Folha de S.Paulo

Esmola eleitoreir­a com a gasolina

- Vinicius Torres Freire Graduado em ciências sociais (USP) e mestre em administra­ção pública (Harvard). Foi secretário de Redação e editor da Folha vinicius.torres@grupofolha.com.br

Governo e Congresso jogam dinheiro fora para conseguir desconto de no máximo R$ 0,07

Sete centavos. É quanto pode baixar o preço da gasolina caso seja repassada para o consumidor a zeragem da Cide, imposto cobrado sobre combustíve­is. No caso do diesel, cinco centavos.

Hum.

Esse desconto deve ser diluído na cadeia de distribuiç­ão. Se não sumir por aí, bastam uns três reajustes da Petrobras para que esses centavos escorram pelo ralo.

É no que vai dar a promessa dos presidente­s da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), e do Senado, Eunício Oliveira (MDB), combinada com Michel Temer, adiantada no caso do diesel, “tentativa” na gasolina.

Zerando a Cide sobre todos os combustíve­is, o governo federal vai perder cerca de R$ 4,1 bilhões em receita de impostos, em um ano. Estados e municípios, R$ 1,7 bilhão. É o custo do populismo.

Gasolina tributada

Em São Paulo, onde o preço da gasolina é menos salgado, o litro custava em média R$ 3,95 no começo de maio, segundo a ANP. Cerca de 34% desse valor é imposto indireto (PIS/Cofins, Cide e ICMS), o equivalent­e a R$ 1,34.

No Rio, onde a gasolina é cara, o litro saía por R$ 4,70, em média, com 42% de imposto indireto, o equivalent­e a R$ 1,97. Por falar no assunto, o imposto sobre a gasolina é maior nos estados mais falidos: Rio, Minas e Rio Grande do Sul.

Em julho do ano passado, o governo federal, na pindaíba, aumentou o PIS/Cofins sobre a gasolina. Passou a cobrar mais R$ 0,33 por litro de gasolina misturada a etanol. Desde então, a margem (“lucro”) das empresas distribuid­oras de combustíve­is diminui um pouco. Os sete centavos de Maia e Oliveira podem alegrar essas empresas.

Sim, o preço da gasolina da Petrobras é alto, dada a nossa relativa pobreza de país de renda média que paga de resto imposto “europeu” sobre combustíve­is. Mas está mais ou menos em linha com os do mercado mundial, uns 10% abaixo, no cálculo de alguns especialis­tas.

Bulir com preços tem efeito em geral ruim. Alguém paga o favor e, enfim, é uma distorção econômica estimular o consumo de um bem que está caro, passando a conta para alguém.

A Petrobras pagou essa conta, sob Dilma Rousseff, e foi à ruína, o que agravou a recessão. O governo pode pagar a conta, via subsídios disfarçado­s, baixando impostos (privilegia­ndo quem tem carro). Como o governo está quebrado, vai ter de cortar mais gasto ou fazer mais dívida.

Sim, a Cide é um imposto regulatóri­o, que servia justamente para atenuar os reajustes por um tempo. Quando o preço da Petrobras subia, baixava-se o imposto, e vice-versa.

A petroleira poderia assim cobrar preço de mercado; o governo absorvia as variações, por um tempo. A Cide era uma espécie de fundo regulador de preços.

Dentro de certos limites de variações de preços mundiais, era possível estabiliza­r o custo para o consumidor, evitar choques, um paliativo convenient­e para uma economia torta como a do Brasil. Mas, se o preço mundial mudava muito por muito tempo, era preciso repassar a variação, para cima ou para baixo. Dilma zerou a Cide e acabou com o atenuante; Temer a imita.

É possível fazer algo mais? Os impostos federais sobre combustíve­is são um valor fixo por litro (por exemplo, R$ 0,65 por litro de gasolina com etanol). O ICMS, estadual, é uma porcentage­m, método de cobrança que amplifica a variação dos preços. Mas, caso os estados aceitassem a mudança, fixariam o valor do imposto pelo teto.

Mexer em preço é ruim. Saídas, só de médio prazo. A concorrênc­ia de energia mais limpa pode ajudar (mesmo o etanol), temos de usar menos carro, os veículos têm de ser mais eficientes.

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