‘Guia Michelin’ premia novos restaurantes em SP
são paulo O paulistano Tuju, do chef Ivan Ralston, e o carioca Oro, do chef Felipe Bronze, receberam ontem duas — das três estrelas possíveis— do “Guia Michelin Rio de Janeiro & São Paulo”, publicação que anunciou nesta segunda (8) sua edição 2018.
Até 2017, apenas o paulistano D.O.M, de Alex Atala, possuía duas estrelas. Nenhum brasileiro tem três estrelas. Neste ano, são 19 casas estreladas no total.
Para Bronze, foi uma surpresa. “Não temos o perfil. Não temos toalha na mesa, fazemos uma cozinha criativa, não trabalho focado nisso. É a vitória da vanguarda”, diz
Já Ivan Ralston, do Tuju, acredita que o prêmio é um reconhecimento do trabalho do restaurante, mas também da cena gastronômica paulistana. “São Paulo mistura muitas coisas, árabes, italianos, japoneses e judeus, como eu. Isso não é ser fusion, isso é ser uma cultura gastronômica de fato.”
Além das casas com duas estrelas, outros 16 restaurantes têm uma estrela. As novidades entre estes são o Ryo Gastronomia e o Tangará Jean-Georges, no Palácio Tangará, ambos em São Paulo.
O anúncio quebra o jejum do ano anterior, sem muitas novidades. “O mercado brasileiro está evoluindo rapidamente. Tem mais finesse, mais qualidade. Todo o ecossistema é melhor, incluindo o espaço para bons produtores”, diz o diretor internacional da publicação, Michael Ellis.
Então, por que ainda não temos uma terceira estrela? “Chega com o tempo”, responde ele.
Ao longo de meses, inspetores do Guia Michelin visitam anonimamente casas. O guia foi criado em 1900, na França, e está presente em 31 países. A edição brasileira é a primeira da América do Sul. As montanhas desertas de Antofagasta logo em frente ao mar foram uma visão inesperada à saída do aeroporto, e imediatamente aconchegante. Minutos mais tarde, a calmaria mental havia dado lugar a ansiedade. O que mudou no trajeto? Chegamos nos arredores da cidade, e a visão das formas arredondadas foi interrompida por um mar de linhas perfeitamente paralelas e ângulos retos ocupando a encosta até o litoral.
O saguão coberto da Universidade Erasmus, em Rotterdam, foi um choque semelhante de desconforto: lindo e cuidadosamente planejado —mas todo em listras. Muitos anos antes, Palmas de Tocantins, cidade planejada com ruas perfeitamente perpendiculares, havia-me causado o mesmo desconforto.
O que há de tão calmante em curvas naturais e tão agressivo nas linhas retas regulares da arquitetura de tantas cidades modernas? Pedro Maldonado, neurocientista da Universidade do Chile, sediada em uma área de ruas deliciosamente curvas e arborizadas em Santiago, explica. Na época em que éramos colegas de estudos sobre a visão, o estímulo visual preferido nos laboratórios de neurofisiologia eram padrões de listras deslizantes, que provocavam atividade furiosa de neurônios visuais no cérebro. Estudávamos esses disparos, então era útil ter muitos deles em nossos registros.
Pedro hoje estuda como estímulos visuais em cenas cotidianas causam um alinhamento do momento exato em que neurônios disparam um primeiro e único potencial de ação. “Aquelas listras que usávamos eram insanas, causavam uma atividade surreal, que não é normal no nosso mundo visual.”
“Exceto em nossas cidades modernas”, saí pensando de seu laboratório. Enchemos nossos horizontes de listras verticais regulares. Intencional ou não, o efeito é deixar o cérebro hiperestimulado, tenso. Não é à toa que a natureza é calmante. Até a mais reta das árvores ainda é irregular.