Conduzindo Mr. Weinstein
Chofer Mickael Chemloul prepara livro sobre histórias do produtor em Cannes
cannes “Quer saber por que Cannes está mais vazia neste ano?”, afirma o motorista francês Mickael Chemloul à Folha por telefone. “É porque Harvey Weinstein não está aqui”, completa ele, em alusão ao circo midiático que o magnata promovia em torno de seus filmes no festival francês.
Por cinco anos, entre 2008 e 2013, Chemloul, 56, foi o chofer do outrora poderoso produtor hollywoodiano durante o festival de cinema.
Em outubro, quando uma série de acusações contra o americano vieram à tona, o motorista contou a publicações francesas e inglesas o que viu e ouviu no período em que o conduziu na cidade.
O produtor nega todas as acusações e rebateu, via porta-voz, os relatos de Chemloul.
O chofer disse que Weinstein tremia quando uma mulher atraente estava próxima e estocava pílulas de Viagra em sua Mercedes. Ele afirmou ter ouvido uma modelo implorar para que o produtor não “a machucasse”.
Disse ainda que foi espancado pelo executivo numa noite em que prostitutas cancelaram um encontro prometido.
Agora ele está escrevendo um livro de 400 páginas em que dá a sua versão dessas e de outras histórias novas.
Vai se chamar “O Último Monstro de Hollywood” e será lançado em outubro, um ano após o jornal New York Times e a revista New Yorker terem publicados dezenas de relatos de abusos do produtor.
“Vai trazer muita informação comprometedora”, anuncia Chemloul à Folha, num café próximo a um ancoradouro de iates. Mas, após conversar com seus advogados, desistiu de antecipar detalhes à reportagem de sua experiência como motorista de Weinstein.
Cannes de fato está mais vazia neste ano. Uma das hipóteses é a presença de só dois títulos americanos entre os 21 selecionados para a competição oficial. Ou seja, menos celebridades hollywoodianas no tapete vermelho e menos fuzuê da imprensa.
Entre os americanos, Weinstein era um peso-pesado. Em Cannes, sua produtora exibiu títulos como “Pulp Fiction” (Palma de Ouro em 1994), de Quentin Tarantino, “O Piano” (Palma de Ouro em 1993), de Jane Campion, “O Artista”, de Michael Hazanavicius, e “A Vida É Bela”, de Roberto Benigni. O último foi “Terra Selvagem”, de Taylor Sheridan, em 2017.
O luxuoso Hotel du CapEden-Roc, em Antibes, era a sua base favorita durante o festival. A atriz italiana Asia Argento afirma ter sido estuprada pelo produtor num de seus quartos, enquanto a edição de 1997 transcorria lá fora.
Funcionários do hotel, contudo, não dão detalhes das passagens de Weinstein por ali. “Não há nada mais a dizer”, afirmou uma funcionária.
Ao jornal inglês “The Sun” Chemloul contou que costumava ir e vir do resort, muitas vezes transportando garotas. Uma delas, a que pediu para não ser machucada, teria sido forçada a fazer sexo oral em Weinstein ali mesmo no carro.
“O rei de Cannes”, como foi apelidado pela imprensa, também era conhecido como “o porco” por quem conheciam seu histórico sexual, afirmou Chemloul.
Ele só deixou de prestar serviços a Weinstein em 2013, após o incidente com as prostitutas. Na ocasião, disse o chofer ao jornal local NiceMatin, as duas mulheres não deram as caras num clube noturno e enfureceram o produtor, que teria descontado sua raiva em Chemloul.
O produtor também nega ter cometido qualquer abuso sexual. À revista Hollywood Reporter um porta-voz de Weinstein rebateu também as declarações do motorista.
Segundo seus representantes, nunca houve qualquer briga ou encontro com outras mulheres. “Os serviços do motorista foram descontinuados porque ele costumava conduzir em alta velocidade, muitas vezes acima dos 220 km/h”, afirmaram à época.
Neste ano, a organização do festival criou uma linha telefônica para que eventuais vítimas de assédio denunciem crimes, mas não informou quantos atendimentos foram realizados desde que a mostra começou, há dez dias.