Trump tem muito em jogo na ameaça de Kim
Cancelamento de reunião sobre arsenal nuclear norte-coreano seria derrota para política externa do presidente dos EUA
ANÁLISE são paulo A Coreia do Norte ameaçou cancelar a reunião com o presidente Donald Trump, programada para 12 de junho, caso os EUA continuem pressionando o país a abandonar de “forma unilateral” seu arsenal nuclear e seguir o “modelo da Líbia” de desnuclearização.
A declaração foi divulgada poucas horas após Pyongyang desmarcar o encontro que teria com a Coreia do Sul, alegadamente por causa de exercícios militares que Seul vem conduzindo com os EUA.
A Casa Branca minimizou as ameaças da Coreia do Norte. “Se o encontro não ocorrer, vamos continuar com nossa campanha de pressão máxima” contra a Coreia do Norte, disse a porta-voz da Casa Branca, Sarah Huckabee Sanders. Segundo ela, esse tipo de declaração não é “incomum nesses tipos de operações”.
De fato, em negociações nucleares anteriores, Pyongyang habitualmente ameaçava abandonar as discussões. E havia bastante ceticismo em relação a sua promessa incondicional de acabar com o programa nuclear —tradicionalmente, os líderes do país são inconsistentes.
Os norte-coreanos podem usar idas e vindas como forma de extrair mais concessões dos EUA, como a desnuclearização gradual, em troca de retirada sincronizada de sanções.
Questionado sobre a possibilidade de o encontro ocorrer, Trump foi evasivo. “Vamos ver”, disse, e afirmou que insistiria na desnuclearização.
Mas há muito em jogo para o governo Trump: o encontro com o ditador norte-coreano, Kim Jong-un, e subsequente acordo para desnuclearização seriam o grande trunfo para a política externa do republicano. Ele chegou a se antecipar, apontando que “todo mundo está falando” que ele mereceria um prêmio Nobel.
Em comunicado veiculado pela agência de notícias da Coreia do Norte, Kim Gye Gwan, vice-ministro das Relações Exteriores e ex-negociador nuclear, disse que o país não mais estará interessado em diálogo e vai reconsiderar o encontro “se os Estados Unidos tentarem nos encurralar e forçar que abandonemos de forma unilateral nosso programa nuclear”.
O vice-ministro também questionou a insistência dos EUA em obter desnuclearização total, irreversível e verificável antes de relaxamento nas sanções.
Ele demonstrou especial irritação com declarações do assessor de Segurança Nacional dos EUA, John Bolton, que disse esperar um “modelo Líbia 2004” na negociação —não exatamente tentador, considerando que o ditador Muammar Gadaffi (1942-2011) foi derrubado e morto sete anos depois de abrir mão do seu programa nuclear.
“O mundo sabe que não somos nem a Líbia nem o Iraque, que tiveram um destino horrível. Nós já criticamos Bolton e não escondemos a repugnância que sentimos por ele”, disse o vice-chanceler.