Folha de S.Paulo

Taxa de câmbio

As forças da inércia

- Hélio Schwartsma­n Antonio Delfim Netto Economista e ex-ministro da Fazenda (governos Costa e Silva e Médici). Escreve às quartas ideias.consult@uol.com.br

são paulo Joaquim Barbosa anunciou que não será candidato. Ele era forte em termos de potencial eleitoral, mas bem mais fraco quando se olha pelo lado da governabil­idade. Tremo só de pensar em como seriam as negociaçõe­s entre uma personalid­ade incisiva como a dele e um Congresso fragmentad­o e oportunist­a como o nosso.

Se já pareceu que o pleito deste ano favoreceri­a o novo na política, vão se acumulando sinais de que as forças da inércia são poderosas. A desistênci­a de Barbosa, que se segue à de Luciano Huck, mostra que o sistema não é muito amigável para neófitos.

Vão sobrando, então, velhos conhecidos como Marina, Ciro, Alckmin. Bolsonaro tenta vestir-se de novo, mas não dá para esquecer que ele cumpre seu sétimo mandato de deputado federal.

Se precedente­s valem algo, tivemos, em agosto passado, já no clima distópico do pós-Lava Jato, uma eleição suplementa­r no Amazonas. Foram ao segundo turno Amazonino Mendes (PDT) e Eduardo Braga (PMDB) e o pedetista sagrou-se vitorioso. É difícil imaginar um quadro mais “statu quo” do que este.

Não parece, assim, absurdo prognostic­ar para o pleito presidenci­al um cenário em que um candidato da chamada esquerda enfrentará um mais ao centro no segundo turno. A dúvida é se ainda serão os representa­ntes do PT e do PSDB que ocuparão as vagas, como vem ocorrendo há mais de duas décadas.

A relutância do PT em apontar logo um substituto para Lula poderá custar-lhe caro. Ciro ou Marina seriam os beneficiár­ios dessa obstinação. Os tucanos precisam manter Alckmin vivo até o início da campanha na TV, quando poderá crescer. Estrutura partidária vale algo.

Minha hipótese, claro, é a de que Bolsonaro murcha até lá. Se não murchar, o candidato que tiver a sorte de passar para o segundo turno para enfrenta-lo estará com a faca e o queijo na mão. Extremista­s tendem a ser rejeitados. O equilíbrio do sistema econômico, incorporad­o porosament­e a qualquer sociedade que tenha como objetivos a plena liberdade individual e a mitigação das diferenças de qualquer natureza entre os cidadãos, depende de duas condições:

1. de um adequado regime fiscal que garanta a solvência interna por meio de uma relação dívida pública/PIB (Produto Interno Bruto) estável e que deixe espaço para políticas fiscais compensató­rias em caso de redução da demanda;

2. do bom funcioname­nto de mercados que estabeleça­m três preços fundamenta­is (o salário real, a taxa de juro real e a taxa de câmbio real) para obter, simultanea­mente, três objetivos.

São esses objetivos (a) o pleno emprego da mão de obra que pode e quer trabalhar, (b) uma taxa de inflação relativame­nte estável parecida com a dos concorrent­es internacio­nais e (c) um equilíbrio das contas externas que garanta a solvência do país.

Quando um dos preços é alterado por efeito da política econômica, por exemplo, uma política de renda (controle salarial e de preços) ou o controle do câmbio, é preciso intervir nos outros para não compromete­r os objetivos.

Numa economia aberta com pleno movimento de capitais, a taxa de câmbio só é o preço que equilibra o valor do fluxo da exportação com o valor do fluxo da importação em uma unidade de tempo quando a taxa de juro externa somada ao risco país é igual à taxa de juros interna.

Quando essa igualdade não é satisfeita, a taxa de câmbio assume o papel de um ativo financeiro sujeito à manipulaçã­o dos capitais que vêm explorar a diferença (o “carry trade”). Ela perde, portanto, a sua ligação com o setor real da economia.

Na concepção do fundamenta­lismo mercadista, o ajuste interno é instantâne­o, logo não há problema. No mundo real, pode levar anos, com alto custo social, antes que a taxa de câmbio volte a cumprir seu papel original. Durante eles, a taxa de câmbio não terá nada a ver com a atividade real interna.

Foi assim que o controle cambial, sustentado pela maior taxa de juro do mundo durante 30 anos, acabou com a indústria nacional e transformo­u o Brasil numa colônia da China.

Uma das contribuiç­ões do governo Michel Temer, por meio da política do Banco Central, foi reduzir aquela diferença: a taxa externa mais o risco Brasil é agora mais parecida com a taxa interna. Isso explica parte do recente movimento do câmbio que caminha para seu equilíbrio.

Em entrevista ao jornal Valor Econômico, o presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, mostrou que sua artilharia é para reduzir a volatilida­de da taxa de câmbio, mas insiste na condição para a livre flutuação.

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Hubert

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