PF sugere que Odebrecht deu dinheiro a Yunes em 2 parcelas e que citou ameaça
Indicação consta de laudo da corporação no sistema de propina da empreiteira; amigo de presidente diz que não tem relação com caso
brasília Laudo da Polícia Federal indica que o advogado José Yunes, amigo do presidente Michel Temer, recebeu R$ 1 milhão da Odebrecht em duas parcelas de R$ 500 mil.
O segundo repasse, de acordo com análise dos investigadores, só teria ocorrido mediante pressões sobre a empreiteira e até a ameaça de um escândalo em Brasília.
O laudo foi elaborado a partir de novos arquivos entregues pela Odebrecht à Lava Jato.
A perícia da PF foi concluída em abril deste ano e integra o inquérito que apura se Temer e aliados negociaram, em reunião no Palácio do Jaburu, R$ 10 milhões em doações ilícitas de campanha para integrantes do MDB.
Os peritos recuperaram planilhas com a programação do suposto pagamento a Yunes, bem como dados da liquidação desse repasse. Além disso, foi encontrado um e-mail no qual integrantes do esquema de corrupção da Odebrecht relatam pressão para que recursos fossem pagos.
Como a Folha revelou no domingo, em depoimento prestado à PF, o policial militar Abel de Queiroz disse ter ido duas vezes ao escritório do advogado para fazer entregas de dinheiro.
Uma das planilhas esquadrinhadas no laudo descreve a programação inicial de pagar R$ 1 milhão, em 26 de agosto de 2014, por meio de compromisso firmado com “Angorá” —codinome associado aos ministros da Casa Civil, Eliseu Padilha, e de Minas e Energia, Moreira Franco. A senha para a entrega dos recursos seria “Pássaro”.
Num outro registro, consta que esse pagamento deveria ser feito “na rua Capitão Francisco, 90, Jardim Europa”, onde funciona o escritório de Yunes. “Procurar o sr. José Yunes ou a sra. Cida”, diz o texto localizado pela PF.
Uma terceira tabela, intitulada “extrato bancário”, indica que, em vez de R$ 1 milhão, foram repassados inicialmente R$ 500 mil. Essa movimentação financeira, datada de 1º de setembro de 2014, tem o mesmo código de requisição que consta da programação inicial de pagamento no escritório de Yunes.
O e-mail encontrado no material apresentado pela Odebrecht foi escrito em 30 de setembro de 2014, ou seja, quando, no entendimento da PF, os primeiros R$ 500 mil já teriam sido pagos. Foi enviado por Waterloo —codinome que seria de a Fernando Migliaccio, executivo do departamento de propinas da empreiteira— a Vinho, o doleiro Álvaro Novis, que trabalhava para a empreiteira.
No texto, Waterloo diz que a programação de pagamento era de R$ 1 milhão, mas, por “questões de caixa”, só havia autorizado pagar R$ 500 mil.
Ele alega que a situação não poderia perdurar, em função do perfil do beneficiário dos recursos. “Dado o nível da pessoa, tanto do ponto de vista político, como do ponto de vista de caráter, não posso ficar com essa exposição”, escreveu.
Na sequência, Waterloo relata intimidações. “Preciso resolver os R$ 500 mil que ENTENDA O CASO
À PF, um ex-motorista de uma empresa de transporte contratada pela Odebrecht disse ter entregue, ao menos duas vezes, dinheiro a Yunes
ele alega não ter recebido. Já ameaçou fazer escândalo em Brasília e o pior é que ele conhece muito do nosso esquema. Ou seja, não dá para vacilar com este sujeito”, alertou. O texto não deixa claro quem é a pessoa que fez a ameaça.
Temer também é alvo de inquérito que avalia se ele recebeu propina em troca de vantagens a empresas do setor portuário. Nesta segunda (7), o ministro Luís Roberto Barroso autorizou a prorrogação por mais 60 dias.
Advogado diz que cliente nunca foi intermediário
O advogado de Yunes, José Luís de Oliveira Lima, disse em nota que seu cliente “jamais atuou como intermediário de qualquer pessoa”, desconhece a existência de e-mails citados na investigação e “não conhece e nunca esteve com Abel de Queiroz”. “Apesar de a defesa não conhecer o teor desse eventual depoimento [de Abel Queiroz], José Yunes refuta qualquer ilação a seu nome”, acrescentou.
O advogado de Temer, Brian Alves Prado, diz que a defesa “reitera as respostas já há muito tempo dadas sobre esse mesmo enredo, ou seja, nega qualquer envolvimento do presidente com os fatos”.
Em entrevista à rádio CBN, o presidente disse não ter medo de ir para a cadeia após o fim do mandato. “Não temo, não temo, não temo. Eu acho que seria uma indignidade”, disse.