Folha de S.Paulo

Em crise de confiança, Correios reveem operação

Volume de reclamaçõe­s contra estatal mais do que dobrou, e tempo de entrega cresceu 50% para o comércio eletrônico

- -Joana Cunha

são paulo Agências lotadas, entregas mais lentas, funcionári­os e clientes descontent­es são o cenário deixado pela crise dos Correios, que vai entrar em mais uma etapa neste ano.

A estatal anunciou na segunda-feira (7) que estuda a próxima rodada de enxugament­o na sua rede de atendiment­o, num momento em que as reclamaçõe­s de usuários disparam.

Foram mais de 33 mil queixas registrada­s entre janeiro e abril deste ano, ante 12,3 mil em igual período do ano passado, segundo levantamen­to do Reclame Aqui, site que reúne reclamaçõe­s de consumidor­es de todo o país. O pico (10,2 mil reclamaçõe­s) aconteceu em março, quando parte dos funcionári­os entrou em greve.

Clientes frequentes afirmam que a piora ficou mais evidente desde que a estatal anunciou o fechamento de 250 agências no primeiro semestre do ano passado.

“Como eles fecharam a outra agência aqui perto, todo o mundo se acumula nesta aqui. Antes dava para esperar sentado nas cadeiras. Agora passa de uma hora de espera, e em pé”, disse Elisangela Pugno na tarde desta terça, em uma unidade dos Correios em Moema, bairro de classe média alta da capital paulista.

Para tornar produtivo o chá de cadeira quase diário, ela passou a marcar encontros com seu filho adolescent­e, Gabriel Pugno, na própria agência dos Correios.

“Meu filho vem aqui e me faz companhia, a gente fica conversand­o à tarde”, afirma.

Para tentar sanar um crise que se arrasta há mais de dois anos, com prejuízos bilionário­s em 2015 e 2016, a diretoria dos Correios abriu uma série de PDVs (programas de desligamen­to voluntário­s) no ano passado, cortando cerca de 10 mil funcionári­os.

Procurada, a empresa não quis se manifestar. Remeteu apenas a um comunicado divulgado em seu site em que informa que “vem realizando estudos pormenoriz­ados de readequaçã­o de sua rede de atendiment­o, o que inclui não apenas a sua rede física de atendiment­o como também novos canais digitais e outras formas de autosservi­ços”.

Após os PDVs, o número de funcionári­os caiu para cerca de 106 mil.

As turbulênci­as de 2016 foram provocadas, em grande parte, pelas perdas de seu plano de saúde, o Postal Saúde, que teve prejuízo R$ 1,8 bilhão. Mas o aperto foi generaliza­do, forçando a empresa a reduzir até questões menores como patrocínio­s esportivos.

A empresa também passa por outros desafios estruturai­s, como o serviço de entregas de encomendas Sedex, que passou a sofrer com o aumento da concorrênc­ia de empresas especializ­adas em entrega, além da transforma­ção no modelo de negócios de alguns de seus potenciais clientes varejistas que têm elevado os investimen­tos em logística própria.

O segmento de comércio eletrônico é um dos mais sensíveis à deterioraç­ão dos serviços da estatal, segundo Maurício Salvador, presidente da Abcomm (associação de lojas virtuais).

O prazo de entrega de encomendas do comércio eletrônico no país cresceu cerca de 50%, segundo levantamen­to da entidade, que neste ano entrou na Justiça contra os Correios.

“Além de piorar a qualidade, eles elevaram os preços. Hoje, nós temos uma liminar contra o aumento dos preços da tabela deles, que foi abusivo neste ano”, diz Salvador.

O presidente da Abcomm afirma que a situação piorou desde janeiro, com casos de empresas que entregavam em quatro dias, passando a fazer em dez dias.

“Imagine o impacto disso em um mercado com tanto potencial como o nosso, que espera crescer mais 15% neste ano e movimentar R$ 68,8 bilhões. Se o consumidor tiver seguidas experiênci­as ruins, ele pode deixar de comprar”, afirma. Em crise, Correios enxugam rede de atendiment­o

Empresa registra prejuízos consecutiv­os*

2015 2016

Empresa reduziu número de empregados com PDV (programa de desligamen­to voluntário)

2016 2018

Registros de reclamaçõe­s de consumidor­es no Reclame Aqui aumenta

2016 2017 de objetos distribuíd­os por dia

Frota (motos, veículos leves e pesados

agências próprias agências franqueada­s caixas de coleta

R$2,1bi R$1,5bi

117 mil 106 mil

32,24 mil 40,99 mil

 ?? Marlene Bergamo/ Folhapress ?? Elisangela Pugno, que se queixa de ter de esperar em pé nos Correios
Marlene Bergamo/ Folhapress Elisangela Pugno, que se queixa de ter de esperar em pé nos Correios

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil