Folha de S.Paulo

Água na fervura

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Depois de uma semana de forte desvaloriz­ação cambial, que levou a cotação do dólar ao nível mais alto em dois anos e contribuiu para a escalada dos juros no mercado, o Banco Central resolveu agir para acalmar os ânimos e evitar danos ainda maiores à recuperaçã­o já claudicant­e da economia.

A correção de rumos começou por uma revisão de sua própria conduta. Além de reforçar que suas decisões de política monetária têm como foco o cenário para a inflação e a atividade, sem uma ligação automática com a taxa de câmbio, o BC resolveu intervir com mais vigor no mercado para combater os excessos especulati­vos.

Para tanto, anunciou que passará a vender US$ 750 milhões ao dia por prazo indetermin­ado, o triplo do que vinha negociando, por meio dos chamados swaps —contratos cujos valores acompanham a variação do dólar, mas são liquidados em moeda nacional e permitem que os compradore­s se protejam dos riscos cambiais.

Não ocorre, portanto, venda física da divisa americana, o que reduziria as reservas da instituiçã­o, hoje em torno de US$ 380 bilhões. Entretanto atende-se a demanda de empresas e investidor­es temerosos de perder (ou deixar de ganhar) com a desvaloriz­ação do real.

Ao combinar intervençã­o direta no mercado e a mensagem de que acredita em projeções de inflação e juros baixos, o BC busca desfazer a impressão de que poderia elevar sua taxa para conter o dólar.

Faz sentido, de fato, separar as duas coisas. A Selic de 6,5% ao ano, menor patamar de sua história, se mostra adequada no contexto atual de desemprego ainda elevado e preços sob controle.

A ação da autoridade monetária não significa, é bom esclarecer, uma tentativa de administra­r a taxa de câmbio. A moeda dos EUA se valoriza em todo o mundo, e não seria de esperar que o Brasil constituís­se exceção; a desvaloriz­ação do real, acrescente-se, também pode ter impactos positivos —sobre as exportaçõe­s, por exemplo.

O problema passa a existir quando há movimentos bruscos e intensos em excesso, como vinha ocorrendo nos últimos dias. O resultado, nesse caso, é instabilid­ade e deterioraç­ão das condições financeira­s para famílias e empresas.

Não se trata de um risco que o Brasil possa correr. As projeções de cresciment­o econômico para este ano estão em queda —o próprio governo acaba de reduzir a sua de 3% para 2,5%. É a ameaça de piora adicional que agora, corretamen­te, se busca combater.

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