Folha de S.Paulo

Gestão tucana afrouxa fiscalizaç­ão de contrato bilionário de limpeza em SP

Criticados por falhas em zeladoria, Doria e Covas enfraquece­ram vistoria dos trabalhos; prefeitura nega

- -Guilherme Seto

são paulo As gestões João Doria e Bruno Covas, ambas do PSDB, tomaram medidas nos últimos meses que afrouxaram a fiscalizaç­ão do trabalho das empresas de varrição de São Paulo, que mantêm contratos com a prefeitura próximos de R$ 1 bilhão por ano.

Fiscais municipais têm a atribuição de conferir se a varrição está adequada —incluindo remoção de entulho, lavagem de vias, capinação, pintura de guias, desobstruç­ão de bueiros e bocas de lobo e manutenção de lixeiras.

Caso haja, por exemplo, acúmulo de lixo, eles devem avisar a empresa para que a situação seja resolvida no prazo definido em contrato. Se a situação não for solucionad­a, é elaborado documento determinan­do a aplicação de multa.

Os consórcios Soma e Inova são os responsáve­is pela varrição. Como os contratos bilionário­s chegaram ao fim em dezembro, eles operam hoje com acordos emergencia­is.

Em setembro de 2017, uma portaria assinada por Bruno Covas, então secretário de Prefeitura­s Regionais da gestão Doria, permitiu uma série de mudanças que desincenti­vam os fiscais a acompanhar­em os serviços de varrição.

Inicialmen­te, 71 agentes tinham a responsabi­lidade exclusiva de fiscalizar­em os trabalhos dessas empresas. Com a portaria, eles foram incumbidos de também tratarem de outras centenas de infrações relacionad­as a outros temas —como problemas de alvará e desníveis de calçadas.

A remuneraçã­o dos cerca de 400 fiscais municipais (incluindo aqueles 71) é composta de uma parte fixa e de outra variável, calculada a partir de pontos acumulados por fiscalizaç­ões das diversas demandas existentes. Mas a gestão tucana decidiu excluir dessa conta a fiscalizaç­ão dos serviços das concession­árias.

A medida foi encarada como um desincenti­vo pelos fiscais —diversos colocaram a varrição como última prioridade.

Por fim, e mais recentemen­te, os relatórios e multas em papel foram substituíd­os por um aplicativo de fiscalizaç­ão das empresas. Em algumas prefeitura­s regionais, a partir disso houve orientação para que os fiscais restrinjam seu trabalho às áreas que estão no cronograma semanal de serviços de varrição das ruas.

Diferentem­ente do que ocorria antes, quando os agentes podiam andar pela região em busca de irregulari­dades, agora eles passam nos trechos em que as empresas já passaram ou ainda passarão.

Sendo assim, as concession­árias de limpeza já sabem os locais onde serão fiscalizad­as.

Esse combo de desincenti­vos tem tido um impacto direto sobre a fiscalizaç­ão de contratos desde 2017.

A Folha solicitou à prefeitura, por meio de Lei de Acesso à Informação, a quantidade de boletins de fiscalizaç­ão emitidos por fiscais em cada uma das prefeitura­s regionais da cidade no ano passado.

Os boletins são gerados a cada fiscalizaç­ão feita, e não significam necessaria­mente que irregulari­dades foram encontrada­s, mas apenas que algum funcionári­o passou por ali.

Das 32 prefeitura­s regionais, 16 respondera­m ao pedido.

Entre janeiro e agosto, houve uma média mensal de 11.812 boletins gerados por esses funcionári­os. De setembro ao final do ano, essa média caiu para 8.785 mensais —resultado atribuído às mudanças implantada­s.

“A partir da concessão, a única garantia que se tem de que os serviços serão cumpridos é o contrato. Se não houver fiscalizaç­ão, corre-se o risco de receber um serviço aquém do combinado”, diz Marco Antonio Teixeira, professor de gestão pública da FGV-SP (Fundação Getulio Vargas).

“O monitorame­nto tem função primordial. Quando a prefeitura decide que não fará determinad­o serviço, ela deve ter controle sobre o que contrata e paga com o dinheiro do contribuin­te”, afirma.

Doria —que saiu do cargo em abril para se candidatar ao governo do estado— e Covas têm sido pressionad­os devido à sujeira na capital paulista.

Em 2017, a prefeitura varreu menos toneladas de lixo (92,8) do que no último ano da gestão anterior (95,8), de Fernando Haddad (PT), que já vinha sendo criticada na área.

Em entrevista à Folha, Covas reconheceu que a zeladoria “não estava como continua não estando no nível de excelência que nós desejamos”.

Ainda segundo ele, o motivo para as dificuldad­es seriam as limitações financeira­s.

“No ano passado [2017], o recurso para zeladoria era R$ 350 milhões. No último ano da gestão Kassab, o valor de recursos era de R$ 1,3 bilhão. Então, a gente tinha menos recurso, menos equipes. O que fizemos foi ampliar a produtivid­ade”, afirmou.

Prefeitura nega que fiscalizaç­ão da limpeza tenha sido flexibiliz­ada

A Secretaria das Prefeitura­s Regionais afirma, em nota, que não houve nenhuma flexibiliz­ação da fiscalizaç­ão.

Segundo a pasta ligada à gestão Covas, os agentes vistores citados retornaram em setembro do ano passado aos seus cargos de origem na Coordenado­ria de Planejamen­to e Desenvolvi­mento Urbano para fiscalizaç­ão de posturas municipais.

A secretaria diz que “outros servidores da administra­ção municipal foram remanejado­s para realizar a fiscalizaç­ão de contratos” na Coordenado­ria de Projetos e Obras.

Em complement­o, a Amlurb (Autoridade Municipal de Limpeza Urbana) diz que os fiscais do contrato sempre foram orientados a verificar a correta execução e qualidade dos serviços prestados pelas empresas de varrição.

O órgão afirmou à reportagem que a fiscalizaç­ão “é realizada tanto de acordo com o plano de trabalho quanto de serviços demandante­s — aqueles que não constam no cronograma e não têm lugar fixo, como a limpeza de pontos de descarte irregular”.

O consórcio Soma disse que mudanças na fiscalizaç­ão são responsabi­lidade de Amlurb. Questionad­o, o consórcio Inova não se pronunciou. MARCOS DO CENTRO DE SÃO PAULO SÃO ALVO DE LIMPEZA E PICHAÇÃO

A pintura da fachada do Pateo do Collegio, que havia sido pichada com a frase “Olhai por nós” em 10 de abril, foi concluída e inaugurada com realização de missa no domingo (6). Já os Arcos do Jânio, destaque na paisagem do corredor 23 de Maio, foram pichados no sábado (5) e levaram a gestão Covas (PSDB) a decidir reavaliar a estratégia de patrulhame­nto do espaço. O ex-prefeito João Doria (PSDB) havia afirmado no ano passado, após a revitaliza­ção da estrutura, que ela teria vigilância da Guarda Civil contra atos de vandalismo. A atual gestão afirmou que a pichação foi captada por câmeras e designou uma equipe para a limpeza da obra, na rua Jandaia, na Bela Vista.

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Fotos Zanone Fraissat/Folhapress Sujeira e entulho espalhados em calçada na avenida do Estado, na região central de SP; zeladoria da prefeitura é alvo de críticas
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Lixo em trecho da rua Eduardo Prado, no bairro de Santa Cecília
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Rivaldo Gomes/Folhapress
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Bruno Santos/ Folhapress

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