Folha de S.Paulo

O truque da bola gelada

- Ruy Castro

rio de janeiro O francês Michel Platini, ex-craque e cartola acusado de ter levado 2 milhões de francos suíços em serviços escusos para a Fifa e a Uefa, declarou no fim de semana que ajudou a manipular o sorteio dos grupos na Copa do Mundo de 1998, realizada em seu país. A ideia era a de que França e Brasil não se cruzassem em nenhum momento do torneio que não fosse a final. O que aconteceu, com a vitória da França por 3x0.

Platini deve saber o que diz. Era presidente do Comitê Organizado­r daquela Copa. O segredo estava em manipular a escolha das chaves, a qual se deu por sorteio numa cerimônia em Marselha. O responsáve­l pelo sorteio era o então secretário­geral da Fifa, o suíço Joseph Blatter, logo depois presidente da entidade e atualmente banido do futebol por acusações de corrupção —uma delas a de, em 2011, ter indevidame­nte destinado 2 milhões de francos suíços a... Michel Platini.

O sorteio para a escolha das chaves foi feito pelo velho processo de bolas dentro de potes, recolhidas manualment­e por uma pessoa que, ao enfiar a mão no pote, não tinha como saber qual bola estava tirando. Mas há como saber. Pouco antes do sorteio, basta botar na geladeira a bola que se quer tirar. Não sei quem inventou isso, mas o truque foi muito usado pela antiga CBD, hoje CBF, nos sorteios que, nos anos 50, regulavam o antigo campeonato brasileiro de seleções estaduais. Um dos cartolas da CBD era então João Havelange —o mesmo que presidia a Fifa durante o sorteio para a Copa de 1998.

O fato é que, com a França como cabeça de chave num grupo e o Brasil em outro, a bola gelada pode têlos levado em segurança até a decisão da Copa. Na qual, como se sabe, Ronaldo Fenômeno teve um treco antes do jogo. Aliás, onde estaria Platini naquele momento?

Nos sorteios de hoje, parece, não se usam mais bolas, e sim algoritmos. Mas quem garante que não há também algoritmos gelados?

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