Folha de S.Paulo

Mensagens em garrafas

- Ruy Castro

rio de janeiro Tenho reparado que alguns emails enviados por mim só têm sido respondido­s dez dias depois. A desculpa é sempre a de que só então haviam sido abertos pelo destinatár­io. Não duvido. No mundo do WhatsApp, quem se preocupa em abrir emails? O fato de que, até outro dia, eles eram o principal veículo de comunicaçã­o entre humanos não quer dizer mais nada. Mandar um email para alguém parecese hoje com o náufrago que atira ao mar uma garrafa com uma mensagem, rezando para que, um dia, com sorte, a garrafa seja encontrada e a mensagem, lida.

Da mesma forma, deixar uma mensagem gravada na secretária eletrônica de um celular equivale a falar para um anfiteatro vazio, mesmo que se esteja recitando a “Odisséia”, de Homero. Por algum motivo, as pessoas já não se dão ao trabalho de escutar mensagens em secretária­s —ao ler no visor o número de quem telefonou, preferem ligar de volta e perguntar o que você deseja. O contrário também vale —ninguém mais dá bola para as secretônic­as. Há um mês, ganhei um aparelho com uma secretária. Mas, até agora, o número de mensagens deixadas nela ainda não chegou a dez.

Nenhuma tecnologia, por mais moderna, está a salvo. Todas terão o destino daquele que já foi o mais querido e importante elo entre pessoas distantes: a carta de correio. As pessoas — eu, inclusive— deixaram de escrevê-las. É pena: há certas mensagens que só ficam bem em cartas manuscrita­s —vide as de amor, de despedida e até as sórdidas e anônimas, entregando a sua mulher.

E não vou me referir àquele trissecula­r e heroico veículo a ser brevemente extinto: o telegrama. Dizem que, mais do que todos, ele ficou inútil. Será? Como conferir aos outros veículos a reconforta­nte sensação de urgência de um telegrama de parabéns ou de pêsames?

Acho que vou passar a imprimir meus emails, enfiá-los em garrafas e atirá-los ao mar.

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