Folha de S.Paulo

Uma mulher tenta controlar o caos em federação africana

Isha Johansen, de Serra Leoa, luta contra acusações e falta de campeonato­s

- Alex Sabino

são paulo Em novembro de 2017, a Fifa enviou comunicado para o futebol africano: a decisão de afastar Isha Johansen da presidênci­a da Federação de Serra Leoa era inválida.

A beneficiad­a, uma das duas mulheres a comandarem uma associação nacional de futebol, não comemorou. No dia a dia do país de 6 milhões de habitantes, o aviso não teve efeito prático. O futebol local continua uma sucessão de conflitos e brigas pessoais.

Isha Johanson, 53, é a presidente, mas não governa. Nem ela, nem ninguém.

“Aceitei me tornar dirigente para mudar a realidade do futebol de Serra Leoa. São quatro anos de dificuldad­e incrível para realizar qualquer coisa”, disse ela para a Folha.

O sobrenome é norueguês, fruto do casamento com Arne. O casal mora na Inglaterra, embora Isha viva na ponte aérea entre Londres e Freetown, sua terra natal.

Johansen foi destituída por denúncias de corrupção que a fizeram passar uma noite Isha Johansen, 53 presa. Ela nega todas as acusações. A principal é de mau uso de US$ 50 mil (R$ 187 mil) enviados pela Confederaç­ão Africana de Futebol para pagar testes que verificari­am idades de jogadores da seleção sub-17. Há também o pagamento de US$ 6 mil (R$ 22,5 mil) de despesas de viagem de seu assistente, que não é funcionári­o da federação local.

“São acusações políticas. Você pede as provas e não apresentam nada. Querem evitar investigaç­ão sobre fraude de resultados”, diz a dirigente.

Ela se refere a jogo entre a seleção local e a África do Sul, em 2008. Ao assumir o cargo, em 2013, determinou abertura de inquérito para verificar se houve acerto do placar. Desde então, quatro atletas e 11 dirigentes foram suspensos.

“É uma luta todos os dias. Intimidaçã­o, sexismo, brigas internas, impossibil­idade de organizar campeonato­s por causa de boicotes”, afirma.

Dona de um time no país, o Johansen FC, Isha já foi chamada de “uma desgraça para o país” no parlamento. Dirigente rival a chamou de “prostituta” em um programa de rádio.

Ela nem deveria estar mais no cargo. Seu mandato expirou em agosto de 2017. Continua na presidênci­a porque os cartolas não se entendem sobre quem pode ser candidato. Isha Johansen tenta controlar o caos. Apesar de todos os problemas, planeja se candidatar novamente, se puder.

“Eu não acabei o trabalho que me propus a realizar.”

Duas mulheres comandam federações nacionais hoje. Além de Isha, há Sonia BienAime, presidente da entidade das Ilhas Turks e Caicos.

“Tem sido experiênci­a importante em um país que não está acostumado a ver uma mulher em posição de liderança. Serra Leoa é nação de cidadãos lutadores, apesar de todos os problemas”, afirma.

O país passou por guerra civil nos anos 1990 que matou 50 mil pessoas. As marcas ainda estão nas cidades e na memória de quem era vivo na época. E também houve o ebola.

O território foi um dos focos Isha Johansen,

Aceitei me tornar dirigente para mudar a realidade do futebol de Serra Leoa

de epidemia da doença, em 2014. Isso fez a seleção jogar todas as partidas fora de casa e ouvir gritos de zombaria das torcidas. Jogadores rivais se recusavam até a apertar as mãos dos colegas de Serra Leoa por medo de infecção.

Foi também marco negativo para o futebol local. Desde então, não foi mais possível organizar o campeonato nacional. Neste caso, pela desorganiz­ação e conflitos internos.

“De que adianta ficar parado? Nós queremos dar a chance de uma vida melhor para as crianças por meio do futebol. Gostaria muito que Serra Leoa se classifica­sse para a Copa do Mundo. Mas essa não chega nem perto de ser nossa prioridade”, afirma Isha.

O movimento para tirá-la do poder ameaça seu principal projeto, o Powerplay, idealizado para inspirar jovens mulheres a atingirem o máximo de potencial econômico e social por meio do esporte.

O principal nome do futebol de Serra Leoa é o atacante Kei Kamara, do Vancouver Whitecaps, da Major League Soccer. Frustrado com a situação e sem concordar com os rumos da federação sob o comando de Isha Johansen, ele abandonou a seleção.

“Eu não saio. Podem me intimidar o quanto quiserem. Não saio”, finaliza a presidente.

 ??  ??
 ?? Stuart Franklin - 3.jul.15/Getty Images ?? Isha Johansen participa de evento da Fifa como representa­nte de Serra Leoa Nascida em Freetown, em Serra Leoa, é empresária e dirigente de futebol. Em 2004 fundou o Johansen FC. Nove anos depois, foi eleita presidente da federação local. Foi a 1ª...
Stuart Franklin - 3.jul.15/Getty Images Isha Johansen participa de evento da Fifa como representa­nte de Serra Leoa Nascida em Freetown, em Serra Leoa, é empresária e dirigente de futebol. Em 2004 fundou o Johansen FC. Nove anos depois, foi eleita presidente da federação local. Foi a 1ª...

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil