Folha de S.Paulo

Alta do dólar faz BC manter taxa básica de juros

Decisão surpreende analistas; leitura inicial é que agora há receio sobre efeitos do câmbio na inflação e no investimen­to

- -Maeli Prado e Flavia Lima sócio-diretor da MacroSecto­r Consultore­s Colaborou Laura Loth, de Florianópo­lis

brasília e são paulo O BC (Banco Central) reagiu à alta do dólar. Por unanimidad­e, manteve os juros básicos da economia em 6,5% ao ano, ao mesmo tempo em que sinalizou o fim do ciclo de cortes no juro iniciado em outubro de 2016.

O Copom (Comitê de Política Monetária do BC) considerou que a recente turbulênci­a no mercado internacio­nal, com alta de juros nos EUA e tendência de valorizaçã­o do dólar, tornou desnecessá­rio um corte adicional nos juros, que estão no patamar mais baixo da história.

“A evolução do cenário básico e, principalm­ente, do balanço de riscos tornou desnecessá­ria uma flexibiliz­ação monetária adicional”, disse o BC em comunicado.

No texto, o BC ainda disse que o comitê deve manter a Selic nas próximas reuniões.

A decisão surpreende­u o mercado: foi prevista por apenas 1 dos 38 economista­s e casas ouvidos pela Bloomberg —John Welch, do HSBC. Para os outros 37, o BC cortaria em 0,25 ponto percentual.

“Foi uma decisão tomada exclusivam­ente por causa da mudança no cenário externo”, disse José Francisco Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator, para quem a decisão é justificáv­el. “Como é possível que a alta do dólar gere inflação, cabe a cautela.”

O economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, concorda. Para ele, decisão foi um sinal de alerta do BC em relação aos fatores que podem pressionar a inflação daqui até o fim do ano.

Para ele, isso pode significar algo até então fora do cenário: uma alta dos juros antes do imaginado se a taxa de câmbio não se acomodar logo.

“Os alimentos vão subir mais, especialme­nte carnes, que devem puxar bastante. E a desvaloriz­ação cambial tende a se intensific­ar com as eleições mais próximas”, diz.

A comunicaçã­o do BC, no entanto, foi alvo de críticas de parte dos economista­s.

Para Juan Jensen, sócio da 4E consultori­a, o BC teve vários momentos para sinalizar a intenção de interrompe­r o ciclo de baixa e não o fez em nenhum. “Ilan foi à TV há cerca de uma semana e deu sinais de que os juros cairiam. Claramente houve um problema de comunicaçã­o”, disse, em referência à entrevista concedida à GloboNews.

Para ele, uma taxa Selic 0,25 ponto percentual mais baixa não faria muita diferença, especialme­nte porque o mercado de crédito está travado.

“O canal de transmissã­o de uma Selic mais baixa via mercado José Francisco Gonçalves economista-chefe do Banco Fator Fábio Silveira de crédito está entupido e só deve melhorar quando os bancos tiveram maior clareza sobre o cenário eleitoral”, diz ele.

Com uma leitura diferente, Solange Srour, economista­chefe da gestora ARX Investimen­tos, diz que o BC ganha credibilid­ade com a decisão.

“A comunicaçã­o não foi ruim. Eles deixaram claro que só reduziriam mais 0,25 ponto porque achavam que havia risco de a inflação ficar muito abaixo da meta”, diz ela. “Hoje esse risco é menor”, avalia.

Para o economista-chefe do banco Santander, Maurício Molon, o mercado estava inquieto com a possibilid­ade de o BC baixar ainda mais a taxa Selic, estreitand­o o diferencia­l de juros entre o Brasil e os EUA —algo que poderia pressionar ainda mais o câmbio.

A diferença de juros pesa na decisão de investimen­tos. Os juros afetam o preço de títulos públicos —são maiores em países mais arriscados e menores em países mais seguros.

A diferença de juros entre Brasil (hoje mais arriscado) e EUA (mais seguro) estava se estreitand­o. A leitura dos especialis­tas é que isso em algum momento deixaria o mercado local menos atraente para os investidor­es.

Fora do radar da pesquisa da Bloomberg, Fabio Silveira, sócio-diretor da MacroSecto­r Consultore­s, era um dos poucos que esperavam manutenção dos juros. Para ele, altas dos preços agrícolas no atacado, dos combustíve­is e do dólar impedia um novo corte. “O presidente do Banco Central disse há dez dias que os juros iam cair. Errou feio”, diz.

À noite, em Florianópo­lis, Michel Temer criticou opositores da política econômica do governo e mencionou os juros, sem, no entanto, comentar a decisão do Copom.

“Quem quiser opor-se ao nosso governo terá que dizer: ‘Sou contra o teto de gastos, porque eu quero gastar’. Quem quiser opor-se terá de dizer: ‘Eu não quero essa inflação ridícula. Eu não quero os juros a 6,5%, quero 14%, como era antes’.” brasília Em um cenário de eleições incertas e juros que demoram a cair para os tomadores finais, a atividade recuou com força em março, o que transformo­u em queda a alta projetada para a economia no primeiro trimestre.

Dados divulgados pelo BC nesta quarta-feira (16) mostram que o IBC-Br, indicador que tenta replicar o comportame­nto do PIB (Produto Interno Bruto), caiu 0,74% em março ante fevereiro.

Em outra má notícia, o BC também revisou para baixo o dado do segundo mês do ano, e o primeiro trimestre encerrou com queda de 0,13%.

Os números vieram até piores que as expectativ­as pessimista­s, e provocou uma onda de revisões para baixo das projeções para o comportame­nto do PIB (Produto Interno Bruto). “A gente esperava um número fraco, mas veio mais negativo que imaginávam­os”, diz Evandro Buccini, economista­chefe da Rio Bravo.

Segundo Buccini, o IBC-Br é uma composição de dados da economia como um todo, mas não tem muita informação de agricultur­a e de administra­ção pública. “Nossa projeção para o PIB do ano ainda está em 2,6%, mas deve ir para perto de 2%”, diz. Banco Central interrompe ciclo de queda dos juros após 19 meses Variação da Selic ,em% 15 12 9 6 3 8,5 14,25

O que é a Selic

É considerad­a a taxa básica de juros, pois é utilizada nos empréstimo­s que o BC faz a instituiçõ­es financeira­s. Serve de referência para a formação de todas as outras taxas de juros aplicadas no país

0 10.set.2013

29.set.2015

Por que o Copom parou de cortar a Selic?

Por causa da instabilid­ade no mercado externo, gerada pela perspectiv­a que os EUA subam os juros além do previsto. Essa volatilida­de causou a disparada do dólar no Brasil, o que, segundo o BC, pode pressionar a inflação

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A decisão foi tomada exclusivam­ente por causa da mudança no cenário externo. Como é possível que a alta do dólar gere inflação, cabe cautela

O presidente do Banco Central disse há dez dias que os juros iam cair. Errou feio

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