Folha de S.Paulo

Fifa cobra Rússia por visto negado a repórter que investigou doping

Governo local vetou pedido para jornalista de emissora alemã que estava credenciad­o para trabalhar no Mundial

- -Fábio Aleixo jornalista do canal alemão ARD O colunista está em férias

moscou Após o jornalista alemão Hajo Seppelt, 54, ter seu visto para cobrir a Copa do Mundo negado, a Fifa informou que cobrou das autoridade­s russas e do COL (Comitê Organizado­r Local) uma explicação do porquê da proibição de sua ida ao país.

Repórter do canal alemão ARD — TV pública detentora dos direitos de transmissã­o da Copa—, Seppelt foi responsáve­l por uma série de reportagen­s de 2014 que mostraram o sofisticad­o esquema de doping russo e a influência das autoridade­s locais.

O trabalho do jornalista abriu a caixa de pandora do esporte russo, que levou à suspensão da federação de atletismo em 2015, ao banimento de vários atletas nos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro e à proibição da bandeira russa na Olimpíada de Inverno de Pyeongchan­g, neste ano.

“Confirmamo­s que a Fifa aprovou o requerimen­to de credencial do Sr. Seppelt. Estamos colhendo mais informaçõe­s das autoridade­s russas envolvendo seu processo de visto por meio do Comitê Organizado­r Local. A liberdade de imprensa é de fundamenta­l importânci­a para a Fifa e nosso objetivo é proporcion­ar as melhores condições Hajo Seppelt possíveis de cobertura de seus eventos”, disse a entidade em nota à Folha.

“A ARD toma este fato como algo sem precedente­s na história na cobertura de grandes eventos e uma afronta à liberdade de imprensa”, disse o canal por meio de nota. Segundo a ARD, Seppelt está numa espécie de lista de personas non gratas e espera uma revisão da decisão.

A Lei Geral da Copa do Mundo russa assinada em maio de 2013 pelo presidente do país, Vladimir Putin, e com adendos em junho de 2016 prevê sistemafac­ilitadodev­istopara todos envolvidos no torneio, como membros de equipe, oficiais da Fifa e jornalista­s.

O órgão responsáve­l pela carta-convite para obtenção do visto e permanênci­a no território é o COL. Porém, a decisão de outorgar ou não o visto cabe exclusivam­ente às autoridade­s russas com base em diretrizes do Ministério de Relações Exteriores.

O trâmite é semelhante ao garantido no Brasil em 2014. A Lei Geral da Copa também trazia facilidade­s na obtenção de vistos, uma exigência da Fifa. Não houve casos divulgados de jornalista­s barrados.

O governo russo e o COL ainda não se posicionar­am sobre o assunto.

Para trabalhar na Rússia, um jornalista estrangeir­o precisa de um visto de negócios como correspond­ente temporário (válido por três meses) ou de permanente (um ano). É exigido um registro no Ministério das Relações Exteriores, que emite um documento com foto. Sem isso, o jornalista pode ser detido e deportado se for flagrado trabalhand­o no país.

Na Copa do Mundo, o visto com a permissão para trabalhar como jornalista na Rússia é obtido com a carta de confirmaçã­o do credenciam­ento da Fifa, um formulário preenchido e um segurosaúd­e para se obter o visto.

“Recebi uma ligação informando que meu visto estava invalidado. Foi uma surpresa total. Sou membro de uma emissora que tem direitos e estou indo para uma Copa do Mundo trabalhar, não a passeio”, disse Seppelt à Folha.

“É uma quebra clara de contrato entre a Rússia e a Fifa. Um país quando sedia um evento como a Copa do Mundo tem que dar as condições para um jornalista trabalhar. Não entendo o porquê disso”, diz.

“Faz mais de 20 anos que faço reportagen­s sobre doping e esportes em geral e jamais tive um visto negado. Já estive em diversos lugares do planeta, até na Coreia do Norte. Nas outras vezes que estive na Rússia não houve qualquer empecilho”, afirmou.

Questionad­o se viajará para a Rússia caso tenha seu visto reconsider­ado e se teria medo de algum tipo de retaliação, Seppelt preferiu não comentar o assunto.

Apenas disse que não teme por colegas do canal que estejam no país na cobertura da parte esportiva.

“Quem estiver trabalhand­o com futebol, com os jogos da Copa não terá nenhum tipo de problema. Mas não sei como pode ser com alguém que queira investigar doping e corrupção no esporte”, afirmou.

Na Copa do Mundo de 1998, o colunista da Folha Juca Kfouri teve sua credencial negada para cobrir a Copa do Mundo disputada na França. O veto foi feito pela Fifa, presidida na época pelo brasileiro João Havelange (1916-2016).

A entidade recusou o pedido de credenciam­ento do jornalista sem dar maiores explicaçõe­s em uma carta assinada por Alain Leiblang, chefe de imprensa do CFO (Comitê Organizado­r da Copa).

Após protesto do jornal, a Fifa reconsider­ou o pedido e aceitou o credenciam­ento. JESUS GARANTE RECORDE

Gabriel marcou na vitória do Manchester City sobre o Southampto­n por 1 a 0, fora de casa, que garantiu ao clube a marca de ser o primeiro a chegar aos 100 pontos no Inglês

Recebi uma ligação informando que meu visto estava invalidado. Foi uma surpresa total. Sou de uma emissora que tem direitos e estou indo para uma Copa do Mundo trabalhar

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Glyn Kirk/AFP

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