Folha de S.Paulo

Feliz seios das mães

Não foi uma coisa grotesca, dessas que as feministas, com toda a razão, reclamam

- Tati Bernardi É escritora, redatora, roteirista de cinema e televisão e tem quatro livros publicados DSTQQSS Luís Francisco Carvalho Fº

Meus seios são para amamentar. Estão maiores —na verdade, estão enormes. E são para amamentar. Tinha uma festa ontem, até pensei na roupa, até pensei da babá dormir aqui, até pensei em usar um decote, mas achei melhor dormir. Dormir significa descansar e descansar significa encher meus seios de leite. O importante é amamentar. O importante é crescer minha filha, lhe rosar as bochechas, lhe encher as fraldas.

Tenho ideias para livros e penso em escrevê-los em um escritório que eu alugaria perto

Antonio Prata | Juliana de Albuquerqu­e, Antonia Pellegrino e Manoela Miklos | Vera Iaconelli | Ilona Szabó, Jairo Marques | Sérgio Rodrigues | Tati Bernardi |

Acima, Flávia Virgínia, filha do cantor Djavan; à direita, frente do prédio no centro que é ocupado por sem-teto de casa. Quando estou sozinha e escrevo e gosto do que sai, entendo os músicos em transe. É como se meu corpo fizesse uma excelente parceria com o ar e eu virasse um caracol eletrizado. Não é mais forte e nem mais bonito que amar um filho, mas é muito forte e muito bonito e completame­nte independen­te de amar um filho.

Cheguei a pesquisar lugares e valores. Sonhei com a decoração muito “aqui ninguém entra, aqui é só meu” que eu faria. Sonhei com a música alta que eu ouviria espalhando farelos de qualquer salgado pelo chão. Tropeçaria em livros no chão. Dormiria, às vezes, como crianças que voltam da escola na hora do almoço, num sofazinho ao lado da escrivanin­ha. Eu ficaria ali no máximo quatro horas por dia, porque preciso amamentar.

Tiraria leite com a ajuda da bomba elétrica e deixaria na geladeira devidament­e etiquetado com data e hora e avisaria a babá e meu marido e minha mãe e minha sogra: qualquer coisa deixei leite, então me deixem. Melhor: ficaria no máximo duas horas no escritório e voltaria para amamentar. Minha filha certamente prefere meus seios a uma mamadeira requentada. O importante é amamentar. O ideal é nem alugar um escritório, não correr o risco de ficar parada no trânsito ou de gostar de não estar em casa.

Não fui à festa, não aluguei o escritório, sigo amamentand­o de duas horas e meia em duas e meia. Mas hoje eu estava voltando da padaria, matutando, como sempre, que eu precisava chegar logo em casa, para amamentar, e um jovem fixou o olhar em meus seios. Ele teve a cara de pau, o desplante, a ousadia, de me arrancar de meus pensamento­s obsessivos sobre a importânci­a da amamentaçã­o e me arremessar ao velho e bom mundo.

Se esbugalhou todo e depois ficou um tanto atrapalhad­o. Não foi uma coisa grotesca dessas que as feministas, com toda a razão, reclamam. O moço apenas teve uma reação e, ao se ver de fora da cena, não soube o que fazer com sua imagem. Quase o reconforte­i: “Foi só um desejo, vai ficar tudo bem”.

Meus seios, que eram somente para amamentar, que estão maiores, enormes, foram instantane­amente içados de um riacho morninho e manso chamado limbo libidinal. Vocês lembram daquele brinquedo que tinha no shopping? Aquele no qual tentávamos erguer pequenos e vagabundos ursinhos com uma garra escrota (certamente besuntada em fraude, pois era impossível agarrar qualquer coisa)? Então, não tem nada a ver com o que me aconteceu. Esse moço (esse jovem, esse ser iluminado que, apesar de todo o discurso contra o assédio, soube flertar, munido de uma cambaleant­e e educada timidez, com meus seios lactantes numa tarde de quarta-feira), ele conseguiu me tirar de algum lugar muito pulcro, ensimesmad­o e solitário.

Meu corpo inteiro é o bebê. Estamos misturados a tal ponto que, se ele precisa arrotar, muitas vezes o ar sai pela minha boca. Minha mente toda é o bebê. Estamos misturados a tal ponto que esqueço como usar as palavras. Meu seio todo é o bebê. Era todo o bebê. Obrigada, moço da Rua João Ramalho, esquina com a Ministro Godoi, por ter me paquerado. Talvez eu volte a frequentar festas e até alugue um escritório.

Oscar Vilhena Vieira, os detalhes da agenda diária (como a divisão de tarefas) e questões mais amplas, como a definição dos investimen­tos com a arrecadaçã­o.

“Aqui moram idosos, crianças, adolescent­es, deficiente­s. Uma das regras do prédio é que, para morar aqui, a criança tem que estar frequentan­do a escola. São critérios e regras definidos pela assembleia”, afirma. “Temos treinament­o de brigada. Tem bombeiro formado também morando aqui. O movimento preza a segurança das famílias de forma única”, diz Antonia.

A reportagem não foi autorizada por representa­ntes da FLM a entrar no edifício.

O prédio foi comprado em 2007 pelo empresário angolano Mario Fernandes Almeida no período em que ele se relacionou com Flávia (2002 a 2009). Eles moraram parte do tempo em Angola e outro no Brasil. Tiveram duas filhas antes de se separarem. Também foi nessa época que compraram seis imóveis em São Paulo.

Na época, Almeida planejava investir mais de R$ 11 milhões na reforma do prédio, para transformá-lo em um grande espaço para exibir arte africana. O projeto não vingou.

Atualmente, a propriedad­e do imóvel da São João é motivo de disputas judiciais entre Flávia e Almeida. Ela pede o direito de administra­r sozinha a propriedad­e. Segundo manifestaç­ão de Flávia no processo, o descaso do ex-companheir­o com o imóvel levou a dívidas de centenas de milhares de reais em impostos.

A filha de Djavan solicita ter o direito de decidir o destino do imóvel para que a herança das filhas não seja prejudicad­a.

Já Almeida, que vive em Portugal, diz que Flávia não teria direito à propriedad­e pela natureza do relacionam­ento deles e que ela estaria se aproveitan­do indevidame­nte. Ele entrou na Justiça com pedido de reintegraç­ão de posse.

Procurada pela Folha, Flávia não quis se pronunciar. Almeida informou que prefere não dar declaraçõe­s no momento. O cantor Djavan foi procurado, mas não respondeu.

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Joel Silva/Folhapress
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Reprodução

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