.
E o foguete Atlas V-401 não levará apenas o InSight, mas também duas pequenas espaçonaves de demonstração tecnológica. São dois cubesats, cada um do tamanho de uma caixa de sapato, mas com um significado histórico: são os primeiros veículos espaciais do tipo a fazerem uma missão interplanetária.
Os cubesats —satélites de pequeno porte e baixo custo— estão virando uma febre na indústria aeroespacial e têm servido a uma vasta gama de aplicações. Mas, até agora, todas em órbita terrestre.
A missão se chama MarCO, acrônimo para Mars Cubesat One, e os dois pequenos satélites foram apelidados de Wall-E e Eva, em homenagem à animação da Pixar. (A lógica é que eles usam gás de extintor de incêndio, nitrogênio, para manobrar, como o robô Wall-E faz no filme.)
“A missão tem três pontos importantes”, diz Lucas Fonseca, engenheiro que lidera o esforço privado brasileiro de lançar uma missão lunar num cubesat, a Garatéa-L.
“Primeiro, validar tecnologias desse tipo para missões interplanetárias; segundo, mostras que se pode fazer missões interplanetárias de baixo custo com cubesats —e isso eu sei bem porque estamos tentando fazer uma missão desse tipo—; e, terceiro, encorajar a miniaturização das tecnologias, o que pode ter impacto em diversas indústrias.”
Wall-E e Eva terão dois objetivos: sobreviver à viagem até Marte e monitorar a descida do InSight, captando sinais do módulo de pouso e retransmitindo-os à Terra.
O lançamento acontece às 8h05 (horário de Brasília), e a Folha transmite ao vivo em folha.com/mensageirosideral.